Por: António Orlando dos Santos (Bombadas)
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Irene frequentou a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e licenciou-se no ano de 1973.
A sua vida estava dentro de todos os parâmetros que tacitamente lhe haviam destinado tanto a família como as pessoas da mesma condição social. Era hora dela fazer carreira, criar fama que se comparasse a outras mulheres que ao abraçarem a carreira do direito estavam a cruzar a linha de tempo que a sua condição de mulher havia determinado para as até ali cidadãs com poucos direitos no concernente à liberdade de conduzirem a sua vida com o direito de não dependerem da vontade soberana dos homens, que sendo maridos, tinham condicionado os direitos que as mulheres não possuíam até que Abril surgiu como acto libertador dessa absurda condição que de conservadora se tornara ultrajante.
Era a liberdade que durara séculos a ser anulada por quem por hipocrisia insistia em considerá-las inferiores aos homens que sendo seus pais, irmãos ou maridos se lhe opunham na classificação absurda de chefes de família o que lhes era desprestigiante devido ao facto de serem elas mães e esposas que tinham o encargo de governarem as famílias, criarem os filhos, educá-los e estarem alerta vinte e quatro horas por dia com o pensamento em fazer tudo perfeitamente, para que a família vivesse sem sobressaltos que abalassem a pirâmide de que elas eram a base e o topo.
Sopravam ventos favoráveis ao ajustamento da sociedade que pretendia mudar o “modus vivendi” da população que sofria a injustiça da falta de direitos condizentes com a sua condição de seres humanos que se apresentavam com faculdades iguais aos detentores do poder e quiçá mais preparados para exercerem poder e mando duma forma mais humana do que os velhos abencerragens que até ali com o maior cinismo exerciam poder e honra sobre quem trabalhava honestamente, mas por pertencer à sub categoria social designada povo, eram excluídos da mesa do Estado na qual engordavam os fidalgos de casaca e chapéu alto.
Irene não tinha sossego que lhe permitisse influir na guerra que surdamente se preparava contra a ascensão social do povo trabalhador. Viveu a luta dos operários contra os directores e proprietários que não deixavam que Abril repartisse o pão equitativamente pois que consideravam que deveria tudo regressar à ordem antiga, que era a mais ordeira. Totalmente absorta por este estado de coisas tentava sinceramente compreender a situação que fazia que se tivesse simpatia por ambos os campos, não conseguindo compreender porque tanta gente houvesse continuado fiel a leis e atitudes retrógradas e outros se houvessem tornado de repente adeptos de doutrinas tão radicais que tudo queriam nacionalizar e transformar em colectividades sem classes sociais, nivelando tudo pelo mesmo divisor que se tornasse numa sociedade sem classes, mas que não seria certamente a mais ideal pois que nem todos possuem as mesmas capacidades e o desenvolvimento social progride pela acção dos indivíduos que trabalham e criam riqueza com as suas capacidades nos vários sectores da produção da indústria do comércio e da ciência.
É exactamente neste tempo que Irene toma a decisão de tomar partido pela emancipação dos menos favorecidos e resolve integrar-se no partido que lhe pareceu mais capaz de lutar por uma ideia de sociedade mais justa.
No tempo que mediou entre a sua juventude e a licenciatura teve ocasião de viajar e conhecer alguns países dos quais retirou conceitos políticos deveras mais justos do que os que eram os nossos. Os países nórdicos então forneceram-lhe padrões de justiça e distribuição de liberdades e garantias pelas quais se apaixonou.
Realmente a dificuldade era a disciplina e a lucidez que descobriu nessas nações, onde o povo tinha características mais propícias ao respeito pela ordem e onde se havia desenvolvido na população um sentido de buscar nas ciências o verdadeiro sentido de progresso tanto social como científico. A possibilidade de copiar determinados conceitos era quase inalcançável pois aquilo a que chamam o dever de honestidade e competência dos detentores do poder para melhor conduzirem a política que governa os povos era entre nós abismal.
Irene viu com clareza que não seria outra forma diferente de pensar, que traria consigo o paradigma que faria o verdadeiro desenvolvimento da nação. Leis mais justas e mais honestidade nas contas públicas eram necessárias mas ela observava que em Portugal se falava de um modo e se conduzia a política diferentemente. Ao longo do tempo foi verificando a desonestidade dos políticos, banqueiros, militares, funcionários públicos e juízes, classes em que o zelo deveria ser o paradigma eram os que menos honestos se mostravam, já que os desvios começaram a ser conhecidos da imprensa e as acções judiciais que lhes foram impostas foram todas fechadas sempre em favor das classes transgressoras e contra a aplicação da lei que se esperava fosse igual para todos.
Irene atingiu a idade de quarenta anos e concluiu que algo havia falhado e que os seus sonhos de recém licenciada tinham ido por água abaixo, que o país havia falhado na construção de uma sociedade melhor porque mais justa e afinal o que se viu foi a concretização de um sistema que não sobreviverá sem ajuda da CE e que se transformará num estado em que os deserdados do século XX não conseguiram sair do buraco onde viviam pese embora algum progresso havido nas vias de comunicação que não tarda estarão às moscas pois o preço dos combustíveis e dos veículos se tornará incomportável dada a ganância dos que desejam parecer-se com os imperadores romanos mas que não possuem a ciência de qualquer servo da glebas que aspirasse a subir no escalão de homem digno e respeitável.
Irene regressou à casa das janelas, porta e varanda que seu avô mandou construir e que de solidez continua inigualável, pois foi feita por quem sabia o que queria da vida e respeitava os homens e mulheres que o ajudaram a ganhar o suficiente para educar os filhos e netos sem perder a dignidade. Irene mudou e a mudança foi para o lado da descrença na política suja e nas ambições desmedidas de quem colocamos no poder para se governarem e não para governarem o país.
A sua vida estava dentro de todos os parâmetros que tacitamente lhe haviam destinado tanto a família como as pessoas da mesma condição social. Era hora dela fazer carreira, criar fama que se comparasse a outras mulheres que ao abraçarem a carreira do direito estavam a cruzar a linha de tempo que a sua condição de mulher havia determinado para as até ali cidadãs com poucos direitos no concernente à liberdade de conduzirem a sua vida com o direito de não dependerem da vontade soberana dos homens, que sendo maridos, tinham condicionado os direitos que as mulheres não possuíam até que Abril surgiu como acto libertador dessa absurda condição que de conservadora se tornara ultrajante.
Era a liberdade que durara séculos a ser anulada por quem por hipocrisia insistia em considerá-las inferiores aos homens que sendo seus pais, irmãos ou maridos se lhe opunham na classificação absurda de chefes de família o que lhes era desprestigiante devido ao facto de serem elas mães e esposas que tinham o encargo de governarem as famílias, criarem os filhos, educá-los e estarem alerta vinte e quatro horas por dia com o pensamento em fazer tudo perfeitamente, para que a família vivesse sem sobressaltos que abalassem a pirâmide de que elas eram a base e o topo.
Sopravam ventos favoráveis ao ajustamento da sociedade que pretendia mudar o “modus vivendi” da população que sofria a injustiça da falta de direitos condizentes com a sua condição de seres humanos que se apresentavam com faculdades iguais aos detentores do poder e quiçá mais preparados para exercerem poder e mando duma forma mais humana do que os velhos abencerragens que até ali com o maior cinismo exerciam poder e honra sobre quem trabalhava honestamente, mas por pertencer à sub categoria social designada povo, eram excluídos da mesa do Estado na qual engordavam os fidalgos de casaca e chapéu alto.
Irene não tinha sossego que lhe permitisse influir na guerra que surdamente se preparava contra a ascensão social do povo trabalhador. Viveu a luta dos operários contra os directores e proprietários que não deixavam que Abril repartisse o pão equitativamente pois que consideravam que deveria tudo regressar à ordem antiga, que era a mais ordeira. Totalmente absorta por este estado de coisas tentava sinceramente compreender a situação que fazia que se tivesse simpatia por ambos os campos, não conseguindo compreender porque tanta gente houvesse continuado fiel a leis e atitudes retrógradas e outros se houvessem tornado de repente adeptos de doutrinas tão radicais que tudo queriam nacionalizar e transformar em colectividades sem classes sociais, nivelando tudo pelo mesmo divisor que se tornasse numa sociedade sem classes, mas que não seria certamente a mais ideal pois que nem todos possuem as mesmas capacidades e o desenvolvimento social progride pela acção dos indivíduos que trabalham e criam riqueza com as suas capacidades nos vários sectores da produção da indústria do comércio e da ciência.
É exactamente neste tempo que Irene toma a decisão de tomar partido pela emancipação dos menos favorecidos e resolve integrar-se no partido que lhe pareceu mais capaz de lutar por uma ideia de sociedade mais justa.
No tempo que mediou entre a sua juventude e a licenciatura teve ocasião de viajar e conhecer alguns países dos quais retirou conceitos políticos deveras mais justos do que os que eram os nossos. Os países nórdicos então forneceram-lhe padrões de justiça e distribuição de liberdades e garantias pelas quais se apaixonou.
Realmente a dificuldade era a disciplina e a lucidez que descobriu nessas nações, onde o povo tinha características mais propícias ao respeito pela ordem e onde se havia desenvolvido na população um sentido de buscar nas ciências o verdadeiro sentido de progresso tanto social como científico. A possibilidade de copiar determinados conceitos era quase inalcançável pois aquilo a que chamam o dever de honestidade e competência dos detentores do poder para melhor conduzirem a política que governa os povos era entre nós abismal.
Irene viu com clareza que não seria outra forma diferente de pensar, que traria consigo o paradigma que faria o verdadeiro desenvolvimento da nação. Leis mais justas e mais honestidade nas contas públicas eram necessárias mas ela observava que em Portugal se falava de um modo e se conduzia a política diferentemente. Ao longo do tempo foi verificando a desonestidade dos políticos, banqueiros, militares, funcionários públicos e juízes, classes em que o zelo deveria ser o paradigma eram os que menos honestos se mostravam, já que os desvios começaram a ser conhecidos da imprensa e as acções judiciais que lhes foram impostas foram todas fechadas sempre em favor das classes transgressoras e contra a aplicação da lei que se esperava fosse igual para todos.
Irene atingiu a idade de quarenta anos e concluiu que algo havia falhado e que os seus sonhos de recém licenciada tinham ido por água abaixo, que o país havia falhado na construção de uma sociedade melhor porque mais justa e afinal o que se viu foi a concretização de um sistema que não sobreviverá sem ajuda da CE e que se transformará num estado em que os deserdados do século XX não conseguiram sair do buraco onde viviam pese embora algum progresso havido nas vias de comunicação que não tarda estarão às moscas pois o preço dos combustíveis e dos veículos se tornará incomportável dada a ganância dos que desejam parecer-se com os imperadores romanos mas que não possuem a ciência de qualquer servo da glebas que aspirasse a subir no escalão de homem digno e respeitável.
Irene regressou à casa das janelas, porta e varanda que seu avô mandou construir e que de solidez continua inigualável, pois foi feita por quem sabia o que queria da vida e respeitava os homens e mulheres que o ajudaram a ganhar o suficiente para educar os filhos e netos sem perder a dignidade. Irene mudou e a mudança foi para o lado da descrença na política suja e nas ambições desmedidas de quem colocamos no poder para se governarem e não para governarem o país.
FIM
Bragança, 18/08/2022
A. O. dos Santos
(Bombadas)
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