Diariamente assistimos através dos meios de informação a comportamentos e decisões políticas deveras questionáveis, senão injuriosas, no que diz respeito aos cânones democráticos da sociedade. Refletindo sobre esse facto, somos levados a concluir, empiricamente, que a condição de exercício do poder tem vindo a perder qualidade a nível global. A nova classe política, sem qualquer tipo de pudor, plasma o desequilíbrio social existente e governa apenas para acolher as tendências mais evidentes, sejam elas quais forem. E se nos incomoda observar o estilhaçar de ordens mundiais oportunistas e equívocas, se nos espantamos com prevalências políticas internas, ficamos certamente envergonhados com o que se passa a nível local.
Temos a noção que, desde a criação constitucional das autarquias, a condução das políticas locais foi exercida por cidadãos comprometidos com as aspirações mais básicas dos seus concidadãos, numa ótica de entrosamento regional com as políticas nacionais e europeias. Sabemos que na maior parte das vezes essa liderança era exercida segundo padrões ideológicos de carácter geral, através de contratos sociais mitigados, os quais procuravam estruturar os territórios de acordo com o seu passado, avaliando o presente e projetando o futuro. Constatamos também que nem sempre as políticas se adequavam à realidade, embora assentassem quase sempre em decisões de curto e médio prazo, enquadradas, contudo, em visões de prazo mais amplo. Era a época das correntes doutrinárias devidamente comprovadas, protagonizadas na maior parte das vezes pelos mais relevantes filhos da terra.
Chegamos, contudo, a um tempo incerto, sem ideologias, sem paradigmas, um tempo em que as sociedades se apresentam excessivamente fragmentadas, aparentemente descomprometidas e até desmemoriadas. Deixou de haver visões alargadas, quadros conceptuais ou bases estruturantes. Chegou o tempo da navegação à vista. Ou seja, a era do politicamente correto, do pensamento unívoco, dos meios justificarem os fins. Mas o problema maior é o facto do poder regional, qual eco dos outros níveis de poder, ser exercido por atores políticos desqualificados, ignorantes e apenas comprometidos com a sua entourage, procurando somente perpetuar-se no poder. E como? Distribuindo benefícios pelos seus apaniguados, seja através de lugares nas respetivas autarquias ou subsídios para os sectores que lhe pareçam mais favoráveis. Do mesmo modo, procuram nomear chefias cuja única preocupação seja o mesmo (manutenção dos respetivos cargos), descurando em absoluto o facto simbiótico da assunção de despesa pública, muita dela de carácter permanente, quando deviam alertar para os efeitos nefastos dessas decisões.
Neste contexto, veio-me à memória um “perverso” princípio da administração, que espelha de forma singular tudo o que foi dito. Refiro-me evidentemente ao princípio de Peter, também conhecido como princípio da incompetência, aplicado na administração, que foi enunciado por Laurence Peter no âmbito da teoria estruturalista das organizações, segundo o qual, num sistema hierárquico, todo o funcionário tende a ser promovido até ao seu nível de incompetência. E, na realidade, seja em que modelo organizacional for e segundo qualquer abordagem, verifica-se à saciedade a sua aplicação.
E assim, eis aqui o princípio de Peter no seu máximo esplendor. Não se avalia o background individual, não é preciso haver uma missão, ter uma visão ou estratégia de médio e longo prazo. Os atores políticos, salvo raras e honrosas exceções, desenvolvem os seus projetos numa ótica de oportunismo pessoal e, na verdade, para daí colherem vantagens da mais diversa índole, segundo perspetivas de quase solipsismo e de evidente egocentrismo. E certamente segundo padrões de inquietante incompetência.

EXCELENTE! Companheiro, corroboro na íntegra esta tua reflexão sobre um tema que, quase todos, fingem que não existe e muito menos tem importância. Grande abraço.
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