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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 18 de dezembro de 2018

ESTRELAS DA COZINHA BRAGANÇANA

A exposição do Mundo Português realizada no ano de 1940 debaixo da batuta de António Ferro (leia-se a sulfúrica biografia de Orlando Raimundo) foi a exaltação do salazarismo de modo a alardear os «sucessos» do opressivo regime utilizando talentos e criatividades de intelectuais desafectos à Ditadura, não imunes à maestria de Ferro e da sua mulher Fernanda de Castro autora de livros para a infância e adolescentes, bem como incursões na arte poética. A dona Fernanda de Castro manteve largos anos uma tertúlia literária de múltiplas tonalidades e doutrinas ideológicas até às proximidades da sua morte ocorrida em 1994. A também tradutora e amiga de comeres bem cozinhados nasceu em 1900.

A exposição da apoteose a Salazar movimentou todas as áreas artísticas e criativas, por essa razão as artes culinárias integraram o painel principal e por isso mesmo Bragança indicou quais as preciosidades do receituário local e dos restantes concelhos do distrito. Importa mencionar o decisivo papel de António Ferro na criação das Pousadas de Portugal, a primeira na recta do cabo, a hoje fenecida Estalagem do Gado Bravo.

As autoridades de Bragança informaram o Secretariado da Propaganda Nacional das ditas preciosidades culinárias, relativamente à cidade do Braganção, lembraram e elogiaram: alheiras (época própria, de Outubro a Fevereiro) – alheira assada –, almôndegas de lebre (esta receita é originária da Pérsia), arroz de lebre e repolho, bifes de presunto e de vitela com batatas fritas, cabrito assado e guisado com batatas, caldo verde, chouriço de pão com grelos cozidos, cozido transmontano, empada de sardinhas, enguias fritas ou assadas, folar, frango abafado, grelos com bacalhau às tiras e pedaços de ovos cozidos, grelos de couve penca guisados com ovos batidos, leitão assado, lombo de porco assado, migas de bacalhau, pasteis de lebre, perdiz assada e de cebolada, rabas guisadas com ovos, salpicão assado, trutas fritas de escabeche e assadas na grelha, tabafeias, melão da Vilariça e queijo de ovelha. Este magnífico rol de comeres referentes a uma cozinha urbana e rural de gente de posses permite aos chefes e cozinheiros, às Mestras cozinheiras, a uns e a outras conceberem formidáveis recreações seja no respeitante ao escrupuloso respeito pelas receitas tutelares, seja no tocante às configurações modernistas da cozinha contemporânea. A descrição leva-nos a carpir mágoas ante o desaparecimento ou quase apagamento de algumas referências (almôndegas de lebre, trutas dos rios limítrofes, rabas guisadas), também enuncia sem margem para dúvidas a clara distinção entre alheiras, chouriços de pão e tabafeias. Ao longo dos anos através da palavra escrita e falada tenho denunciado de forma veemente a torpeza de postergar as tabafeias dizendo serem a mesma coisa que alheiras. Não são, possuo receitas a provarem as diferenças na sua composição, no entanto, sabichões de pouco estudo prático erguem muros de palavras furadas no intuito de provarem o afã igualitário. Em seu socorro podem invocar rechonchudos querubins, serafins e seráficos anjos, alheiras são alheiras, Tabafeias não são iguais às primeiras.
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No que tange à doçaria a lista enumera: bolo doce, amêndoas doces enfeitadas com canela, cavacos, súplicas, doce de melão, pastéis de ovos, bolos de chá e folares.

Se pretendermos fazer um estudo analítico à escolha de 1940 é evidente estarmos ante a vivaz realidade de um reino circular pontuado pela dualidade noves meses de Inverno e três de inferno, cujas assimetrias climatéricas influíam na colheita e caça de matérias-primas, sua conservação e fórmulas de as cozinhar. Bom seria que esta resenha patrimonial desse azo a investigações, estudos e propostas de sua revigoração e divulgação. A estrela bem concedida a Óscar Gonçalves pode servir de luz nesse propósito pois a competição é fervente quanto a água necessária à massa destinada às célebres tabafeias ora esquecidas por obra e graça do descuido e consequente preguiça. Ao meu amigo Alberto Fernandes lanço o pedido: recupera as Tabafeias.

Boas Festas, boas comidas!

PS. A condição sazonal das alheiras desfaz a lenda ardilosa de terem sido concebidas pelos judeus no intuito de enganar a Inquisição.



Armando Fernandes
in:jornalnordeste.com

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