Por: António Orlando dos Santos (Bombadas)
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
No começo do mês de Dezembro, o Advento comemorava-se com cerimónias religiosas em que se exortavam os fiéis a alegrarem-se pois que o dia de Natal se aproximava e com ele, o tempo do Nascimento do nosso Salvador.
Os dias decorriam mais lentos e os mais velhos tornavam-se mais serenos e as crianças entravam num estado de ansiedade, porque nesse período algo mudaria na vida da Rua, da família e das pessoas.
Era um tempo especial que dada a situação económica do povo, se preparavam coisas saborosas em quantidade e qualidade que seria néscio quem não fosse cooperante deste tempo de Festividades.
A Igreja mobilizava os seus servidores, que caprichavam em fazer das igrejas locais de visita obrigatória para adultos e crianças que por si só nos alegrava e nos faziam crer que, era claro como a água, o Messias havia nascido e que a humanidade estava salva, não sendo necessário outra coisa senão Crer!
Na minha rua a miudagem vivia esse tempo que mediava entre o Advento e o Natal entre a ansiedade e o desejo que o tempo passasse rápido, para se usufruir do que há quase dois mil anos se repetia simbolicamente, nunca havendo dúvidas quanto à veracidade de tal evento.
Na noite de Consoada, depois da ceia em que mesmo os menos abastados se locupletavam com uma refeição melhorada, às vezes com esforço financeiro, que não era ocasião própria para considerar, as famílias após o ágape deixavam passar algum tempo e preparavam-se para rumarem à Igreja, onde se celebraria a missa do Galo. Os mais pequenos ficavam em casa e os maiorzinhos e os adultos quase sempre influenciados pela Fé num Deus redentor e um respeito completo pela tradição de séculos, que fizeram desta festa o dia mais Santo da Religião Católica, rumavam à Igreja para participarem na Missa do Galo.
Não tenho intenção de fazer juízos de valor à celebração de tal dia nem sequer à veracidade de tal acontecimento. Tão só fazer uma pequena reflexão, comparando os usos e costumes de tal efeméride no tempo da minha meninice com o atual modo que verifico eu e quem haja vivido tempo bastante para poder fazê-lo.
É notório o intrometimento de usos e costumes estranhos ao nosso imaginário.
Digamos que numa terra como Bragança certas imagens do Natal moderno são do imaginário nórdico ou até americano. Sei que o que mais conta neste tempo é a obsessão do lucro que um consumismo exacerbado traz consigo e que nos faz ter como ídolos os que se adoram noutras paragens e que não trazem com eles outro que não seja, a rendição ao profano que nos desvia das nossas crenças e imaginário.
Pergunto o que terá que ver com o nascimento de Jesus, a árvore que foi implantado na praça da Sé, a neve, as renas e toda a fauna e flora que importamos de fora. O Pai Natal que aparecerá mais tarde o que nos diz? Eu sei que parecerá absurdo eu estar a incomodar-me com estas coisas quando a esmagadora maioria das pessoas não quer saber se os usos são nossos ou dos outros.
Não está no mesmo local um presépio gigante, para satisfazer os saudosistas?
Eu pretendo apenas expressar o meu desacordo com o uso de imaginários estranhos aos nossos que sendo mais ajustados ao tempo natalício foram remetidos para segundo ou até terceiro plano, quando nós possuíamos tudo o que era necessário para celebrarmos a nossa fé que os nossos maiores nos legaram e que tão bem se enquadrava nas Igrejas e nos lares onde vivemos. Reconheço que a mudança nos usos é um fenómeno imparável, já que a vontade de mudança nos está na matriz, mas, porque será que não a fazemos nós em vez de copiarmos usos dos outros que até são mais recentes e menos condizentes do que os nossos?
As catedrais cederam o lugar ao qual no devido tempo o povo acorria e os centros comerciais tomaram o seu lugar. O simbolismo do Natal passou a ser a imagem do lucro e com esta o consumismo se apoderou do nosso Natal.
Lamentavelmente não vejo os nossos intelectuais debruçarem-se e opinarem sobre esta e outras mudanças que nos fazem menos independentes e senhores dos nossos usos e costumes.
Reconheço que toda esta desistência do nosso património, material e imaterial se incrustou na minha casa de família, pois que fui incapaz de convencer as filhas e os netos de que chegava o Presépio e não era necessário Árvore de Natal, nem aquela coleção de renas e outros bichos mas, cedi.
Afinal eu nada posso contra o que mesmo erradamente está na Moda.
Resta-me pedir-vos o favor de pensarem nisto. Pode ser que algo se salve ainda.
Bragança 02/12/2021
A. O. dos Santos
(Bombadas)
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