A floração ocorre entre o inverno e a primavera, nos meses de janeiro a maio. As flores elegantes, em forma de hélice, são solitárias, axilares, hermafroditas e longamente pedunculadas. A corola é assalveada, tubular e possui pétalas azul-claras ou azul-violáceo, por vezes esbranquiçada na base. O cálice é composto por cinco segmentos estreitos, linear-triangulares.
Os seus frutos são pequenos folículos – frutos secos, deiscentes e polispérmicos, que se abrem por uma só fenda longitudinal, acastanhados e com numerosas sementes nuas no seu interior.
Habitat e ecologia
A pervinca tem uma área de distribuição nativa compreendida entre o Arquipélago dos Açores e a região oeste e central do Mediterrâneo, podendo ocorrer naturalmente na Península Ibérica, França, Itália, Argélia, Tunísia, Marrocos, Sardenha, Córsega, Baleares e Açores.
Em Portugal Continental ocorre um pouco por todo o território, e no Arquipélago dos Açores está presente em todas as ilhas.
A pervinca é uma planta ruderal, que vegeta preferencialmente em locais húmidos e ensombrados. O habitat mais comum desta planta é o subcoberto de bosques húmidos, geralmente carvalhais e galerias ripícolas, mas também está presente em matas, sebes, margens de campos e linhas de água.
Esta planta aprecia clima ameno, e para crescer em todo o seu esplendor, prefere locais de semi-sombra. A nível edáfico, prefere solos leves, húmidos, bem drenados e ricos em matéria orgânica.
É uma planta resistente ao frio, muito tolerante à baixa luminosidade e a ambientes secos. No entanto, quando expostas a grande intensidade solar, as folhas podem queimar-se. Não é tolerante ao calor intenso e a longos períodos de seca.
De uma maneira geral, pode dizer-se que a pervinca é uma planta pouco exigente e muito resistente.
A facilidade de se expandir ao longo de extensas áreas, formando tapetes densos de folhas verdes, repletos de flores azuladas no inverno e na primavera, tornam esta planta particularmente interessante do ponto de vista ornamental.
Todavia é necessário algum cuidado e controlo na utilização desta planta: como tem uma grande facilidade para enraizar e expandir-se, pode tornar-se invasiva.
A pervinca é cultivada como ornamental em espaço urbano, para cobertura de jardins e para formação de bordaduras vivazes, preferencialmente em locais à sombra.
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Pervinca (Vinca difformis). Foto: Luis Fernández García |
É perfeita para plantar em taludes ou em jardins rochosos para controlo da erosão e proteção do solo. Se for usada junto a muros, pode comportar-se como trepadeira, ainda que necessite de tutores para se apoiar.
Também é comum o seu uso em floreiras e vasos. Quando cultivada em vasos suspensos, a sua folhagem forma densos tufos pendentes, muito agradáveis e floridos.
Ação medicinal
Além da aplicação ornamental, a pervinca apresenta diversas propriedades e características que a tornam ideal para outros usos. Os seus caules são excelentes em cestaria, para o fabrico de cestas, por exemplo. Em algumas regiões esta planta também é usada na composição de ramos e outros arranjos florais.
Na indústria da cosmética e da perfumaria, da pervinca podem fazer-se cremes, óleos, tinturas e emplastros.
Esta planta é também reconhecida pelas suas inúmeras propriedades medicinais. Na sua composição, a pervinca contém taninos, flavonas, glúcidos, sais minerais, vitamina C, pectina e alcalóides indólicos, dos quais se destacam a vincamina, a vincristina e a sapargina, cujo princípio ativo é mais intenso durante o período de floração.
Os alcalóides presentes, principalmente a vincamina, têm uma ação anti-espasmódica, hipotensora, vasodilatadora cerebral e coronária.
As folhas secas desta planta são usadas na medicina tradicional como desinfetante e cicatrizante, no tratamento de hemorragias internas, infeções gastrointestinais e urinárias.
A pervinca também é usada no tratamento de diversas formas de cancro (leucemia, linfoma, entre outros), no tratamento de diabetes e de estados de pressão arterial alta.
Também possui uma ação tónica venosa e da microcirculação, é adstringente, combate vertigens e enxaquecas e possui também a faculdade de inibir a produção de adrenalina.
O seu poder contra as perdas de memória é reconhecido. Toda a planta é sedativa e um excelente estimulante cerebral e vasodilatador, é usada no tratamento da aterosclerose e alzheimer, entre outras doenças susceptíveis de causar demência.
Pela elevada quantidade de alcalóides presentes, a pervinca é uma planta muito tóxica, e deve ser manuseada com muito cuidado. Não pode ser ingerida e deve ser tomada apenas sob prescrição médica.
Outras Vinca em Portugal
Etimologicamente o termo genérico Vinca, nome latino para a planta, poderá derivar dos termos vincio = “amarrar ou enrolar”, vincire = “ligar”, ou de vincere, que significa “superar” – muito provavelmente devido à utilização das hastes jovens e compridas das plantas deste género botânico para entrelaçar e fazer coroas de flores e grinaldas.
As coroas e grinaldas feitas destas plantas tinham diferentes simbolismos, consoante a espécie usada e a região.
O restritivo específico difformis indica a forma incomum comparativamente à forma típica do género.
Além da Vinca difformis, espécie nativa no território nacional, é possível encontrar mais duas espécies semelhantes do género Vinca em Portugal, que apesar de não serem autóctones, estão amplamente naturalizadas: a pervinca, congossa-maior, pervinca-maior (Vinca major) e a pervinca, congossa-menor, pervinca-menor (Vinca minor).
As três espécies são muito semelhantes e podem ser confundidas umas com as outras. No entanto distinguem-se facilmente pelo tamanho e forma das folhas:
A Vinca major apresenta folhas maiores que a Vinca minor, mas ligeiramente mais pequenas que a Vinca difformis, com cílios bastante evidentes ao longo da margem, embora só sejam bem visíveis com lupa.
A Vinca minor apresenta folhas mais pequenas que as outras duas espécies. As folhas são tri ou tetraverticiladas no ápice dos ramos estéreis. As flores e as sementes desta espécie são de menor dimensão em relação às restantes espécies.
O habitat preferencial das três espécies é idêntico, podendo ser facilmente encontradas no subcoberto de bosques húmidos e na orla de cursos de água. E como já mencionado anteriormente, devido à facilidade com que enraízam e se expandem, qualquer uma das três pode tornar-se invasiva.
“Violetas-feiticeiras”
A pervinca é uma planta simbólica, envolta em rituais supersticiosos de magia e bruxaria.
Esta planta é tida como arauto da presença de fadas e como um contrafeitiço natural, que afasta a inveja, o mau-olhado e os espíritos nefastos e que atua como filtro energético, transformando as energias negativas em positivas.
No séc. II, era utilizada no combate a doenças do diabo, por exemplo.
Ainda hoje, em algumas regiões de Inglaterra e da Irlanda, onde esta planta é conhecida como devil’s joy (prazer-do-diabo), é comum pendurar ramos de pervinca para dar sorte e afastar o mau-olhado.
Na Idade Média, era considerada a planta dos poetas e dos feiticeiros, que recomendavam a sua contemplação para acalmar a vista cansada e melhorar a memória. Daí haver quem a apelide de sorcerer’s violet (violeta-feiticeira).
Uma análise bem cuidada da morfologia das suas flores permite perceber que, apesar de ser composta por cinco pétalas formando um pentagrama, a união basal forma um tubo hexagonal perfeito, recriando a ideia de uma estrela de cinco pontas – uma das representações do infinito, que associada à cor das suas flores, espiritualmente participa das ideias de “passagem” e “transmutação”.
Posto isto, não é difícil perceber o quanto esta planta foi importante ao longo da História e o que ainda representa atualmente.
A cor do ano, escolhida pela Pantone para 2022, reflete sem dúvida o que está a acontecer globalmente. Vivemos uma fase de transformação e transição, numa altura em que nos libertamos de um longo e intenso período de isolamento, em que as nossas vidas estão a mudar e a adaptar-se a novos padrões.
Dicionário informal do mundo vegetal:
Vivaz – planta que vive mais do que dois anos, renovando anualmente a parte aérea.
Perenifólia – de folha persistente ou folha perene. Planta que mantém as folhas verdes ao longo de todo o ano, fazendo a sua renovação gradual sem que fique despida.
Rizomatosa – planta cujo caule é subterrâneo (rizoma).
Estolhosa – planta que possui estolhos.
Estolho – rebento ou ramo basal, longo, delgado e prostrado (estendido sobre o solo), capaz de enraizar nos nós e formar novas plantas.
Decumbente – caule ou ramo deitado sobre a terra, por onde se alastra e com a ponta levantada para cima.
Ascendente – caule que se desenvolve na posição horizontal ou quase, mas que tende a verticalizar.
Ovada – folha com a forma de um ovo mais larga perto da base.
Lanceolada – folha com forma de lança.
Peciolada – provida de pecíolo.
Glabra – sem pêlos.
Pedunculado – que tem pedúnculo, “pé” que sustenta a flor.
Assalveada – flor com corola simpétala com tubo longo e estreito, que se dilata bruscamente em limbo plano ou côncavo.
Simpétala – corola cujas pétalas se encontram unidas (“soldadas”) entre si.
Cálice – conjunto das sépalas, que protegem externamente a flor.
Folículo – fruto seco, com várias sementes, que se abre por uma única fenda para libertar as suas sementes.
Deiscente – fruto que, quando maduro, se abre naturalmente para libertar as sementes.
Polispérmico – fruto com muitas sementes.
Verticilado – quando 3 ou mais órgãos semelhantes (por ex. ramos, folhas) se dispõem no mesmo nó. Tri – indica que a folha se encontra repetida três vezes. Tetra – indica que se encontra repetida quatro vezes.
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