sexta-feira, 9 de outubro de 2015

OS CORREIOS - A rede dos correios em Trás-os-Montes

As comunicações político-administrativas das entidades administrativas entre si e no interior da Província, das comarcas e concelhos e delas com o centro político – Lisboa e outros centros políticos do território nacional – fazem-se a partir da rede e roteiro dos correios. Ela adapta-se naturalmente às realidades e possibilidades das comunicações e rede viária das terras e Província, ainda que obviamente o maior ou menor desenvolvimento da rede de postos e peões do correio, à partida, introduza também maior mobilidade e rapidez de circulação.
A rede dos correios

Em 1745 J. B. de Castro fixará numa obra notável – O Mapa de Portugal com o Roteiro Terrestre (na 2.ª edição de 1762-1763) – os roteiros, distâncias e tempos de viagem de Lisboa a todas as partes do território, que pela primeira vez nos fixará Portugal articulado e medido em distância e tempos de viagens, de légua a légua e hora a hora. A partir daí os Mapas de Portugal podem conter essas informações e guias de viagens. E em muitos mapas tal se realizaria, como se verificou com a Carta militar das principais estradas de Portugal, de Lourenço Homem da Cunha d’Eça (Lisboa, 1808) que realizará a transposição cartográfica daquele roteiro de João Baptista de Castro.
O Roteiro e Mapa de J. Baptista de Castro vai centrado e articulado a Lisboa e é em relação à capital do Reino que se organizam e distribuem os roteiros de viagem que entrelaçam o conjunto do território nacional.
A Província de Trás-os-Montes alcança-se a partir do Roteiro de viagem que arranca de Lisboa e nela se entra pela Torre de Moncorvo, roteiro de viagem mais curto e mais rápido. E é a partir da Torre, cabeça de comarca, que se desenvolvem os roteiros para alcançar as outras cabeças de comarca da Província: Bragança, Miranda e também Vila Real (ainda que para esta haja o seu próprio Roteiro principal). De Lisboa a Torre de Moncorvo, contam-se 61 léguas; a Bragança mais 13 e a Miranda outras 13, o que significa 74 léguas de Lisboa àquelas outras cabeças de comarca de Província.
A articulação da Província a partir da Torre de Moncorvo por este caminho dos correios, segue 5 trajectos, dirigidos aos 5 pólos principais que enquadram e articulam interna e exteriormente a Província: a Bragança, num trajecto de 14 léguas, que liga os pontos principais da Torre a Alfândega da Fé, Vale de Prados e Bragança. Atravessa 11 ribeiras, as mais importantes, a da Vilariça, de Junqueira para Santa Comba; a Freixo de Espada à Cinta, num trajecto de 3 léguas, unindo Torre, Mós, Freixo; a Miranda, num trajecto de 13 léguas, unindo Torre a Carviçais, Mogadouro e Miranda; a Chaves, num trajecto de 14 léguas, unindo Torre a Vila Flor, Mirandela e Chaves; a Vila Real, num trajecto de 14 léguas, unindo Torre a Vila Flor, Murça e Vila Real.
Da cabeça das outras comarcas organizam-se outros roteiros: de Bragança para Chaves; de Bragança para Miranda. De Miranda fornece-nos tão só um sumário das distâncias aos principais centros da sua correição.
Na Província de Trás-os-Montes, o serviço do Correio está particularmente concentrado e é exercido pelos correios de Bragança, Chaves, Torre de Moncorvo, Vila Real e Miranda, tendo em consideração que são as terras que mais freguesias servem, segundo os dados que a tabela seguinte mostra:

* Joaquim Ramos de Carvalho, «A rede dos correios na segunda metade do
século XVIII» in As comunicações na Idade Moderna (coord. de Margarida
Sobral Neto), Fundação Portuguesa das Comunicações, 2005, p. 91.

Tal concentração é a mais clara expressão da dinâmica criada e imposta à comunicação
administrativa pelas cabeças da comarca da Província, onde também se integra Chaves, como uma segunda cabeça da comarca brigantina para a parte ocidental da Província.
Pelas Memórias Paroquiais de 1758, agora publicadas, é possível seguir mais pormenorizadamente esta articulação desenhada pelos correios, porque em resposta ao item do Inquérito, os párocos devem responder a esta questão. No que diz respeito à área do actual distrito Brigantino aquelas dominâncias aparecem-nos significativamente alteradas. E Torre de Moncorvo aparece numa posição bem mais relevante do que a resumida na tabela acima.
A análise das respostas dadas pelos
párocos permite de facto salientar outra hierarquia de
«centralidades». Desde logo o papel relevante do Correio da Torre de Moncorvo. Em termos da actual divisão administrativa ele serve: todas as freguesias do concelho de Moncorvo (numa distância máxima de 4 léguas); todas as freguesias do concelho de Freixo (numa distância máxima de 5 léguas); todas as freguesias do concelho de Alfândega da Fé (até uma distância de 5 léguas); a quase totalidade das freguesias do concelho de Vila Flor (até uma distância de 5 léguas, com alguma concorrência de Vila Real); grande parte das freguesias do concelho de Mogadouro (até uma distância de 7 léguas sofrendo aqui a concorrência do concelho de Miranda).

Pelo correio da Torre de Moncorvo serve-se também um grande número de freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros (até uma distância de 8 léguas). Aqui reparte-se com o serviço do Correio de Bragança (que atinge também as 8 léguas). E o correio de Torre de Moncorvo atinge também muitas freguesias de Mirandela (até 8 léguas). A Torre de Moncorvo o correio chega na Terça Feira e parte na Quinta Feira. A articulação com Freixo faz-se por um correio peão pago pela câmara de Freixo (Memória de Freixo, concelho Freixo de Espada à Cinta); com Alfândega da Fé, Macedo de Cavaleiros pelo roteiro que liga a Bragança; com Mogadouro, pelo roteiro que liga a Miranda; com Vila Flor, Mirandela pelo Roteiro que liga a Chaves.
Depois do Correio da Torre de Moncorvo o papel mais relevante é desempenhado pelo Correio de Bragança: serve todas as freguesias do concelho de Bragança (até uma distância de 5 léguas); algumas freguesias do concelho de Vinhais (até 5 léguas de distância); e também algumas freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros (até uma distância de 8 léguas), e algumas freguesias do concelho de Vimioso (até 5 léguas). Tal é feito pelo roteiro que liga Bragança a Chaves (para as freguesias do concelho de Vinhais); Bragança a Miranda (para Vimioso); Bragança para Torre de Moncorvo por Macedo.
O papel dos outros correios é mais limitado: assim o de Miranda que serve essencialmente o seu concelho (até 5 léguas) e mais algumas freguesias mais próximas no roteiro que o liga à Torre e a Bragança. E o Correio de Vinhais que serve o seu concelho, se articula e sofre as concorrências do de Bragança e Chaves. De resto, de fora da área do Distrito de Bragança exerce aqui a sua influência o Correio de Vila Real, em Carrazeda e em articulação com este (até uma distância de 8 léguas) em Mirandela (até uma distância de 9 léguas); o de Chaves em Mirandela e em Vinhais (até uma distância de 7 léguas; o de Murça, em Mirandela, (até uma distância de 4 léguas).
Estas são articulações que em geral se fazem por caminhos «trabalhosos» (Memória de Chacim, concelho de Macedo de Cavaleiros) que entre os pontos mais extremos destas articulações se fazem a pé, em viagem de um dia (Memória de Linhares, concelho de Carrazeda de Anciães). Em princípio o percurso de uma légua tem por referência uma hora de duração de viagem, mas as situações variam muito no terreno e até nas diferentes estações. Este é um correio pago pelos particulares, mas o correio público é pago pelas câmaras para o que têm assentamento nas suas contas, os partidos do correio e o serviço de peões e estafetas, como se refere para em Freixo (Memória de Freixo de Espada à Cinta) e Carrazeda de Anciães (Memória da vila de Carrazeda). Por eles estabelece-se uma comunicação articulada aos grandes centros político-administrativos provinciais e por eles se articulam ao exterior.
Torre de Moncorvo é a articulação interna e externa mais desenvolvida desta área da Província. A sua directa ligação ao Porto e a Lisboa confere-lhe certamente uma liderança interna também maior. Mas Bragança, ganhará, ao longo do século XVIII um acentuado crescimento ao ritmo do apagamento de Miranda e por ela também a uma das ligações importantes de Torre de Moncorvo. Com a criação da diocese em Bragança essa dinâmica acentuar-se-á. Progressivamente pelos eixos Bragança-Chaves e Bragança Mirandela-Chaves se irão desenvolvendo maior número de comunicações e por eles fazer bascular a dinâmica administrativa da região para esta banda do território.
Estes roteiros desenhados pelos correios a meados do século XVIII pretendem corresponder às necessidades político-administrativas das principais terras da Província. E não há dúvida o extraordinário desenvolvimento da rede de articulações que todos os autores enumeram para a Província estão em relação com o povoamento concentrado e o elevado número de unidades administrativas a enquadrar o território, ambos se conjugando para a necessidade de uma forte rede de articulações e comunicações organizadas.

Memórias Paroquiais 1758

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