Local: MOGADOURO, BRAGANÇA
O Mestre, acompanhado dos doze, tinha tido um dia extenuante, de forte canícula, pelos caminhos da Palestina. A sede era muita. Há um ditado que diz que “a fome entristece mas a sede enfurece”. Todas sabemos por experiência própria que é assim. Jesus, talvez pressentindo a sede que iria sofrer na Cruz, sentiu-se desfalecer. Ao passar diante da casa de um rabino judeu, não podendo mais, pediu humildemente:
— Deixai-me repousar um pouco no teu pátio e dai-me uma cânfora de água, que estou a morrer de sede! Já percorremos hoje muitas léguas e não encontramos uma fonte para molhar a boca!
O rabino olhou de soslaio para Jesus e retorquiu:
— Não estou para dar pousada a vagabundos e vadios. E a água custa-me muito ir buscá-la ao Rio Jordão.
— Eu não sou vagabundo nem vadio. Ando a ensinar ao mundo a Lei da Caridade e do Amor.
— Qual Amor nem qual carapuça? A nossa lei é: olho por olho e dente por dente. Portanto, toca a andar e sai da minha vista, antes que te enxote como a um cão.
— Sim, vou-me embora, mas, em teu castigo, por não teres saciado a sede ao Filho do Homem, que passou pela tua porta, desfalecido, também tu caminharás, sem descanso, até ao fim do mundo, por todos os caminhos, sem nunca teres descanso, e sempre atormentado pela sede.
O rabino sentiu uma força misteriosa que o impeliu a caminhar, e nunca mais parou, arrastando por todos os cantos do mundo, de noite e de dia, o seu triste fadário.
Tal como acontece com outras figuras lendárias, há quem afirme ter encontrado o judeu errante, por acaso, maltrapilho e de grandes barbas, encostado a um bordão, parando só de vez em quando junto de alguma fonte para tentar matar a sede que constantemente o aflige, a fim de se lembrar da sua recusa em dar um copo de água ao Nazareno, que lhe bateu à porta.
Fonte:OLIVEIRA, Casimiro Raízes: Poesia, Contos e Lendas Mogadouro, Associação Cultural e Recreativa de Soutelo, 1998 , p.71-73
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