Apoiada por Marinho e Pinto, Elina Fraga, de 43 anos, milita no PSD e vem de Mirandela. Quem a conhece diz que esta transmontana franzina é uma mulher tesa. Derrotou cinco rivais, todos homens
Franzina, mas tesa. Uma transmontana de cepa. É assim que a segunda bastonária da história da advocacia portuguesa, Elina Fraga, é vista por vários dos seus pares. Aos 43 anos, venceu, já a madrugada de sábado se estava a transformar em dia, os seus cinco rivais do sexo masculino. Advogados que têm seguido o seu percurso notam, no entanto, que a sua nova representante nunca teria chegado onde chegou se não fosse o seu antecessor no cargo, Marinho e Pinto, que a apoiou nesta eleição.
Filiada no CDS e mais recentemente no PSD, partido pelo qual já exerceu funções autárquicas, não tem deixado a militância laranja tolher-lhe os passos: como número dois de Marinho e Pinto na Ordem dos Advogados, assumiu as mesmas posições de confronto com o Ministério da Justiça, nomeadamente no que diz respeito ao previsto encerramento de tribunais e à defesa dos direitos dos defensores oficiosos.
O tom com que trilhará o mesmo caminho do seu antecessor, esse é que será de certeza outro: muito mais contido, ou não fosse esta mulher de voz gutural nascida em Valpaços e a exercer num pequeno escritório de Mirandela uma pessoa reservada, embora combativa. Um dos seus vice-presidentes, Godinho de Matos, fala numa personalidade “contida, cerebral”, que poderá estabelecer um relacionamento mais fácil do que o seu antecessor com os poderes instituídos — sem, porém, ceder a eles. “Não é de manter as coisas em lume brando para o conteúdo não transbordar”, resume.
Licenciada pela Universidade de Coimbra, foi estagiar com o advogado socialista Adérito Pires, de Mirandela. “Acompanhei-a quando começou a dar os primeiros passos na advocacia, com 20 e poucos anos”, recorda o antigo patrono, garantindo que Elina Fraga nunca revelou qualquer insegurança durante o estágio. Queimava as pestanas em horas de estudo e trabalho: “Os estagiários não têm de cumprir horários rigorosos, mas ela gastou sempre muitas horas no estágio”.
Apesar ter vindo “de uma comarca da província” e de ter entrado mais tarde noutros circuitos, em Lisboa, não mudou, assegura Adérito Pires: “Continua igual”. Hernâni Moutinho, em cujo escritório terminou o estágio, não ficou surpreendido com a sua eleição: “Primeiro, por mérito próprio. Segundo, pelo apoio inestimável do anterior bastonário. Em terceiro, pelos tiros nos pés dos adversários, que fizeram uma campanha torpe”. Aquilo a que chama campanha torpe relaciona-se com a queixa de uma antiga cliente a quem não terá tratado atempadamente de um processo, o que lhe valeu um processo disciplinar da Ordem dos Advogados que por pouco não a impedia de concorrer a bastonária.
Elina Fraga impugnou a decisão dos seus pares em tribunal, mas a acção principal ainda não foi decidida — o que quer dizer, pelo menos em teoria, que o seu mandato poderá vir a ser abruptamente interrompido se a justiça entender que foi correcta a censura que lhe aplicou a Ordem. Outro vice-presidente seu, Eldad Neto, assegura que o caso não tem pernas para andar, até porque o juiz que admitiu a providência cautelar que permitiu a Elina Fraga concorrer à Ordem dos Advogados foi muito claro ao dar-lhe provisoriamente razão. Nestas eleições, porém, foi uma lista afecta à nova bastonária que ganhou a presidência do órgão que lhe aplicou a sanção - e não alguns dos seus rivais internos, como havia sucedido no mandato que agora termina.
A nova bastonária contou com 6175 votos de um total de 20.199, o que corresponde a 31%, enquanto o seu concorrente mais directo, Vasco Correia, se ficou pelos 3446 votos, ou seja, 17%. É preciso remontar ao início dos anos 90, estava Laborinho Lúcio na Justiça, para encontrar a sua antecessora no cargo: Maria de Jesus Serra Lopes.
Divorciada e com uma filha de 17 anos, Elina Fraga irá usufruir do mesmo salário do seu antecessor: umas centenas abaixo dos cinco mil euros mais algumas despesas de alojamento, uma vez que não tem residência em Lisboa. Defensora dos advogados que não estão enfeudados aos grandes interesses económicos nem trabalham nos grandes escritórios, a primeira coisa que tenciona fazer é pedir uma audiência à ministra da Justiça, que na sua opinião já chegou a humilhar os advogados. Por muitas que sejam as divergências, será uma conversa de mulher para mulher.
com António José Rodrigues
in:publico.pt
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