Em Trás-os-Montes jogar à bola não é só para rapazes. Uma equipa feminina de verdadeiras mulheres de "armas" está a militar, pelo 2º ano consecutivo, no nacional de Juniores. Mas não tem sido fácil.
O ano passado, jogaram com as cores dum clube da cidade de Bragança. No final da época "chutaram-nas" literalmente para fora de campo. Este ano, e para poderem competir, reativaram uma associação com 23 anos de vida, numa aldeia do concelho.
Só têm um treino por semana e o único patrocínio é duma padaria. Fazem das fraquezas, força. Todas as semanas chegam raparigas novas aos treinos.
"Hoje temos mais duas raparigas novas. Vêm com o "pé atrás". Elas dizem todas que não sabem jogar e depois revelam-se em campo. É sinal que estamos a quebrar o preconceito". A satisfação é de Alexandra Pires, presidente da Associação Cultural e recreativa da aldeia de Paredes: "Estava criada já há 23 anos mas não tinha dado início de atividade. Através dela criámos condições para elas entrarem no campeonato".
Alexandra assiste a um treino no início da noite de segunda-feira gelada em Bragança. O único dia da semana que treinam. "Não temos campo! Nós precisávamos de outro dia para treinar mão não há campo para nós", diz um pouco desiludida e à pergunta se não há campos em Bragança responde: "Em Bragança há mas não há horários para nós".
É por isso e por tudo o resto que a vida deste clube "recém-nascido" não tem sido fácil, acrescenta Alexandra Pires. "Está a ser difícil. Temos muitos entraves. Campo, transportes, porque elas são meninas de Alfândega da Fé, Mirandela ou Vinhais e Bragança e acaba por nos criar também muitas condicionantes."
É o caso de Marta Baptista. Todas as segundas-feiras, ela e mais duas colegas vão de autocarro de Mirandela para Bragança só para treinarem. São 70 quilómetros. Para voltarem para casa alguém da família tem que ir buscá-las porque não há transportes de volta. Marta tem 16 anos. Quer muito jogar futebol." Estamos no século XXI e há muitas raparigas que gostam de praticar a modalidade que poderá ter sucesso. Acho que isto poderá ser o meu futuro e quero seguir com isto para a frente," conclui.
Uma paixão que também se apoderou, desde pequenina de Tatiana Caseiro. Tem 17 anos. Ela e a irmã de 15 são de Alfândega da Fé, a cerca de 80 quilómetros de Bragança. Pediram aos pais que as matriculassem numa escola da capital de distrito. Moram num lar. Dentro do campo sentem-se livres. "Porque dentro do campo esquecemos todos os problemas". Diz ter duas opções para o futuro, "ser jogadora profissional ou jornalista". Acrescenta que os pais delas se "sentem orgulhosos mas é um bocado chato principalmente ao fim de semana porque temos jogo" e não podem estar muito tempo com eles.
Os pais são uma peça importante para a equipa. Ajudam no que podem. Mário Alves é de Vinhais. A filha tem 13 anos. Às segundas - feiras vêm duas de lá. Ida e volta são 70 quilómetros. "Costumo trazer a minha filha e outra miúda, aos treinos, aos jogos. Quando não posso vem a mãe da outra trazê-las." E acrescenta que "é uma paixão o que ela tem pelo futebol".
As cerca de 20 miúdas que aqui estão têm idades entre 13 e 16 anos. Competem no escalão sub19 com mais nove equipas de toda a zona norte. O ano passado ficaram em terceiro. Este ano à entrada para a segunda volta estão em quinto. A escola de línguas Lencaster de Bragança apoiou-as com dois equipamentos e o único patrocínio vem da padaria Argozelense. Cristina Alves, tesoureira, fala dos apoios. "Poucos ou nenhuns. Nós temos insistido bastante e temos lutado, temos tentado contactar as entidades que estão diretamente ligadas ao desporto mas as portas não se têm aberto com nada".
Mesmo não tendo os apoios necessários a equipa de futebol feminino da Associação da aldeia de Paredes vai continuar a fintar o destino. Até porque há meninas e muitas prontas para se fazerem campeãs... a última a chegar à equipa foi a Ana Margarida. Tem sete anos. "Gostava de ser rapaz!" Diz cabisbaixa. "Gostava de ser rapaz porque assim podia jogar futebol e eu gosto muito". Ali, num pequeno espaço do campo treina com o Chico, com o Diogo, a Sara e com uma amiga chamada Benedita.
Afonso de Sousa
TSF
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