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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 19 de setembro de 2017

Sociedade Promotora dos Melhoramentos de Agricultura do Distrito de Bragança

Em harmonia com o decreto de 20 de Setembro de 1844, organizou-se em Bragança esta sociedade cuja instalação teve lugar nos princípios de Março de 1845 por ocasião da reunião extraordinária da Junta Geral a que assistiram o Governador Civil, presidente nato da mesma, os membros desta corporação, os da Câmara e Concelho Municipal de Bragança e o Provedor de Saúde. Eram membros da direcção:

António Ferreira de Macedo Pinto,
Diogo Albino de Sá Vargas,
Tomás Carlos Leopoldino Cardoso e Sá,
António José Teixeira,
António José de Morais,
António Rodrigues Ledesma de Castro.
Joaquim Álvares Falcão e
Manuel José Dias Mendes Pereira

O fim desta Sociedade era vulgarizar os conhecimentos e meios adequados para o melhoramento da agricultura. Os seus Estatutos têm a data de 3 de Março de 1845 e foram publicados no Farol Trâsmontano, págs. 7 e seguintes, de onde estraímos esta notícia.
O citado decreto mandava que em cada uma das capitais do distrito se organizasse uma Sociedade Agrícola que devia ser presidida pelos respectivos governadores civis e ter por sócios correspondentes os membros das juntas gerais, os administradores dos concelhos e os médicos e cirurgiões de partido das câmaras municipais.
Por decreto de 23 de Novembro de 1854 foi estabelecido o Regulamento Geral das Sociedades Agrícolas.
A portaria de 10 de Dezembro de 1860 exigia que a Sociedade Agrícola do Distrito de Bragança elaborasse um plano geral acerca do melhor meio de aproveitar os seus terrenos incultos, indicando ao mesmo tempo as providências necessárias para o melhoramento da agricultura no distrito.
Outra portaria da mesma data versava sobre o estabelecimento de viveiros de plantas, principalmente de amoreiras, nos terrenos do mesmo distrito.
O Governo concedia a cada uma das câmaras municipais do distrito de Bragança o subsídio de 100$000 réis, e com igual quantia concorreria cada uma delas para o estabelecimento dos mencionados viveiros.
Para este fim organizar-se-ia uma comissão que teria em vista:
1.º Submeter à aprovação da direcção o plano do estabelecimento dos viveiros;
2.º Providenciar acerca da conveniente disposição dos terrenos.
3.º Regular as sementeiras, plantações e cultura dos viveiros;
4.º Prover à guarda, despesa e conservação das plantas;
5.º Marcar o preço por que as plantas deviam ser vendidas;
6.º Escriturar as contas de receita e despesa;
7.º Autorizar todos os pagamentos;
8.º Nomear o guarda conservador dos viveiros;
9.º Enviar à direcção um relatório anual do estado dos viveiros, com todos os documentos comprovativos da receita e despesa.
Conselho de Agricultura do Distrito de Bragança
Os conselhos de agricultura distritais foram criados pelo Regulamento de Agricultura Distrital de 28 de Fevereiro de 1877. No distrito de Bragança organizou-se e celebrou-se a sua primeira sessão a 2 de Abril de 1877. Os Anais Agrícolas do Distrito de Bragança, publicados pelo Conselho de Agricultura do mesmo distrito (ano I, 1876 a 1877, 4.º de 75 páginas), dão notícia dos seus trabalhos.

A SEDA
Em 1475 o duque de Guimarães representou a el-rei que tendo feito contrato com Rui Gonçalves de Portilho e Gabriel Pinello, genovês, para lavramento da seda em Bragança, e não sendo a da terra suficiente, porque era indispensável mais fina, lhe pedia, portanto, que isentasse de direito a que importasse de Almeria e de outras partes de fora do reino, para aquele serviço. D. Afonso V concedeu-lhe a isenção com certas cláusulas.
Outro privilégio lhe foi concedido no mesmo ano para idêntico fim.
Tinha ele feito contrato com certos castelhanos para a venda da seda das terras de seu pai e suas, e, como esses castelhanos pagavam com panos que traziam do seu país, pedia para que eles os pudessem retalhar. El-rei, revogando a Ordenação em contrário, concedeu o privilégio.
Não achámos documentos mais antigos referentes a esta indústria; no entanto, podemos concluir que era muito mais antiga, pois a vemos explorada em 1233 perto de Chaves.
A 11 de Fevereiro de 1475 assinava D.Afonso V, em Estremoz, uma carta, pela qual permitia a esse duque que fizesse experiências em algumas terras das comarcas de Entre Douro e Minho e Trás-os-Montes, para a pesquisa de metais, podendo abrir minas e explorá-las, sem pagamento de direitos reais. O respectivo privilégio foi-lhe concedido por espaço de vinte anos.
«Em 1531 pedia-se ás côrtes que as sedas que se creassem e obrassem em velludos, tafetás, retrozes e outras obras, assim na cidade (de Bragança) como na terra, podessem ir livremente pelo reino vender-se, sem pagarem E em 2 de agosto de 1616 o duque de Bragança, tendo em consideração a sua diminuição por se não comprirem as leis que tinham firme em côrtes, recomendava aos habitantes que as cumprissem».
O mesmo duque de Bragança, por carta de 19 de Julho de 1549, manda ao juiz e mais justiças de Bragança que «toda a seda fiada ou em capellos que na cidade ou seu termo houver querendo-a os officiaes que theares nella tiverem pelo tanto que os de fora derem lha deem».
Carvalho da Costa, que escreveu a sua obra em 1706, diz que em Bragança se fabricavam veludos, damascos, pinhoelas e gorgorões, e que aqui houve uma casa por conta do rei em que se obravam excelentes veludos lavrados.
Como vemos, é muito antiga a indústria da seda no nosso distrito.
Do que deixámos escrito no capítulo da Topografia (986), podemos deduzir que ela permaneceu sempre em Bragança mais ou menos, conclusão a que também nos leva a consideração em que a amoreira era tida nos Tombos dos Bens do Mosteiro de Castro de Avelãs e Cabido de Miranda.
Vejamos agora como se exprime a tal respeito uma pessoa autorizada.
«A fabrica de sedas em Traz-os-Montes é notável pela sua grandeza e perfeição das obras que trabalha.
A fábrica de Chacim está bem diminuta; os fabricantes se mudaram para Bragança e outras partes para terem de que viver.
A fábrica se exercita em Bragança, Vinhaes, Rebordello, Chacim, Bornes e Lebução.
As fazendas fabricadas são: peluças de todo o genero, lizas, de dados e riscadas: mantos, gorgorões, setins, tafetás, nobrezas, etc. São de uma manufactura especial e merecem grande estimação em toda a parte.
A fabrica de Bragança consta de mais de duzentos teares, doze de setim, vinte e dois de nobrezas, tres de nobreza larga, oitenta de tafetás, trinta e tantos de mantos e gorgorões e os mais de peluças, e quarenta tornos de torcer seda.
Ha abundancia de seda para sustentar tudo isto e ainda mais. Vae muita para todo o reino, e os negociantes da côrte a vão comprar ás duas famosas feiras de Grijó de Valbemfeito e Mirandella, nos dias de Santiago o S. Bartholomeu, onde concorre muita seda especial, que se cria por aquellas partes.
Esta seda é toda fiada naquella provincia; porém, ainda não é com perfeição, do que se segue notavel detrimento para a fabrica. E por isso similhante seda não é capaz para setins, tafetás, nobrezas, e se gasta ainda muita de ltalia para isto.
A arte de torcer a seda está em perfeição em Bragança. Os tornos torcem não só para a provincia, mas para todo o reino. De fórma que todas as fabricas do reino se servem da seda torcida em Traz-os-Montes.
A arte de tingir esta em muita perfeição, em nehuma parte do reino se tinge melhor, isto pelo que toca á côr preta; para as outras côres mandam ao Porto a seda, pois comquanto saibam não é com tanta perfeição.
Na arte de dobar exercitam-se em Bragança muitas mulheres que só vivem disto; porém, ainda ignoram os engenhos de dobar a tres e quatro dobadouras.
A fabrica de sedas de Bragança é das mais famosas não só da provincia mas de todo o reino. Ha pouco mais de cem annos que se conserva em Bragança, mas o máu regimen, falta de methodo e consumo das fazendas a teem feito decahir por muitas vezes. Fabricavam-se nella diversas qualidades de obras que tinham grande estimação em todo o reino pela bondade da tinturaria e das manufacturas, que por mais de cincoenta annos se conservou no seu florescimento. Depois disto decahiu, pois falsificavam as fazendas no tinto, isto pouco antes do terremoto.
Pelo mesmo tempo entrou esta fabrica em uma notavel decadencia, porque sendo os mantos as suas principaes manufacturas e tendo quasi toda a extracção para a côrte, começaram as senhoras de Lisboa a não usal-os, cujo costume se ficou conservando até hoje, excepto algumas mais graves que, não saindo de carruagem, não usam de lenços, mas de mantos.
Por esta causa quasi todos os teares e os fabricantes decahiram em notavel pobreza chegando á miseria de necessitarem de esmolas para subsistir.
Ao uso das peluças em Portugal deveu a fabrica toda a sua restauração, aplicando se os fabricantes a este genero. Porém, tornaram a abusar da sua prosperidade damnificando as manufacturas de fórma que, sendo aliás estimaveis, as puzeram em estado de ninguem as querer e de lhes ser o consumo difficultoso, sendo a decadencia mais do que dantes tinha sido. A pobreza tornou a infelicitar muita gente e muitas familias desampararam a cidade por lhes faltar de que viver.
Assim estavam as coisas, quando em 1773 e 1774 o negociante João Antonio Lopes Fernandes, agil e emprehendor, deu nova alma a esta decadente industria.
Desde o tempo do terremoto este homem teve alguns teares por sua conta, cujas manufacturas sempre se distinguiram das outras, mas neste anno fez levantar todos quantos teares se achavam decahidos, mandou fazer por sua conta muitos de novo, pondo em acção os abandonados fabricantes e ensinando-lhes o modo de fabricarem tafetás, que, até então lhes era desconhecido.
Fez conduzir da fabrica real da côrte um habil tintureiro; edificou duas tinturarias: uma para preto, outra das mais côres, em que se tinge mui perfeitamente; e fez trabalhar peluças da melhor qualidade e de um grande consumo,muitos tafetás, nobrezas e setins excellentes, que alguns os querem com preferencia aos de Italia.
O dito negociante é um benemerito da patria e industria de Bragança.
Todas as obras das ditas fabricas são muito perfeitas. As suas manufacturas tem muita extracção para todo o reino e foram mesmo para a America, para o que concorre muito a liberdade de extracção, sem pagar direitos, concedida ás manufacturas do reino por D. José I, pelos decretos de 2 de abril de 1757 e 24 de outubro do mesmo anno.
Sustenta o dito negociante João Antonio Lopes Fernandes cento e oito teares, sendo o maior numero de tafetás em que consome todos os annos oito mil arrateis de seda, a qual é de Italia quasi toda por ser a da provincia muito mal fiada.
A provincia de Traz-os-Montes é tão abundante de seda que colhe regularmente vinte mil arrateis della fina e outro tanto de seda macha e redonda.
O resto dos teares são divididos por três ou quatro negociantes que, todos, não fazem o numero dos do dito João Antonio Lopes Fernandes.
Esta fabrica, comtudo, não sendo debaixo da inspecção publica, ameaça muito brevemente a sua decadencia; por isso devia estar nas vistas de um conservador recto, fazendo marcar as manufacturas, qualificando-as, impedindo os furtos que já se fazem bastantes nas sedas.
Também desde os tempos mais antigos, a villa de Chacim foi muito industriosa, tendo grande manufactura de gorgorões, mantos, velludos lavrados e lisos que faziam viver muita gente de ambos os sexos.
Desde o anno de 1750 a 1755 constava a fabrica de vinte e tantos tornos de torcer, mais de cincoenta teares de sedas lisas, dois de velludo, oito de sedas lavradas e dez de toda a variedade de fitas. Sustentou tudo isto, no seu maior auge, o grande negociante, o mestre de campo que morreu ha poucos annos e agora se acha a fabrica em notavel decadencia.
Para os tafetás dobles a seda vinha de Italia, e a mais fina da nossa provincia era empregada nos mantos e peluças».
O autor menciona também o método de fiar a seda, descrição dos teares e mais aprestes técnicos.
O foral dado a Mirandela em 1513 por D.Manuel, que adiante damos, deixa ver a importância que já então tinha aí a cultura do sirguo. E, segundo uma tradição referida por Borges (989), a fábrica da seda de Bragança «e seo destricto constava de cinco mil teares».
Em carta régia de 23 de Outubro de 1778 aprovou a rainha D.Maria I os estatutos que deviam reger as escolas de fiação e filatório das províncias de Trás-os-Montes e Beira. Ao ouvidor da comarca de Bragança pertencia vigiar pela sua execução, participando ao mesmo tempo por intermédio da Real Junta do Comércio o estado do estabelecimento, as providências já adoptadas, a quantidade de seda recolhida, o aumento que poderia ter, o plano do edifício e quais as providências a adoptar no intuito de promover o desenvolvimento desta indústria.
Eis a súmula desses estatutos, segundo Silvestre Ribeiro:
A soberana concedia a José Maria Arnaud e seus dois filhos Caetano e Filipe, o usufruto do filatório que mandava remeter para a província de Trás-os-Montes, aos quais estipulava vencimentos enquanto praticassem o uso e ensino do filatório, bem como o da fiação; estabeleceriam com os prorietários da seda o preço porque a torceriam no filatório, segundo o método piemontês e ensinariam ao mesmo tempo lisa e sinceramente tudo quanto fosse necessário para a perfeição de pêlo e trama de todas as qualidades e o mais respeitante ao uso do filatório, não admitindo para discípulos nem torcedores pessoas estrangeiras.
Durante cinco anos ninguém poderia ter em Trás-os-Montes idêntica máquina de filatório sem ser examinada pelos Arnauds, aos quais ficava vedada a introdução de seda estrangeira.
Nas duas províncias da Beira e Trás-os-Montes, nos centros onde houvesse maior produção de seda, seriam estabelecidas «Escolas de Fiação em machinas piemontezas e segundo o methodo piemontez». Ter-se-ia nelas o seguinte regime:
«1.º Todas as escolas serão regidas por uma mestra, cuja habilidade hade ser approvada pelos directores, e a sua probidade pelo escrupuloso exame do Intendente, que procurará que sempre seja uma mulher geralmente bem reputada no povo onde houver de exercer esta occupação, para que não haja duvida em se lhe confiarem as discipulas.
Esta mestra deve ter ordenado diario, emquanto tiverem exercicio as escolas, o qual hade ser o dôbro do que vencerem as discipulas.
2.º A mesma mestra deve fazer a escolha das discipulas que se oferecerem, sem que outra pessoa, excepto o Intendente, se intrometta n’esta escolha, e deve ter todo o cuidado e desvelo no recato e honestidade d’ellas; não consentindo que se demore na Escola por ociosidade pessoa alguma, que possa distrahir as discipulas da grande attenção que devem ter sobre a conta dos casulos, froxidão da baba, limpeza e igualdade do fio, ou no cruzamento que devem fazer antes de girar a roda e em tudo o mais que ensinarem os directores.
3.º Hade ter a mestra em muitos papelinhos escriptos os nomes das discipulas, para nos massos ou meadas de seda, que diariamente fiar cada uma, ella pôr um dos papelinhos com o nome da respectiva fiadeira, porque por este meio se póde vir no conhecimento de qual das discipulas commetteu algum êrro, para lhe ser estranhado, e para se dar louvor e
premio áquellas que o não commetteram.
4.º A mestra é que deve reprehender as discipulas, na fórma abaixo declarada, e nenhuma outra pessoa o poderá fazer. (Em caso de incorrigibilidade recorre-se ao intendente).
5.º Deve principiar nos mezes da fiação, o trabalho das Escolas indefectivelmente ao nascer do sol, e antes d’isso devem as fiandeiras estar nas Escolas, tendo cada uma a sua fornalha aceza. Devem ter uma hora para jantar e acabarão o trabalho meia hora depois do sol posto.
6.º A economia e policia das Escolas devem correr por conta das mestras, as quaes se devem esmerar em ter cada uma a sua escola com o possivel asseio e na melhor ordem que póde ser; tendo principalmente cuidado em revezar a agua das caldeiras ao menos tres vezes no dia, para que a seda seja limpa e menos gommosa e em acautelar o desperdicio da lenha, executando aliás o mais que lhe determinar o director.
De toda a desordem acontecida nas escolas, por omissão, negligencia, ou descuido das mestras, serão estas responsaveis e o Intendente procederá contra ellas, até as lançar fóra se assim o merecerem.
7.º Aos proprietarios, que quizerem mandar fiar nas escolas, ficará só a liberdade de pedirem á mestra que lh’a mande fiar á conta de tres a oito casulos; pois toda a mais direcção deve correr a arbitrio da mestra regulando segundo as ordens que tiver recebido do seu director, o qual, segundo a qualidade dos casulos, ordenará a graduação da fiadura,
devendo os proprietarios sujeitar-se á determinacão d’elle.
(Tendo os proprietarios razão de queixa contra a mestra ou director havia recurso, para o Intendente).
8.º As mestras deviam receber dos directores todas as instrucções necessarias para a perfeição e bom methodo da fiação, explicando-as com toda a clareza e escrevendo-as em lingua portuguesa, quando conviesse escrevel-as.
9.º Recommendava-se aos directores a maior moderação e delicadeza nas advertencias ou reprehensões; em caso de necessidade podiam pedir providencias ao Intendente».
«Na villa de Chacim [continua a carta régia atrás citada] se hade estabelecer a primeira escola, accrescentando-se a casa que já se edificou para o mesmo ministerio e o numero de caldeiras que julgar necessario o Intendente.
Esta escola hade ser a matriz e o modêlo das mais, e nella se hãode educar as mestras para outras escolas. Por isso os directores devem fazer ali a sua residencia e empregar todo o seu cuidado e desvelo, como d’elles se confia, muito principalmente nos primeiros annos; na mesma se hade praticar aquelle regimen que fica estabelecido para as mais».
No entanto, as garantias e protecção do governo à indústria da seda não aniquilaram os empreendimentos de João António Lopes Fernandes, a quem Bragança tanto deve pelo seu talento empreendedor.
Por alvará de 13 de Outubro de 1783 estabeleceu a rainha D.Maria I certas providências tendentes a despachar favoravelmente o requerimento que lhe fez este benemérito industrial, onde alegava: que tinha montado em Bragança cento e oito teares de seda para o fabrico de diversas manufacturas e formado uma tinturaria na qual se ministravam excelentes cores, em cujos serviços ocupava grande número de pessoas, fazendo assim reviver a indústria da seda que outrora nessa cidade fora tão florescente e depois decaíra. A súmula das régias providências é como segue:
1.º O provedor da Comarca de Miranda, Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio, será o conservador de todas as fábricas que actualmente existem ou se houverem de erigir em Bragança e seu distrito, auxiliando a sua útil subsistência e prevenindo a introdução dos contrabandos.
2.º O mesmo conservador será o juiz privativo em todas as causas relativas às mesmas facturas da seda em que os artífices forem autores ou réus.
3.º O referido conservador promoverá a cultura das amoreiras e criação dos bichos da seda, na conformidade das leis e alvarás que tanto a recomendam, e fará outrossim eleger a outros dois mestres fabricantes, os inspectores e procuradores que parecerem necessários para adiantarem a perfeição dos tecidos e acautelarem as fraudes e os defeitos que nelas se quiserem introduzir.
A 4.ª e 5.ª dizem respeito ao ordenado do conservador, que vinha a ser uma sanguessuga, assim a modo dos actuais comissários régios. Sempre o mesmo feitio dos governos portugueses! ou o mais soberano desprezo por tudo quanto interessa ao bem real da nação, ou a estúpida protecção, que esmaga e rouba a iniciativa particular.
Desgraçada noção de administração têm esses homens que para aí nos roubam a título de governar!
Que o estado da fábrica da seda em Bragança pelos anos de 1804 devia ser próspero bem se evidencia do documento n.º 113 adiante transcrito (tomo III, pág. 252, desta obra). Mas, posteriormente, esta indústria decaiu notavelmente, para o que muito concorreram, sem
dúvida, a Guerra da Península, as lutas constitucionais e os progressos da mecânica.
No entanto, «na fabrica de Chacim preparavam-se velludos, glacés, tafetás, nobrezas, setins e pellucias de um perfeito acabamento e grande nomeada», que tinham bastante extracção para o estrangeiro.
«Além d’esta fabrica, havia ainda teares em todo o districto de Bragança, contando-se quatrocentos na capital do distrito, sendo trezentos estabelecidos na cidadella».
Entretanto, morre Arnaud, pai, o governo extingue em 1811 as duas corporações de fabricantes de sedas, deixando livre o fabrico, e seu filho Caetano consegue ficar com o estabelecimento de Chacim. A decadência é rápida: pelos anos de 1830 apenas havia em Bragança sessenta teares, três tinturarias e oito tornos; em Rebordelo nove teares, em Bornes dois, em Lebução dois, em Urros um e em Chacim quatorze, dando todos aviamento a dezasseis mil arratéis de seda. Em 1844 ainda Manuel Lopes dos Santos mantinha em Bragança sessenta teares, que teve de fechar por não poder competir com a seda estrangeira.
O relatório do júri da exposição de sericicultura, efectuada no Palácio de Cristal do Porto em Agosto de 1867, transcreve parte da consulta dirigida ao trono pela Junta Geral do Distrito de Bragança em sua sessão de 30 de Julho de 1839, que diz: «Tambem é objecto da solicitude da Junta o andamento da fabrica de filatorio de seda situada na villa de Chacim (fora estabelecida pelo marquês de Pombal), fabrica que tendo custado um immenso numerario ao Estado, no tempo do Sr. D. José I, se acha hoje mui arruinada e proxima a perecer de todo [...]. Já duas vezes o governo de Vossa Magestade fallou n’ella, mas fallou por descargo de consciencia, sem providenciar de maneira alguma o seu estabelecimento».
Depois transcreve uma Memória do procurador à Junta Geral do Distrito de Bragança, Leonardo Manuel Garcia, onde se lê: que a seda da nossa província é muito boa, mas mal fiada e falsificada e por isso não serve para muitas obras, indo os compradores fornecer-se da italiana em detrimento da nossa; que, em razão desta falsificação, um arrátel da nossa seda não o querem por mais de 3$200 réis, quando, sendo bem fiada, se venderia por 4$800 réis, sendo por isso necessário tirar a fiação da seda das mãos dos lavradores que a estragam; que eles mesmos a não querem fiar e muito felizes se considerariam se, logo que está em folhelho, achassem comprador. Sendo, portanto, necessário que a operação do filatório da seda se chame toda a um centro, donde dimane um método regular, constante e progressivo.
Em ordem a estes considerandos, propunha o ilustrado Garcia as seguintes medidas:
1.º Promover o plantio de amoreiras brancas e pretas, segundo a propriedade dos terrenos.
2.º Animar a criação do bicho-da-seda, promovendo-lhe pronta venda logo que esteja em folhelho.
3.º Aperfeiçoar o filatório, estabelecendo carrilhos por toda a província dirigidos pelas melhores mestras de fiar.
4.º Levar o torcedume e qualidade da seda, em geral, ao mais alto grau de perfeição até que iguale ou exceda as melhores de Itália.
No relatório do júri da exposição de sericicultura, já citado, vem uma secção intitulada «Duas palavras ácêrca da sericicultura no distrito de Bragança». 
Dela extraímos as seguintes notícias:
«As antigas sementes do sirgo importadas do Piemonte tinham-se abastardado; os creadores rusticos e desleixados não sabiam apurar as raças ou fiar o casulo com perfeição, e d’ahi o depreciamento dos productos.
O casulo fresco obtinha apenas por arratel 120 réis, e sêcco 300 réis, a seda fiada 3$200, a grossa 1$600, e a denominada “macha” 800 réis.
Na operação da torcedura da seda empregavam-se annualmente muitas machinas a que chamam tornos; mas isto com referencia aos primeiros annos do seculo presente, porque desde então para cá tem decahido tanto a fabricação que no districto já se não contam mais de vinte e quatro tornos, e esses mesmos com exercicio interrompido, na cidade de Bragança, villa de Chacim e aldeias de Rebordello e Bornes.
Semelhante decadencia é tambem para notar nas fabricas dos tecidos.
Os homens mais velhos d’esta cidade ainda se recordam da existencia de uns trezentos teares trabalhando permanentemente, nos quaes se fabricava uma quantidade immensa de tafetá, sarja lisa e de cordão, nobreza, gorgorão, setim, velludo e outra manufacturas.
Hoje não trabalham mais de seis teares e só produzem tafetá, sarja e nobreza.
Eis a explicação da declinação tão rapida e mortal d’esta industria: a producção era baratissima pela abundancia de materia prima, era perfeita em relação á época e não tinha concorrencia notavel em todo o Portugal.
Emquanto se deu o conjunto d’estas tão favoraveis circumstancias, os tecidos de Bragança tiveram boa reputação e mui vantajosa procura; começaram, porém, a surgir novas fabricas em Lisboa, no Porto e outras cidades do paiz e appareceu a competencia: essas fabricas foram montadas com aparelhos modernos e mais perfeitos, veio a superioridade da manufactura e a sua maior barateza e, emquanto por lá se fomentavam incriveis melhoramentos, Bragança estacionava, offerecendo na feira das novidades o producto de seus velhos teares, e pasmando de já não achar compradores de bom gôsto.
Porém, os ultimos oito annos [anteriores a 1867, época em que o autor escrevia] foram mui vantajosos para Bragança.
O bicho da seda appareceu atacado de molestia em toda a Europa e em muitas partes fóra d’ella; só em Portugal e no Japão ainda não appareceu nada d’isso. Isto tem dado grande incremento ás nossas sedas, os estrangeiros vem deixar aqui avultados contos de réis pelo casulo de nossas creações para lhes extrahirem boas sementes, que levam e vendem
em seus paizes com grande reputação.
Não posso apresentar uma relação exacta da importancia d’este commercio, mas posso dar a certeza que a leva da semente em cada um dos ultimos annos subiu ao peso de 2.203:200 kilos, e somos informados de que o kilogramma d’estas sementes é vendido lá fóra pelo preço de 250 a 350 francos.
De tudo isto resulta que o arratel de casulo fresco tem obtido o extraordinario preço de 300 a 600 réis, e os lavradores instigados por elle não desperdiçaram mais uma folha de suas velhas amoreiras.
Os cultivadores convenceram-se finalmente da preferencia com que devem prestar seus cuidados ás amoreiras brancas, succedem-se os pedidos d’ellas ao governo e aos mercados estrangeiros; e entre nós mesmos vão surgindo alguns alfobres, que em poucos annos devem satisfazer as necessidades do districto; e as fiadeiras de seda, tomando lição dos peritos francezes, que por aqui teem demorado, e auxiliadas pelo aperfeiçoamento das machinas, já sabem produzir obra de muita superioridade.
Muito tem concorrido para este incremento os conselheiros Rodrigo de Moraes Soares,Henrique José Ferreira Lima, Guilhermino Augusto de Barros e deputado Manuel Guerra Tenreiro. Todos elles se tem desvelado em trazer a este districto, por meio da sericicultura, a vida e a riqueza.
Bragança, 5 de agosto de 1867. O secretario da commissão criada para colligir productos sericicolas, Paulo Candido Pereira de Sousa e Castro».
Este escrito vem acompanhado dos dois seguintes mapas de capital importância no assunto: 
Na «Proposta sobre a creação de amoreiras e melhoramento da industria sérica, para ser submettida á apreciação da Junta Geral, de Manuel Guerra Tenreiro», deputado da nação e proprietário na vila e concelho de Freixo de Espada à Cinta, diz Tenreiro que em Maio de 1862 mandara vir de França uma dúzia de amoreiras brancas, das quais apenas vingaram três. Depois, numa viagem que fez naquele país em 1863, comprou duas mil plantas que chegaram em Março de 1864 muito deterioradas, vingando apenas a quarta parte, e neste mesmo ano faz um viveiro de amoreiras brancas na sua quinta da Marivela.
Desta proposta vê-se também que o governo havia mandado para o distrito de Bragança sementes de amoreira branca.Em 20 de Fevereiro de 1867 (998) a Junta Geral do Distrito de Bragança celebrou com Tenreiro um contrato pelo qual este se obrigava a estabelecer na vila de Freixo de Espada à Cinta os viveiros necessários para entregar à ordem do Governador Civil de Bragança 180.000 plantas de amoreira branca, a 20.000 por ano no mês de Março, começando em 1871, e recebendo por cada uma 60 réis.
A pebrina e a flacidez, moléstias que destruíram o sirgo, começaram a manifestar-se em 1845 na França alastrando imediatamente para as demais nações, sendo Portugal a última na Europa a ser atacada, pois só em 1868 o grande Pasteur encontrou nos nossos casulos o gérmen delas, propagando-se logo pelo reino, sendo ainda assim o nosso distrito o último a ser contaminado, onde só em 1870, 1871 e 1872 a moléstia se tornou sensível.
Na sessão da Junta Geral do Distrito de Bragança de 4 de Janeiro de 1875 foi aprovada a seguinte disposição:
«Artigo 4.º Crear-se-ha e montar-se-ha nos suburbios da cidade de Bragança uma quinta ou estação experimental para servir de escola pratica de agricultura, e na mesma se ensinarem praticamente os melhoramentos e aperfeiçoamentos introduzidos pela sciencia nos seguintes ramos agricolas:
[…]
9.º A sericicultura, comprehendendo a sementeira, propagação, enxerto e póda da amoreira, a criação do sirgo, a escolha e formação da semente, e a fiação da seda».
Em harmonia com estas disposições foram arrendadas em 19 de Julho de 1875 e 5 de Agosto do mesmo ano às famílias Novais e Sá, de Bragança, duas quintas em Fonte Arcada, por espaço de dez anos a dos primeiros proprietários, e de cinco a dos segundos, para nelas se estabelecer a estação agronómica e sericícola do distrito de Bragança.

Este mapa, tirado do Relatório do agrónomo interino no distrito de Bragança Le Cocq, mostra bem a desolação a que ficou reduzido este distrito com a invasão das moléstias do sirgo. Em 1881 a indústria da seda, apenas caseira, limitava-se no distrito de Bragança a Freixo de Espada à Cinta e Rebordelo, sendo nesta apenas de fiação e naquela de cintas e
panos de peneira. A portaria de 18 de Fevereiro de 1889, assinada pelo Ministro das Obras Públicas Emídio Júlio Navarro, incumbe o agrónomo João Inácio de Menezes Pimentel de proceder a ensaios de criação de sirgo, segundo os processos científicos modernos, no intuito de restabelecer a indústria sericícola na região trasmontana pela fundação de uma sirgaria central destinada a produzir sementes para fornecer aos particulares, servindo ao mesmo tempo de base à fundação de uma escola prática.
A 31 de Março de 1891 dava Inácio Pimentel conta da sua comissão com a apresentação do relatório Tentativa de um plano de regeneração da sericicultura portuguesa, que, ampliado mais tarde, o fundiu na obra de larga investigação atrás citada.
Por decreto de 29 de Outubro de 1891 foi transformada a Estação Químico-agrícola da 2.ª Região Agronómica de Mirandela, à frente da qual tinha estado João Inácio de Menezes Pimentel, em Estação de Sericicultura, tendo por objectivo: habilitar pessoal em todos os serviços atinentes à criação do sirgo; produzir semente seleccionada para ser vendida aos
sericicultores, aos quais prestaria as informações de que necessitassem; ensaiar e aperfeiçoar os processos sericícolas e promover a replantação das amoreiras, tendo para isso viveiros para as vender a quem as quisesse.
Por despacho ministerial de 9 de Abril de 1893 foi autorizada a verba de 3.914$900 réis para despesas com a ampliação da Estação de Sericicultura de Mirandela, datando desta época a sua regular instalação.
O decreto de 27 de Outubro de 1898, atendendo à febre que por toda a parte se desenvolve na replantação dos vinhedos destruídos pelo philloxera, donde a necessidade de a auxiliar, transforma a Estação de Sericicultura de Mirandela em Estação Trasmontana de Fomento Agrícola, sem, contudo, deixar de ficar a seu cargo a sericicultura, a sericitecnia e a cultura da amoreira.
O aniquilamento da indústria serícea foi para Bragança um baque medonho, a custo atenuado pela sua grande produção vinícola de produtos tão generosos que alguns podiam rivalizar com os famosos do Douro, tais os vinhos brancos de Martim, Candedo e Arcas, os tintos da quinta da Ermida, no concelho de Vinhais, Santa Valha, Fornos e Possacos, no concelho de Valpaços, além de outros, como observava o deputado por Bragança, Garcia de Lima, celebrados até nos anexins populares:

Boa raba de Soeira,
Bom pão trigo do Paçó,
Bom vinho dos Alvaredos
E boa castanha de Sobreiró.
Ou, então, neste outro:

Onde são as vinhas
que tão bom vinho dão?
– Arcas e Nuzelos
Vilarinho d’Agrochão.

Mas, a um decénio após a crise serícea, cai esmagadoramente sobre nós a vinícola, e Bragança, sem vias de comunicação, sem governos que por ela olhem a não ser para a oprimirem mais e mais com as insuportáveis vexações do fisco, em cujas garras, como nas espirais compressoras de imensa jibóia, se estorce exangue este pobre Lacoonte, vê, acossados pela fome, lançar seus filhos nos horrores da emigração aumentada de ano para ano a ponto que no presente (1912) atinge a cifra com números redondos de quase sete mil indivíduos em todo o distrito, não contando os embarcados clandestinamente!
Nem só a indústria serícea e vinhateira proporcionaram ao nosso distrito dourados dias.
Em 1703 a Inglaterra, não podendo resignar-se com o engrandecimento dos Bourbons já apossados do trono de Espanha por Filipe V, uniu-se a Portugal pelo tratado de Lisboa de 16 de Maio de 1703, e, como as suas mercadorias eram excluídas dos portos franceses e espanhóis, celebrou connosco, em 27 de Dezembro desse ano, o célebre tratado comercial de Methuen, assim chamado de Paul Methuen, seu negociador pelo lado inglês.
Este tratado – vergonha da nossa diplomacia e tacto administrativo – admitia livremente em Portugal as mercadorias inglesas tirando-lhe todas as tarifas alfandegárias, postas em ordem a proteger a nossa indústria, e, como compensação, recebia nos portos ingleses os nossos vinhos, mas não livremente, pois apenas lhes abatia um terço à taxa imposta aos das outras nações! Isto é, dávamos tudo e recebíamos um engodo e, alfim, zero; nem jamais por menos o tem feito connosco a pérfida e astuta Albion...
A nossa indústria, sem poder rivalizar com a inglesa, foi logo para pantanas; a sede do ganho fez sacrificar ao vinho as mais culturas agrícolas, e com a abundância veio o depreciamento do género.
Assim, a pipa de vinho do Douro que, logo após a celebração do tratado, subiu a 60$000 réis, desde 1750 a 1755 não se vendia a mais de 10$000 réis. Este resultado, aliás fácil de prever, por certo constituía o objectivo do sagaz e manhoso Methuen.
De uma só cacetada a imprevidência portuguesa lançava por terra o plano de fomento do Conde da Ericeira, D. Luís de Meneses que, em 1685, sendo vedor da fazenda e no intuito de proteger a nossa indústria, dera grande impulso às fábricas de Portalegre e da Covilhã, proibindo absolutamente a entrada dos lanifícios estrangeiros.
Querendo remediar os desastres do tratado de Methuen, o Marquês de Pombal promulgou a 10 de Setembro de 1756 o decreto que estabelecia a Companhia das Vinhas do Alto Douro, ao qual vieram sucessivamente juntar-se outros, estabelecendo escandaloso e revoltante monopólio em favor desse estúpido parto de Pombal, ladeado de medidas violentas, parvas e sanguinárias.
Basta dizer que os proprietários não podiam vender os seus vinhos no Porto e Lisboa nem expedi-los para o Brasil sem ser por intermédio da poderosa Companhia que os carregava de comissões e direitos exorbitantes e – pasmai, tiranos! que outro perverso maior se levanta – nem mesmo bebê-lo além de certa medida, que chegava a descer a meio litro por dia!
E andam por aí uns tontinhos a querer-nos meter este homem como símbolo da liberdade! Mal sabem a triste figura de ignorantes que lá fora representam perante a gente medianamente lida na nossa história pátria.
Por certo que, se a proibição de saborear do precioso líquido quantidade superior a meio litro ainda vigorasse, não taramelariam tanto...
Mas vamos ao nosso caso e deixemos os estadistas portugueses em correrias do libre-cambismo para o sistema proteccionista assim a modo dos stulti de Horácio que dum vitant vitia, in contraria currunt.
Pelo tratado de Methuen, a Inglaterra, que não podia introduzir as suas manufacturas na Espanha, impingia-as aos portugueses e estes, pela raia seca, aos espanhóis por meio do contrabando, por isso que a sua indústria também não podia lutar com a inglesa. Isto fez a felicidade de algumas povoações da raia portuguesa, e uma delas foi Bragança que então nadava em ouro; muitos comerciantes do Porto, de Lisboa e até ingleses vieram estabelecer-se então a Bragança que, como o resto de Portugal, se converteu num mercado britânico: fizeram-se fortunas grandes e a sua alfândega chegou a render quase tanto como hoje a do Porto.
A guerra que em 1730 rebentou entre a Inglaterra e a Espanha mais radicou este estado de coisas, continuado posteriormente pelo tratado de Santo Ildefonso assinado em 19 de Agosto de 1796 entre a Espanha e a França, no qual queriam, também obrigar a entrar Portugal, fechando os portos às mercadorias inglesas, numa espécie de bloqueio continental. Portugal não aderiu, porém, a estas disposições sendo-nos por isso formalmente declarada guerra pelas duas nações em 6 de Fevereiro de 1801.
E por isso não admira que Bragança, como traz Almeida, exportasse no ano de 1846 em belbutinas 41.500$000 réis, em chitas 42.000$000, 45.000$000 em lenços de algodão, 80.000$000 em panos de linho e algodão e 11.000$000 de lã em bruto e chapéus, sendo apenas a sua importação de 13.000$000 contos de réis e a sua alfândega fosse a mais importante da raia seca.
Hoje a indústria da seda no distrito de Bragança está reduzida a muito pouco nalguns concelhos do Sul, como Freixo de Espada à Cinta apenas limitada a panos de peneira e ligas, e é nula completamente nos do Norte, sendo muito para louvar a campanha que em prol do seu restabelecimento tem levantado na imprensa de Bragança o distinto agrónomo José António de Moura Pegado, incansável em evangelizar o fomento agrícola desta terra, convindo também não esquecer, antes muito e muito relembrar, os do distinto homem de ciência João Inácio Pimentel, aqui tantas vezes citado.

Bibliografia
Além do já citado, temos mais as seguintes obras de bragançanos referentes à sericicultura no nosso distrito:
Memória sobre o estado actual das fiações de seda, especialmente pelo método piemontês nas províncias de Trás-os-Montes e Beira e regulamento ou providências para restabelecer estas fiações e mantê-las em perfeição, pelo doutor Francisco António de Almeida Morais Pessanha, 1819.
A Sericicultura no distrito de Bragança, principalmente no concelho de Moncorvo, pelo Visconde de Vila Maior, artigo publicado a 10 de Dezembro de 1864.
Dissertação sobre a sericicultura e particularmente no concelho de Moncorvo, por Emílio Cláudio de Oliveira Pimentel. 1866.
Breves instruções para a cultura das amoreiras brancas no distrito de Bragança, por Paulo Ferreira. 1867.
Dissertações filosófico-políticas sobre o trato das sedas na comarca de Moncorvo, pelo doutor José António de Sá. 1787.
Memória dos abusos das Câmaras e provimentos dados pelo autor quando Corregedor de Moncorvo. 1 vol. fólio. É do já citado doutor José António de Sá e está manuscrito na Biblioteca Municipal do Porto. Dele faz o respectivo catálogo esta descrição: «Tem 43 capitulos. Termina – Sobre o Commercio dei providencias para augmento da carne de porco; e estabeleci alguns Mercados etc. – Seguem 8 documentos – Aos Senhores que a presente virem – escriptos e assignados pelo escrivão Chanceler da Correyção, José Luiz Pimentel; sendo o ultimo um Avizo de S. M. (por intervenção do visconde de Villa Nova da Cerveira, auctoridade superior da Provincia). Villa Real [...] de junho de 1788, no qual a Rainha manda louvar o zêlo do Dr. Corregedor no que toca a plantação d’amoreiras e creação do bicho da seda. No fim vem um grande – Mappa dos objectos do bem publico providos na Comarca referida – dividido em zonas horizontaes por Villas; e columnas verticais cada uma com um dos seguintes dizeres: – Estradas Reaes; Fontes; Pontes;Mattas conservadas; Ditas creadas; Amoreiras; outras arvores. – Vê-se que fez plantar 45.088 daquellas e 72.274 destas! Foi pois um illustrado e benemérito promotor da arboricultura, e da sericicultura. Honra lhe seja».
O padre Miguel José Rodrigues, professor no Liceu do Porto e natural de Varge, concelho de Bragança, publicou na Ilustração Trasmontana, Porto, 1908, no suplemento ao n.º 6, um artigo sobre a sericicultura tendente a levantar esta indústria a que tem dado grande incitamento, fazendo plantar muitas amoreiras, não cessando em escritos e conversas de evangelizar a reorganização da nossa agricultura pela introdução de novos processos e máquinas, replantio dos vinhedos com cepa americana e cultura serícea.
Ilustração Trasmontana, 1909, págs. 54 e seguintes, onde vem um bem elaborado artigo, acompanhado de nítidas fotogravuras, assinado por Silva Esteves.
Descrição da Província de Trás-os-Montes, suas comarcas, e população, feita no ano de 1796, por Columbano Pinto Ribeiro de Castro. Manuscrito da Biblioteca Municipal do Porto. Foi publicado na Ilustração Trasmontana, 1908-1909, desde o n.º 12 por diante.

Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança

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