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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira..
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 2 de março de 2018

Tributos e pensões em Bragança nos idos de 1400

Velas, roldas, refazimentos, oitavas, pesos, travessas, colheres, sacadas, terça dos finados, maninhádego, voz e coima, indícias, fumádigo ou afumadego, jantar, mantimentos do centeio, luvas, hortos, canada, primícias e imprimas, barrete e calçado.

Velar, roldar e refazer
Em 1387 a Câmara de Bragança queixa-se a el-rei D. João I, dizendo que no termo da cidade havia «coutos e honrras nossas (d’el-rei) e do arcebispo de Bragaa e do prioll do espritall e doutros grandes e dalguns fidalgos e pesoas poderosas e que os moradores dos ditos coutos e honrras que nom querem vellar nem róldar na dita bylla nem refazer em ella aquellas cousas que som nosso serviço e proll comunall da dita byla dizendo que tem cartas e privilegios que dello som escusados e pryviligiados». Por carta de 8 de Dezembro da era de 1425 (ano de Cristo 1387) manda el-rei que ninguém, embora viva em coutos e honras ou goze de outros privilégios, seja escuso de tais servidões, que se reduziam ao que hoje chamamos fazer sentinela nos muros da vila ou em seus postos de vigia — atalaias e esculcas — e refazer, isto é, reparar e consertar esses mesmos muros, serviço que então se chamava adua e anuduva.

Oitavas
Em 1464 os moradores da terra de Bragança queixaram-se a el-rei da violência que lhe faziam os de Bragança, porquanto «entre eles (moradores da terra) e os moradores da villa ffora antigamente feito hum contrauto, que os moradores do termo pagassem aos moradores dessa villa em cada hum ano de cada casa quatro alqueyres de centeyo e mais pessos e travessas de todas aquelas coussas que vendessem em essa villa por alqueyre e que por esto que lhe assy davam fossem escusados de todollos encarregos desse concelho, assy de vellar como de roldar e de guardar portas e presos e de todallas outras cousas que pertençam a esse concelho e que os ditos moradores dessa villa s’obrigarom a servirem per ssy sem elles... e que esto que asy pagam chamam oytavas» e que apesar deles haverem satisfeito «sem nenhua referta» esta paga dos quatro alqueires, os de Bragança os obrigavam a velar e roldar e mais pensões.
Manda el-rei por carta de 14 de Janeiro desse ano que o contrato se observe, como fora estipulado; sobrevindo, porém, algum caso extraordinário que se tornasse indispensável esse serviço dos povos, então, por ordem régia, viriam velar e roldar, etc., mas nesse ano seriam escusos da paga das oitavas. Este nome provinha-lhe de serem a oitava parte do moio que em Bragança tinha trinta e dois alqueires.
Em 12 de Novembro de 1547 concertaram-se os povos do termo com a Câmara sobre as oitavas, combinando que durante quarenta anos em lugar dos quatro alqueires de centeio daria cada morador 100 réis cada ano. Tendo terminado este prazo, celebram novo contrato em 18 de Maio de 1590, ficando a dar cada morador, nas mesmas condições, 120 réis, sendo metade desta quantia paga em dia de Páscoa da Ressurreição e a outra metade por dia de S. Martinho (11 de Novembro), períodos em que pagavam pelo contrato passado.
Além disto pagariam mais, durante quatro anos, mil cruzados para obras públicas, feitas por ordem do duque de Bragança com o parecer dos oficiais da Câmara, também em duas prestações anuais, ficando isentos de fintas para fontes, pontes, calçadas, muros, velas, roldas e guarda de presos.
As viúvas pagariam só meia oitava; quem não tivesse fogo à parte, como criados de servir, genros em casa de seus sogros e vice-versa, nada pagava, embora possuísse bens próprios.
A propósito das oitavas, não deixa de ser curioso o seguinte facto: em provisão de 26 de Junho de 1802 foram escusos os habitantes de S. Pedro, Samil, Freixedelo, Gimonde e Vale de Lamas do ónus a que eram obrigados de irem fazer a limpeza da cidade de Bragança e conduzir nas procissões reais da cidade a imagem de S. Cristóvão, ornada à custa dos ditos povos.
O procurador da Câmara de Bragança, corporação que tinha a seu cargo fazer observar tal pensão, saiu com embargos, alegando: que a cidade estava na posse imemorial de que os ditos povos fizessem a limpeza das suas praças e ruas; que esta obrigação era um contrato honoroso, e não acto meramente gratuito, celebrado desde tempos imemoriais com os duques, porque todos os povos do termo de Bragança pagam, desde tempos antiquíssimos, o tributo das oitavas à Câmara da mesma cidade de que os ditos ficaram escusos por se obrigarem à tal limpeza, condução e ornamentação de santo «como tudo consta por documentos mutilados que já mal podem ler-se, em razão da sua antiguidade, e também pela tradição».
Tais embargos não tiveram efeito, ficando por isso em vigor a provisão.

Pesos, travessas, colheres
Eram impostos indirectos cobrados em Bragança. Já vimos como os dois primeiros — pesos e travessas — se percebiam pelas coisas vendidas por alqueire e, sem dúvida, também a peso, como o nome está indicando.
Havendo escassez de mantimentos, em 1539 pediu a Câmara de Bragança ao duque para que no «ano que vem de quinhentos e quarenta se alevante o direito das colheres e pesos e travessas que rende para a cidade para que de Castela venha mantimento à cidade».
O duque assim o outorgou por carta de 6 de Outubro de 1539.
Eram, pois, colheres, pesos e travessas, um direito semelhante ao então chamado portagem, do qual os de Bragança eram isentos pelo seu foral, na vila, termo e em todo o reino, mas não os estranhos que aí vinham vender suas mercadorias.
Num documento existente na Câmara de Bragança declara-se que a mesma cobrava o tributo das colheres com o encargo de fornecer cântaros suficientes, para apanhar água, aos presos da cadeia e que o mesmo tributo consistia em a Câmara cobrar uma peça de louça de cada carga dela que se vinha vender à cidade.
Segundo o mesmo documento, a Câmara passou este direito aos alcaides-mores de Bragança em 1535 com os inerentes encargos. O tributo das colheres montava anualmente a dois mil cruzados.
A Câmara de Bragança pagava também aos seus juízes, vereadores e procurador um certo número de medidas de centeio por ano, a que se dava o nome de «mantimento de centeio» e além disto mais «barrete e calçado e luvas por dia de Corpo de Deus», mas estas coisas não deviam custar «mais que até um cruzado».
A expressão «dar umas luvas» a um ministro ou empregado, para o tornar propício ou interessar em nossos negócios e pretensões, deve trazer sua origem da pensão acima, que então não arrastava consigo a ideia de suborno que hoje lhe ligamos.
Eram, pois, cobradas pela Câmara as oitavas, pesos e travessas e entravam no seu fundo de receita, bem como durante algum tempo as colheres. Ainda hoje, como vestígio da antiga pensão, a Câmara de Bragança cobra uma certa percentagem sobre os géneros vendidos nas praças da cidade, a que o povo, e não sabemos se também oficialmente, chama «tributo de colher».

Sacadas
Segundo um contrato feito por el-rei D. Afonso III em 1253 com os moradores da terra de Bragança sobre a paga dos direitos reais, obrigou-se esta a dar àquele, ou a quem por ele tivesse a terra, «dous myll maravidis velhos de moeda antiga que vem a ssaber myll maravydis por dia de Sam martinho de novembro e myll maravydis por pascoa de resureiçom».
Ao título da conversão dos direitos reais em terra de Bragança neste foro, chamam alguns escritores foral, menos avisadamente, como observa Herculano, de onde vem o dizer-se que este rei deu novo foral a Bragança, o que é engano manifesto.
A este foro dos dois mil maravedis dava-se o nome de sacadas e delas eram escusados os moradores da cidade, pois só era pago pelos do termo, mas se tivessem bens de raiz no valor de 1$000 réis, não contando a casa de habitação, roupa de vestir e cama, seriam obrigados a pagá-las.
Delas eram também escusos os pobres com bens inferiores ao valor de 1$000 réis, os lugares, casais e herdades das igrejas e mosteiros e todos os reguengos e terras reguengueiras, que pagam foro a el-rei e os moradores de Agrochão por privilégio antigo e consentimento da cidade e termo, em remuneração dos grandes serviços que em tempo de suas necessidades e aperturas lhes fizeram.
Em 1721 equivalia este tributo das sacadas a 97$200 réis, segundo o manuscrito de Borges, já citado.

Martinega
A propósito da martinega diz Herculano: «Havia distritos onde pezavam imposições especiais anteriores ao estabelecimento dos concelhos, as quais continuavam a subsistir em qualquer povoação a que davam instituições municipais completas. Tal era a Martinega ou Martiniega, comum nos distritos de Trás-os-Montes, a qual consistia num tanto certo que pagava pelo S. Martinho cada chefe de família, cuja renda anual excedia uma determinada soma. Acerca da Martinega (que se pagava em Chaves e Bragança, apesar de serem concelhos perfeitos de 4ª ordem), vejam-se os documentos do livro I da Chancelaria de D. Diniz, fl. 149, e o foral de Chaves, Livro I de Doação de D. Afonso III, fl. 29».

Maninhádego — Terça dos finados
Pretendiam os monges de Castro de Avelãs «que em todallas alldeas em que o dito moesteiro tinha direitos e cabedaes e rendas que dos moradores dellas, ora moresem com testamento ora sem testamento o dito moesteiro avia d’aver a terça de quanto ficasse dos finados posto que lha leixar nom queriam e abintestado mouram ou com testamento o qual testamento posto que ho finado ho faça nom vall nem o gardam salvo se leixar ao dito mosteiro toda a sua terça».
Os povos da terra de Bragança, juntamente com a cidade, protestavam contra tal pretensão, dizendo-a ser «contra direito comum e contra toda booa rezom e begnidade que hordena e manda que os homees posam fazer e devam seus testamentos ordenadamente como lhes praza» e contra a letra expressa do foral de Bragança. Pelo seu lado os monges alegavam a posse imemorial de tal usança.
O duque, perante quem o feito foi levado, declara que um tal costume «he mais currutella que custume e contra toda boa desposiçom dos homes e humagnidade e contra jurdiçom del Rey meu Senhor e minha e se alguuas taes terças som levadas mais seria por força que por ali por os dom abades serem senhores poderosos em aquellas aldeas nom reconhecerem a outrem tanto como a elles e serem jente simpres e d’estremo a quem era necesario consyntir quaaes quer cousas que lhes fizessem mormente por serem tall alongados e de suas mores justiças»por isso, em sua sentença de 2 de Agosto de 1452, manda às suas justiças de Bragança que não sofram aos monges de Castro de Avelãs tal costume.
Vê-se deste documento que os monges de Castro de Avelãs pretendiam levar a terça dos finados, não só dos que sendo casados morriam sem filhos, posto que dantes os tivessem, como traz Viterbo, mas ainda sendo vivos à morte dos pais.
Fazendo os monges pouco caso da resolução do duque, deu este, passados dois anos, a 25 de Novembro de 1454, nova sentença em Gimonde, povoação do concelho de Bragança, na qual, reconsiderando e reconhecendo que em parte o maninhádego era fundamentado, declara «que onde quer que o dito mosteiro por seus foraes houver de aver maninhadego que se entenda somente de aquelles que nunca filhos nem filhas ouvessem».

Jantar, fumádigo, voz e coima, nona, dizimaria
É frequente encontrar-se nas terras pertencentes ao convento de Castro de Avelãs imposta a obrigação de seus caseiros lhe satisfazerem os direitos pelas palavras acima. «Ha o dito mosteyro (de Castro de Avellãs) na ygreja do dito loguo (de Alfaião) apresentaçam della e mais ha per ella em cada hum anno 86 réis de jantar... Item mays ha d’aver de todolos moradores do dito loguo de fumadego x reais novos e um velho que sam per esta moeda presente cada um catorze pretos».
«Item ha o dito mosteyro hua alldea que chamam Grandaes a quall é sua qua ygreja e ha nella a jurdiçam e voz e coyma e toda a dizimaria e prymicias delle som do mosteiro e os que hy moram som vassallos do mosteiro e pagam mais de fumadeguo cada hum que acender foguo quatro dynheiros e meio».
Pela extinção deste mosteiro, os seus bens passaram ao cabido de Miranda. É no tombo dos bens que este possuía que vamos encontrar a explicação da palavra «fumadego». Tratando dos direitos que este recebia em Alfaião diz: «pagam mais ao cabido dois réis de afumadego que se costumam dar em satisfação dos dizimos dos hortos que comem em suas cazas porque vendendo dos hortos alguma cousa pagam de cada dez do que venderem, um ao cabido».
Também em algumas povoações, como por exemplo Nunes, no concelho de Vinhais, em vez da dizimaria ou dízimo, isto é, de dez partes, uma, tinha o mosteiro a nona, que vem a ser de nove partes de frutos que aí se colhessem, uma.
O jantar consistia em certa porção de mantimentos, ou o seu equivalente em dinheiro, pagos ao mosteiro. Nalguns documentos é este tributo também indicado pelo nome de parada.
Voz e coima era certa pena que pagavam os que feriam, matavam ou maltratavam alguma pessoa ou a injuriavam com palavras torpes, desonestas e afrontosas. A mesma significação tem as palavras indizias que vamos encontrar num privilégio adiante citado, respeitante a Bragança; e pena de sangue ou pena de arma, no foral de D. Manuel dado à nossa cidade.
As outras pensões e isenções constam dos forais de Bragança (documentos n.os 56, 57 e 58, para onde remetemos o leitor).

Canada
Canada é a passagem ou caminho por entre paredes, lugares ermos ou escusos. Esta não devia ter os gados pela terra de Bragança sem licença do duque, a quem se devia pedir, para averem canada e passada. Assim consta de uma sua carta de 1457.

Hortos
Este tributo que, pelo Tombo de Castro de Avelãs feito em 1501, parece confundir-se com o chamado afumadego ou vodos, aparece-nos distinto como vemos no Tombo dos Bens do Cabido feito em 1691 nos títulos de Gostei, Formil e outros. Seria o primeiro, como o nome parece indicar, em satisfação da hortaliça comida em suas casas pelos moradores e o segundo uma espécie de capitação por fogo? No entanto, o nosso povo ainda hoje entende por afumadegos de um povo os hortos, quintais e outras propriedades que o cercam ou estão contíguos às casas. Castro de Avelãs apenas recebia o afumadego; os cónegos é que depois exigiam, segundo parece, também os hortos.

Primícias e imprimas
Tributo muito frequentemente cobrado pelos monges de Castro de Avelãs e depois pelos seus sucessores — os cónegos de Miranda — em suas terras. Incidia somente sobre o trigo e o vinho, ao contrário do dízimo, que abrangia tudo e levava de cada dez, um, crescendo assim em proporção da colheita do cultivador, ao passo que as primícias, de um número determinado de medidas, geralmente quarenta no trigo e trinta no vinho, levavam umas tantas sem irem mais além, embora o cultivador recolhesse quantia muito superior.




Memórias Arqueológico-Históricas
do Distrito de Bragança

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