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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Carta para Alfredo

Por: António Orlando dos Santos (Bombadas)
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

Caro amigo, estou extremamente satisfeito por termos trazido para a ribalta as histórias das gentes de Bragança.
Naturalmente desconheço os pormenores da vida íntima ou até apenas familiar dos personagens que povoam as minhas crónicas. Daí ser importantíssimo que os leitores venham com achegas, como o Senhor agora fez! Não se trata de repor a verdade, porque não se disse uma mentira intencional, apenas se escreveu uma imprecisão.

O Snr Carlos Alves era uma pessoa esclarecida, de verbo fácil, bom orador e também um exímio artista, pintor de obras mais finas e complexas do que o simples pintar a fachada e reparar caixilharia. Eu sempre o via com o Snr Ernesto Pires que era também uma pessoa de cultura avançada se posta à prova pela medida da mediana capacidade de opinar publicamente dos operários brigantinos. É para mim um orgulho que nasceu hoje após haver lido a sua mensagem, que o célebre Carlos Alves era natural de Santa Maria-Bragança. Foi muito bom que eu tivesse cometido o deslize de deixar os leitores a julgarem por si sem auxílio do redactor ou sem a ajuda de quem sabe do assunto!
Sei porque tive tempo e ocasiões com fartura para falar com ele antes do 25/04/1974 à volta de um prato com beiço de vitela frita e o respectivo tinto, no reservado do Café Sport do grande amigo Zé Machado. Falamos de Azedo Gneco e José Fontana, ambos doutrinadores da classe operária que estava a tomar consciência da sua força que bem usada contra a filosofia impiedosa dos doutrinadores bolcheviques e fascistas teria evitado a carnificina que a primeira e a segunda guerras mundiais impuseram aos povos da Europa e obrigaram o povo americano a ferir batalhas apocalípticas para acabarem com horrores causados pela fétida ideia de impor ao povo o que bandidos feitos ideólogos concretizaram contra toda a humanidade.
Quando no dia 30 de Abril a PIDE metia o Snr Carlos Alves no xadrês fazia-o por pensar que ele era comunista o que não era verdade pois quem escutava o seu discurso nas horas em que ele abria o livro e partilhava com os outros que tinham vontade de aprenderem a elencar ideias para seguindo-as na forma que se haviam elencado pudessem fazer a Revolução que o povo aspirava concretizar para ter a liberdade que lhe fora sonegada de forma arbitrária pelos abencerragens do antigo Regime que os do trono e do altar também queriam eternizar.
Claro que não é com simples exercícios de escrita pífia que o povo vai compreender qual é a diferença entre um regime democrático e um regime totalitário e de índole fascista que submeteu Portugal e teve submetida a Europa. E estes juízos mal feitos acerca das pessoas que a Natureza poupou ao fado da ignorância e a quem preparou a massa cinzenta para poder raciocinar e fazer distinções entre os que de facto estão interessados em dar ao povo, paz ,pão habitação. saúde educação/Liberdade de falar e decidir /quando pertencer ao povo/ O que o povo produzir/ (Sérgio Godinho / Liberdade) e os que por sua vez desejam apenas e só escravizá-lo, mantê-lo ignorante e submisso para que o dito povo sustente a sua ganância e pérfidas ideias de vivência que tornam o homem carrasco do seu irmão que o serve sem ser recompensado.
Havia no discurso deste homem, Carlos Alves de sua Graça algo de magnético, empolgante até, que me fazia sonhar com um mundo de solidariedade e fraternidade já anteriormente sintetizado no "moto" da Revolução Francesa que inscreveu nas pedras e na Alma dos homens o ideal sublime de Igualdade, Liberdade e Fraternidade. Sempre fui receptivo ao discurso de anúncio de vida que o Antigo Testamento nos transmite. Li passagens lindíssimas que tenho gravadas na mente indelevelmente. Os Salmos, O livro de Tobias, O livro de Job e como que para me sentir mais com os pés na terra O Ecclesiastes, atribuído ao Rei Salomão.
Quando ouvia o Carlos Alves com cuidado na escolha das palavras falar do homem novo a minha massa cinzenta laborava para achar a diferença de intenção que partindo de palavras belas e frases sonantes me abrissem clareiras onde a luz penetrasse e me esclarecesse. Com o tempo fui observando que dos diferentes lados da barricada havia homens que queriam de facto trazer para o convívio da humanidade, mais pão, educação, saúde, mas que as forças contrárias acabavam por submergir numa autêntica massa de ignorância que se repetia desde o tempo das cavernas.
Concluía eu que eram lícitas e sinceras as palavras escritas nos documentos que deram origem ao Antigo Testamento. Eram sinceras também as do Manifesto do Socialismo democrático preconizado por homens como os dois anteriormente citados e até as palavras dos documentos escritos e tornados públicos da Fabian Society na Velha Albion escritos por verdadeiros ideólogos como Somerset Maugham que no tempo de mudança que foi o do aparecimento do Labour Party traziam no ventre arautos e boa nova que afinal eram antigos mas que forças carregadas de inércia mantiveram submetidas nas catacumbas da memória dos homens e que foram libertadas e mostradas à luz do dia pela Igreja Metodista Britânica. 
O pintor Carlos Alves que afinal nascera em Santa Maria–Bragança tinha consciência disto tudo. E com cautela, hoje um pouco, amanhã outro tanto ia levando a carta a Garcia. Fez germinar no peito dos seus camaradas de trabalho mais receptivos aos ideais do humanismo a semente que o poder da palavra havia colocado no cérebro dos que quiseram pensar.
E um dia foi Abril. Houve cravos e cantigas e o povo acreditou que desta vez o que estava escrito no Antigo Testamento, fora também anunciado no Manifesto Socialista e que trombetas em clamoroso estridente soar proclamaram nos "halls" e "churchs" britânicos se tornaria realidade e a humanidade entraria num tempo de partilha.
25/Abril/1974. Manhã radiosa nasceu nos céus deste país e veio alegrar o povo que viu tropas na rua, tropas que tinham recrutado os filhos do povo e deles fizera soldados para defenderem os tiranos.
Em Bragança o Carlos Alves e os que lhe ouviram as palavras que ele proferira em nome dos homens lúcidos como Azevedo Gneco e José Fontana profetas de uma nova religião, tão sabiamente haviam anunciado. Foi Sol de pouca dura! Cedo começarem as quezílias pela partilha do poder que através dos milénios submeteu a humanidade. Nem Moisés, nem Jesus Cristo, nem os Borgia ou Frederico Barbarossa, Carlos V ou Napoleão conseguiram segurar a justiça que só Deus nos dará mesmo que ela nos pareça feita à medida do nosso egoísmo.
É que o mundo está feito com pesos e contra-pesos, versos e reversos, partilha e acumulação e com uma velocidade que não é mensurável porque as criaturas não andam todas com a mesma pressa ou vagar!
Aos poderosos nada os farta e aos humildes o pouco lhes basta e quando gente sem escrúpulos toma o leme da barca, ela singra enquanto o vento lhe for de feição, quando o homem do cesto da gávea grita, terra à vista atenção, o capitão general manda cerrar o porão e a solidariedade da marinhagem acaba porque no porto há cadeias e meirinhos que prendem os marinheiros e isentam os almirantes. 
Ao meu amigo que me deu a notícia dou eu agora uma confidência. O que hoje escrevi, sonhei-o numa noite em que no reservado do Zé Machado sentado com o Carlos Alves e o meu irmão Armando, no tempo em que o João Preto, filho da tia Augusta e do tio Malã construiu a casa que está um pouco abaixo do D.Fernando no jardim da Vila, ouvi e dei opinião, fui para casa entusiasmado e de noite sonhei coisas para de manhã o sonho ter dado nisto!
Bem haja pela sábia e serena forma como me deu uma notícia inesperadamente agradável: -O Carlos Alves era dos nossos e eu pensava que era de Lisboa. Que feliz me encontro por ele ser das hostes da minha querida mãe.
OBRIGADO.




Bragança, 23/08/2018
A. O. dos Santos
(Bombadas)

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