Número total de visualizações do Blogue

Pesquisar neste blogue

Aderir a este Blogue

Sobre o Blogue

SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira..
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

domingo, 30 de setembro de 2018

A cidade dos amores e das grandes amizades, BRA-GAN-ÇA

Por: António Orlando dos Santos 
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

A missa da Sé ao domingo era às 09:30 da manhã e o seu desfecho era o princípio de uma nova aventura faseada em duas partes diurnas e uma terceira já com o crepúsculo anunciado e as forças físicas e anímicas quase exauridas.


Quando o Senhor Cónego Ruivo, pausadamente, com a sua voz de tenor e do alto do seu metro e oitenta dizia: Ide em paz e que Deus vos acompanhe, começava a debandada e tomávamos a direcção da Flor da Ponte. Havia ali uma fábrica de sonhos, sob a custódia de um homem que possuía o sorriso mais afável e amigo de todos os que até hoje conheci, o Snr. Joaquim da Flor da Ponte.
Tinha patins e um rink, pequeno, mas um rink, bicicletas para alugar e até barquinhos de remos e outros com pedais, que sulcavam as águas quase paradas do Rio Fervença. É fácil adivinhar o que acontecia a seguir. As moedas, ganhas ou arranjadas das formas mais díspares e que incluíam formas lícitas e ilícitas de posse, saíam dos nossos bolsos para a mão do Snr.Joaquim e ele soltava a bicicleta, roda 26, ou até mais pequena, do cadeado que a prendia e fazia com este gesto, a felicidade da garotada que começava a pedalar na estrada do Turismo, na directa proporção às forças do seu físico e da quantia que o seu bolso acautelava.
Os barquinhos eram assim como que coisa mais pró fino e eram também associados à ideia de menina a bordo, a quem se houvesse declarado a paixão através de carta copiada do manual, As Cem Mais belas Cartas de Amor, coisa que os mais fortes de físico e mais fracos de memória usavam recorrentemente.
No Loreto de Cima e debaixo dos Negrilhos havia outro lote de bicicletas a pedal, algumas com guiador de corrida, que pertenciam ao Soares que morava na Boavista e era marido de uma Senhora. morena,Tendeira, que vendia desde alfinetes e pentes p'ró cabelo até esticadores para o colarinho! O Soares nunca foi, comercialmente falando, da estaleca do Senhor Joaquim. Era no entanto mais liberal na forma como deixava que usássemos as bicicletas. Com as do Soares podíamos vir para o Loreto de Baixo e até atrasarmo-nos um pouco na devolução dos velocípedes, o mesmo não acontecendo quanto à ida da Flor da Ponte para o Loreto de Cima.
As minhas recordações desse tempo mágico fazem que me lembre hoje de tipos que estavam bem escondidos no fundo do meu baú de coisas lindas! O Manuel Cowboy, primo da minha mulher, era um frequentador assíduo da Flor da Ponte. Morava na Costa Grande e também era fanático do Cine Teatro Camões e do Rebolo, Carrasqueira e Altar. Aqui antes de saltar para o rio, usando toda a força dos pulmões gritava; Cri-ago-Tarzan-bândulo e depois com a mão nos lábios o célebre grito do Tarzan a chamar pela Cheta; Oooooooo, que Weisemüller tornou famoso na fita,Tarzan, o Rei da selva.
O pessoal do Loreto estava sempre em maioria e recordo o Fernando Saldanha e o Manuel Barata, bem assim como o Oliveira que impregnados das ideias de aventura se alistaram nos pára-quedistas e todos os três foram soldados que fizeram a guerra de África e granjearam grande prestígio. Havia também um rapaz chamado Orlando que morava no S.joão de Brito, cujo pai era motorista na Moagem do Afonso Lopes e foi para África. Nunca mais o vi mas sei que era amicíssimo do Beto da Pastelaria Ribeiro onde hoje está a Dómus.
Nos negrilhos do Loreto de Cima havia espaço suficiente para umas boas partidas de Fito. Havia nesse tempo rapazes dotados de pontaria e de força suficiente para tais avarias mas havia também outros que quando pegavam na malha ou pedra, era sabido que ia parar aos tanques de lavar a roupa onde as mulheres gritavam e barafustavam contra "Esses carvalhos que não têm força nos braços, que fará na verga. 
"Eu hoje quando regresso a essas memórias sinto em mim um misto de riso e também de ternura por essas mulheres que nos deram tudo; a vida, a comida, a limpeza, o amor de mães e até, as que elas geraram, iguais a elas, nos entregaram para que nos servissem como elas nos serviram a nós, seus filhos. O Verbo servir aqui, deverá ser entendido como amaram, porque foi com todo o amor que há no mundo que elas nos amaram, criando-nos e dando-nos a liberdade para aqui e agora transmitirmos aos nossos netos a nossa felicidade de crianças que ao fim do dia exaustos das brincadeiras, caíamos no seu colo e só despertávamos de manhã, no dia seguinte, prontos para mais outro igual ou com a pequena diferença de ser complementado com a Escola onde outra mulher nos ensinava os mistérios da Escrita e da Aritmética, para depois da Gramática sermos capazes de escrever um texto nesta bela língua de Camões e Vieira que foi também de Pessoa e Régio e é igualmente nossa. 




Bragança, 28 de Setembro de 2018
A. O. dos Santos
(Bombadas)

Sem comentários:

Enviar um comentário