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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

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COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 5 de junho de 2020

Continuamos na Flor da Ponte...

Por: António Orlando dos Santos (Bombadas)
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")



Em frente à entrada dos Serviços Florestais está ainda, do lado direito justamente antes do posto com balança da antiga PVT uma casa que era onde vivia um Senhor com quem nunca tive ocasião de falar, mas que me fascinava. Era já homem de idade, mas deveria ter tido algum episódio menos agradável na sua vida pois que estava sempre de má "catadura".
Não digo que não fosse boa pessoa, pois nunca tive notícia de que ele fosse mau para a sociedade. Era sim de difícil trato para com os miúdos que naquele tempo eram quem mais passava por ali nas incursões exploratórias à Florestal ou às amoreiras que havia no Plantório.
No anexo que tinha no lado esquerdo da casa havia um letreiro que dizia: RATOEIRA A FOGO! Não posso compreender ainda hoje a animosidade dele para com a sociedade e muito particularmente para com a garotada. Era um caso de excepção em toda a cidade, pois o simples letreiro assim dirigido ao mundo assustava o mais atrevido.
Não sei quando foi embora ou haja falecido, sei apenas que logo depois do 25 de Abril a casa foi ocupada por gente completamente diferente e agora não vejo lá ninguém.
Todo este palavreado para quê? Apenas para deixar notícia que foi em toda a cidade que eu corri de ponta a ponta, onde sempre passei com temor e do qual não soube nada a não ser que estava ali. Era o contrário das outras casas que naquele tempo surgiam na Flor da Ponte e que transmitiam um sinal de melhores tempos e de outra atitude mais igualitária das pessoas que começavam a mostrar uma outra forma de se elevarem socialmente.
Vejamos três ou quatro exemplos desta afirmação que aos mais novos parecerá incompreensível mas que os meus contemporâneos, estou seguro, compreenderão.
A construção e depois o dia a dia no complexo dos Serviços Florestais era uma novidade do ponto de vista administrativo e social. O perímetro com que delimitaram os edifícios era aberto e franco, dotado de jardins e áreas de lazer, que até os cidadãos que não viviam lá desfrutavam pois estava construído com alamedas ladeado de árvores e bancos próprios para descanso. As pessoas que viviam nas habitações do complexo eram no geral simpáticas e de bem, o pessoal dos Serviços era gente que demonstrava um ar de confiança e modernidade que se começava a notar em certos departamentos técnicos que o Estado estava a modernizar.
O complexo dos Serviços Florestais foi um marco na modernização da Cidade e que trouxe a Bragança um modelo de arquitetura enquadrada em espaço ajardinado, de sobriedade e elegância.
As casas do lado oposto eram evidentemente de um risco e conceção arrojadas para o tempo e trouxeram um toque de modernidade que era compartilhado por toda a gente. A obra maior, O Colégio de S. João de Brito é também um edifício elegante e foi edificado num espaço sobre elevado que lhe confere um ar dominante sobre as outras construções e cria harmonia no espaço envolvente.
A casa onde o Senhor Joaquim instalou o seu negócio, naquele tempo, num lugar promissor é também um belo edifício. E ele deu ao espaço uma dinâmica inusitada criando assim um ponto de reunião para as horas de lazer a que aderiu toda a sociedade brigantina e se manteve dinâmico por alguns anos que hoje são recordados pelos que o conheceram e frequentaram o lugar.
A casa seguinte era do Senhor Armando Bento, homem novo, dinâmico e empreendedor, era como que um líder e que nós comparávamos ao elemento paradigmático americano do "Self made man". Com uma família bonita, lembro a esposa, uma Senhora  e dois filhos, um rapaz e uma menina. O Rui Bento, seu filho, era um rapaz alegre bem quisto dos seus amigos, que sendo mais velho alguns anos que eu era visto por mim como um atleta e um vencedor. A menina lembro-a bem, mas menina.
A partir da saída do irmão e também por mudanças na minha vida, deixei de ser garoto, sei pouco ou nada do trajeto desta gente, que juntamente com uns poucos mais de gente nova daquele tempo eram os nossos ídolos, no caminho para um tempo novo que pressentíamos no ar.
A casa seguinte era algo que me remetia para um certo estilo que os livros dos cinco de Enid Blyton me desvendavam. Algo de sóbrio mas vetusto, onde os moradores eram gente da aristocracia que por força das mudanças na sociedade estavam agora mais perto de nós. Era a casa onde viveu o Senhor Vasconcelos, casa que penso ser dos anos 20/30 do século passado ainda hoje me encanta pela sua fachada larga de janelas amplas e de entrada senhorial q.b.
O Senhor Vasconcelos já uma vez falei dele e não deixarei de o fazer de novo, porque ele era alguém especial em Bragança. Chefe dos Serviços de Eletricidade da Câmara de Bragança, era de um dinamismo contagiante. Sempre de fato e gravata, bom conversador e homem sóbrio era para mim o tipo de pessoa que não poderia viver noutra casa. 
O modelo quadrava harmoniosamente no meu entendimento.
Tudo se harmonizava e uma coisa era parte da outra e eu tinha simpatia por essa minha ideia de mérito que tão bem dispusera as coisas.
O que escrevi até agora, fi-lo tentando ser o mais fiel possível à minha concepção das coisas no tempo em que eu era garoto que seria entre os meus sete e os treze anos. Foi tempo em que a maioria das minhas leituras eram essencialmente revistas e livros de inspiração americana e que me transmitiram uma mensagem que eu assimilava pela clareza e sobriedade. "A capacidade de seguires o exemplo e até ultrapassares os que com trabalho e dedicação vencem na vida, far-te -à veres que há sempre um caminho para subir nela, o da diligência e dignidade".
Era mais ou menos isto a chave do sucesso que nós ambicionávamos e em que todos os elementos que menciono se enquadravam e estavam na ideia que sistematizava a equação. Sumariamente dei a saber porque a Flor da Ponte foi no meu tempo de menino o lugar da cidade onde eu enquadrava o modelo abstrato do meu e dos da minha idade, quando o futuro chegasse.
Sei que não conseguirei fazer-me compreender, pois alguém haverá que ache devaneio, digo apenas que outros sentirão a vida de outra forma mas o meu espírito tem várias partes que compõem o todo e este pedaço foi hoje separado do que fica em mim.





Bragança 07/04/2020
A. O. dos Santos (Bombadas)

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