Um dia depois da demissão de Hernâni Dias, que ocupava o cargo de secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, o primeiro-ministro ainda não fez qualquer declaração sobre o assunto. Esta é a primeira baixa do Governo de Luís Montenegro. No Fórum TSF, Luís Sousa, investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e que também faz parte da associação cívica Transparência e Integridade, referiu que, com este caso, a lei dos solos fica "ferida" do ponto de vista ético e deixou algumas questões.
"Quem está por trás do diploma? Quem vai beneficiar com este diploma? Não vamos ser naives e dizer: 'Isto é para o bem da comunidade e para baixar os preços da habitação'", considerou, sublinhando que "é importante o instrumento da pegada legislativa".
"Não basta regular o lobby, é preciso também ter a noção de quem contribui com o quê para, sobretudo, peças legislativas desta natureza que têm um alto valor económico. Há aqui oportunidade de enriquecimento, de negócio e é extremamente importante fazer esse escrutínio da pegada legislativa", assinalou.
Já para Rita Figueiras, investigadora na área da comunicação política, o primeiro-ministro pode ter conseguido que esta situação não fizesse mossa no Governo.
"A rapidez de atuação é um fator essencial para tentar estancar e para que esta ideia ainda se vá mais sedimentando nas pessoas, porque o caso acabou por ser tão rápido que muitas pessoas eventualmente ouviram falar em qualquer coisa, mas, em princípio, poderá não ter durado o tempo suficiente para que, de facto, se comece a fazer uma associação e uma amálgama entre todos estes vários casos que já têm acontecido e, de algum modo, fragilizado o Governo", afirmou.
"Esta rapidez faz uma diferença para um desgaste que tende a ser mais evidente e a consolidar-se na cabeça das pessoas quando ele se vai prolongando ao longo do tempo", acrescentou Rita Figueiras.
O primeiro-ministro aceitou na terça-feira o pedido de demissão do secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, Hernâni Dias, sublinhando "o desprendimento subjacente à decisão pessoal" do governante.
Numa nota do gabinete de Luís Montenegro publicada no portal do Governo lê-se que "o primeiro-ministro aceitou o pedido de demissão hoje apresentado pelo secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, Dr. Hernâni Dias".
"Nesta ocasião, o primeiro-ministro expressa reconhecimento ao Dr. Hernâni Dias pelo empenho na concretização do Programa do Governo em áreas de particular importância e sublinha o desprendimento subjacente à decisão pessoal tomada. O secretário de Estado cessante será oportunamente substituído no cargo", acrescenta.
Esta é a primeira demissão no XXIV Governo Constitucional PSD/CDS-PP que tomou posse a 2 de abril do ano passado.
Na sexta-feira, a RTP noticiou que Hernâni Dias criou duas empresas que podem vir a beneficiar com a nova lei dos solos, sendo que é secretário de Estado do ministério que tutela essas alterações.
Uma semana antes, o mesmo canal de televisão avançou que Hernâni Dias estava a ser investigado pela Procuradoria Europeia e era suspeito de ter recebido contrapartidas quando foi autarca de Bragança.
Na terça-feira da semana passada, num comunicado enviado à agência Lusa, Hernâni Dias recusou ter cometido qualquer ilegalidade, afirmando que está "de consciência absolutamente tranquila" e que agiu "com total transparência".
O secretário de Estado garante ter pedido ao Ministério Público (MP) "que investigasse a empreitada da Zona Industrial em Bragança e ao LNEC [Laboratório Nacional de Engenharia Civil] que fizesse uma auditoria", assegurando, relativamente ao apartamento ocupado pelo filho no Porto, que "o valor das rendas foi pago por transferência".
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