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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues, João Cameira e Rui Rendeiro Sousa.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 1 de setembro de 2025

O Cavaleiro das Sombras - Capítulo II – As Vozes das Pedras


 Afonso desceu das muralhas com o peso da noite ainda nos ombros. As palavras do espectro ecoavam-lhe no peito como ferro batido: “Sou a dívida por saldar.”

Não eram simples alucinações. Aquela aparição tinha substância, uma presença que o frio da serra não conseguia apagar.

Na manhã seguinte, encontrou-se com Lídia e Baltasar na velha igreja de pedra, onde o fogo das velas lutava contra o sopro do inverno que atravessava as frestas.

- Se o Cavaleiro regressou, não podemos enfrentá-lo apenas com espadas. Disse Baltasar, apoiado no bordão. - É preciso entender quem foi, e o que o prende a estas muralhas.

Lídia folheava um manuscrito gasto, de capa rasgada. Eram anotações que guardava do convento de Castro de Avelãs.

- Há registos de um cavaleiro que caiu em desgraça durante o cerco de Bragança, há mais de trezentos anos. Chamavam-lhe Dom Martinho de Soutelo. Era leal ao rei, mas acusado de traição por abrir uma das portas da cidade ao inimigo. Foi condenado a morrer em silêncio, trancado nos subterrâneos do castelo.

- E o que tem isso a ver com as pegadas? Interrompeu Afonso, impaciente.

- Tudo. Respondeu Baltasar. - Diz-se que jurou nunca abandonar as muralhas até provar a sua inocência. Se agora regressa, é porque a sua verdade nunca foi revelada.

O silêncio caiu pesado sobre os três.

- Então é uma alma injustiçada? Perguntou Lídia, quase num sussurro.

- Ou vingativa, retorquiu Afonso. - Seja qual for, não podemos deixar que vagueie por aqui. O povo já começa a falar, e o medo espalha-se mais rápido que a neve.

Baltasar endireitou-se, os olhos brilhavam com um estranho fervor.

- Se querem respostas, devem ir às catacumbas sob o castelo. É lá que o corpo de Dom Martinho repousa. As muralhas guardam mais do que pedra, guardam vozes que só se revelam a quem ousa escutá-las.

Na noite seguinte, os três desceram aos subterrâneos. As tochas iluminavam corredores estreitos, cobertos de musgo e gelo. O cheiro a terra húmida e ferro oxidado impregnava o ar.

- Nunca devíamos ter vindo… murmurou Lídia, agarrando-se à lanterna.

Mas Afonso avançava com firmeza. Para ele, cada passo era um desafio à própria sombra que o perseguia.

Chegaram a uma sala ampla, onde um sarcófago de pedra repousava no centro. Gravadas na tampa, runas gastas contavam uma história que ninguém soubera ler por completo. Baltasar ajoelhou-se, passando a mão pelas inscrições.

- “Aquele que foi traído será condenado ao silêncio até que a verdade seja ouvida.” Leu, num tom quase reverente.

De súbito, um sopro gélido percorreu a sala. As tochas tremeluziram. A tampa do sarcófago rangeu, como se alguma coisa se mexesse por dentro.

- Afasta-te! Gritou Afonso, puxando a espada.

A pedra abriu-se lentamente. De lá, não saiu nenhum corpo, mas um véu negro de fumo, que tomou forma diante deles, a mesma armadura vazia, agora envolta em chamas frias, que não queimavam mas gelavam o ar.

A voz cavernosa ecoou pelas paredes:

- Não fui eu quem traiu. Mas enquanto o vosso sangue negar a verdade, caminharei sobre estas muralhas.

O vento soprou com violência, apagando todas as tochas. No breu, apenas os olhos da figura brilhavam, como brasas num mundo de gelo.

E assim começou a investigação não apenas de um mistério, mas de uma verdade enterrada sob séculos de silêncio, uma verdade que poderia libertar ou condenar para sempre a cidade de Bragança.

Continua...

N.B.: A narrativa e os personagens fazem parte do mundo da ficção. Qualquer semelhança com acontecimentos ou pessoas reais, não passa de mera coincidência.

HM

O Cavaleiro das Sombras - Capítulo I – O Guardião das Portas

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