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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

LEBRE, em Comeres Bragançanos e Transmontanos

“Uns batem o mato – outros apanham as lebres”.
[Anexim]


O fabulista La Fontaine foi buscar a Esopo, a Fedro, aos fabulários medievais e contos italianos boa matéria para confeccionar um fascinante cardápio de encantatórios animais eivados de todas as qualidades e defeitos, copiando a condição humana. A lebre entra em quatro fábulas: A lebre e as rãs, As orelhas de lebre, A lebre e a tartaruga, A perdiz e a lebre. Nessas fábulas a lebre surge vaidosa, convencida, medrosa e por fim vencida. Uns duzentos anos antes de Esopo fabular, o eclético Aristóteles ocupa-se da lebre, afiança ser tímida, analisa o funcionamento dos seus órgãos, anota possuir coalho quando está em fase de amamentação, ter dupla fiada de dentes, no tocante à época do acasalamento, escreveu:” as lebres acasalam unindo-se pela parte de trás, como se afirmou acima (trata-se também de um animal que urina por trás); acasalam e têm crias em qualquer época, e as fêmeas estão sujeitas à superfetação e dão à luz todos os meses. Não parem as crias todas ao mesmo tempo, mas com um intervalo de dias que varia. A fêmea tem leite ainda antes de parir e, mal que dá à luz, volta a acasalar, como também fica prenhe quando ainda amamenta. Tem um leite tão espesso como o da porca. Dá à luz crias cegas, como acontece com a maioria dos fissípedes.”
O observador filósofo confere à lebre a natureza de tímida, assim será retratada pelos séculos fora em obras de todos os géneros, tal como a sua extraordinária capacidade de reprodução é origem de grande número sentenças populares, como a escolhida por Hellmut Kirst, para iniciar a obra Os Lobos, na qual evidencia a barbárie nazi. Reza assim: 

“Muitos cães são a morte de muitas lebres. Porém, a capacidade de reprodução das lebres ultrapassa todos os esforços dos cães”.

A fecundidade da lebre estará no referente ao simbólico associada à deusa Eostre, a lebre-Lua, forma que os Celtas imaginaram para a superfície da Lua cheia, do mesmo modo como outros povos incorporaram as lebres nas mitologias e crenças. Tanto a lebre como o coelho são lunares porque dormem de dia, chegando a lua a converter-se em lebre, assim o cantam temas folclóricos da Ásia, África e Europa e das civilizações incas. Em Portugal a presença da lebre em todo o território é confirmada não só pela corografia (Laboreiro, Lebres, Leboreiro entre outros), mas também pelas oralidades e linguagens. Andar à lebre é andar à procura de refeição gratuita quando não há dinheiro, comer gato por lebre é deixarmo-nos enganar, comprar gato por lebre é comprar mau e pagar por bom, levantar a lebre é ser o primeiro a falar sobre um falhanço, asneira ou irregularidade. No atletismo lebre é sinónimo de correr para alguém, fugir como a lebre é correr a sete pés, lebre corrida é assunto arrumado, lebreiro é o que caça lebres, lebrechina e lebrechinha é rapariguita leviana.
Uma cantiga de amigo fala da lebre amiga, séculos antes, os gregos e os romanos entoavam cânticos de louvor à lépida lebre, após a terem degustado, cozinhada em receitas esquisitas e custosas. No Banquete dos Eruditos, Ateneu destaca-lhe as singularidades gustativas, ou não fosse a carne da lebre a preferida dos Gregos, o esquisito Apícius anota treze receitas no De Re Coquinaria, desde um ensopado de lebre, até uma lebre recheada, passando pela lebre em almôndegas a mostrar engenho no total aproveitamento da saltarilha.
A lebre estava sempre presente nas refeições festivas da nobreza medieval e da renascença, originando numerosos preparados culinários cujos ingredientes além de raros eram caros, cozinheiras e cozinheiros hábeis e, tempo, muito tempo. Grandes chefes concederam-lhe minuciosa atenção e inventaram modos de a prepararem que perduram até agora, inspirando os cozinheiros galácticos da actualidade na criação de novas receitas, levando-a a figurar nos compêndios da alta cozinha, seja na forma de lebrada, assada, estufada, em filetes, guisada, salteada com chocolate, em mousse, empadas, pastelões e terrinas.
As cozinheiras e cozinheiros de outrora de índole rural deixaram-nos ensinamentos acerca da melhor forma de confecção da lebre, e do lebracho: de um a quatro meses é melhor assado, até ao ano de idade o ideal é ser assada e salteada, a partir dessa idade aconselham a guisá-la.

Comeres Bragançanos e Transmontanos

Publicação da C.M.B.

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