quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Antigo juiz do Tribunal Administrativo de Mirandela julgado por adulterar processos

O juiz é acusado de classificar processos que ainda não tinham sentença como "concluídos", para falsificar a sua própria produtividade.
Fotografia © Lisa Soares / Global Imagens
Um antigo juiz-presidente do Tribunal Administrativo de Mirandela vai ser julgado por suspeita de adulteração informática do estado de dezenas de processos, passando-os para concluídos, quando ainda não havia sentença, para "viciar" estatísticas e "aumentar artificialmente" a sua produtividade.
Segundo o despacho de acusação do Ministério Público (MP), a que a agência Lusa teve hoje acesso, o arguido, atualmente com 49 anos, terá acedido, entre 2010 e 2012, ao Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais (SITAF) e colocado 59 processos como "findos estatisticamente", sem que houvesse uma decisão final.
"Sempre com o intuito de alcançar para si uma vantagem que sabia não lhe ser devida, aumentando artificialmente a sua produtividade, fazendo crer que a mesma era superior à real, e dando errónea expressão do seu zelo e aptidão funcionais", sublinha o MP.
O arguido foi juiz no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Mirandela de 2004 a 2012, e juiz-presidente deste tribunal entre final de 2010 e início de 2011.
Em 2012, na sequência de um processo disciplinar, foi suspenso pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que, em janeiro de 2013, lhe aplicou a pena de demissão. O juiz impugnou a deliberação junto do Supremo Tribunal Administrativo, aguardando-se ainda a decisão.
A acusação acrescenta que o arguido, através da opção "substituição", alterou o conteúdo de vários outros documentos produzidos pelo próprio, em processos no SITAF, que passaram a constar dos escritos: "falhas de funcionamento" e "não é possível apresentar a página".
"Ao praticar os atos de produção/substituição/incorporação de documentos fictícios e ao alterar ou mandar adulterar o estado dos processos, o arguido agiu com o propósito de viciar a estatística e a informação processual que sabia ser remetida e/ou acessível às entidades de coordenação, gestão, fiscalização e avaliação, nomeadamente ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e à Direção Geral da Administração da Justiça", considera o MP.
Assim, o juiz "iludiu" estas entidades, a quem eram enviados relatórios mensais, como as pessoas envolvidas, quanto ao verdadeiro estado do serviço e dos processos.
O magistrado terá também ordenado a uma escrivã-adjunta que alterasse no SITAF outros processos, em três ocasiões diferentes, considerando o MP que a funcionária "agiu apenas porque estava pressionada e advertida" de eventuais retaliações por parte do juiz.
"O arguido sabia que não devia dar as ordens, ciente de que prejudicava o Estado, enquanto garante da fidelidade dos elementos informáticos e estatísticos em causa, e as partes-processuais, criando nas mesmas a errónea convicção de que havia proferido nos processos a decisão final", refere o MP.
O juiz responde por um crime de falsidade informática na forma continuada e por três crimes de abuso de poder.
O MP deduziu ainda uma outra acusação contra este homem por violência doméstica contra a companheira. Contudo, estes autos foram apensados ao anterior processo, havendo assim lugar a apenas um julgamento.
Segundo esta acusação, o arguido, entre 1999 e 2012 -- mas com mais intensidade a partir de 2008 -, agrediu verbal, física e psicologicamente a companheira.
"Com tal conduta, o arguido tratou de forma cruel a ofendida, com quem mantinha vida de casal, agindo com o propósito de molestar física e psiquicamente a mesma, quer ofendendo a sua honra e consideração, quer o seu corpo e a sua saúde", salienta a acusação.
O arguido requereu a abertura de instrução em ambos os processos, mas foi pronunciado para ir a julgamento nos exatos termos das acusações.
A primeira sessão do julgamento está agendada para terça-feira no Tribunal de Bragança.

Diário de Notícias

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