Por: Humberto Pinho da Silva
(colaborador do "Memórias...e outras coisas..."
Das numerosas histórias, que meu pai narrava, sobre a nossa família, havia uma, que nunca esqueci.
Não tanto, por a ter escutado várias vezes, mas por versar tema, que me impressionava:
Sofia era tia-avó de meu pai. Jovem, alegre, bonita e brincalhona. Casou cedo – como era costume, nas moças do seu tempo.
Meses após o matrimónio, o marido, resolveu embarcar. Embarcar para o Brasil, terra prometedora, onde era fácil juntar fortuna.
Vendeu os poucos bens que possuía, e abalou, na companhia da jovem mulher, para Santos. Dai tomou comboio para São Paulo, onde o esperava, português, amigo de infância.
Decorrido meses, estabeleceu-se; e tanta sorte tiveram (ele e o amigo,) que o negócio progredia a olhos vistos. Podia-se dizer: estavam ricos, ou pelo menos bem lançados na vida.
Andava a Sofiinha metida num sino. Ao visitar a amiga Júlia de Castro, não se conteve, e confessa-lhe: “ que nunca pensou levar vida tão folgada”….
Mas a sorte, tanto anda, como desanda. O marido adoeceu. Por recomendação médica, mudou-se para Campos de Jordão, mas pouco lhe adiantou: faleceu.
Meses depois do funeral, ao receber a parte, que tinha direito, o sócio, levando-a para o escritório da firma, disse-lhe, em voz de pesar e conselheira:
- “ Sofiinha: você sabe como era amigo do falecido. A Sofiinha esteja descansada, receberá sempre o que lhe é devido dos lucros da padaria. Mas, por que não regressa a Portugal? Sempre estava na sua terra… na companhia dos seus. Sabe como é: viúva, em terra grande…nunca está segura.”
Sofiinha pensou, tornou a pensar, e concluiu: que o sócio tinha razão.
Assentou, então, aceitar o parecer do amigo.
Passou procuração. Fez as malas. Despediu-se das poucas amigas, e partiu para Santos, na companhia da família do sócio.
Regressada à casa paterna, aguardou o envio do dinheiro, conforme combinara. Como tardasse, escreveu…Não obteve resposta.
Receosa, consultou advogado, contando-lhe o sucedido.
Decorrido meses, soube o seguinte:
O sócio, obtida a assinatura na procuração, passou a padaria para seu nome.
Tinha caído no conto do vigário.
Concluía, assim, meu pai: “ Não se pode acreditar em ninguém! Muito cuidado a passar procurações e assinar folhas em branco ou parcialmente preenchidas, porque não falta quem dizendo-se muito honrado e amigo – nos tire o que é nosso, e ainda temos que agradecer, se não nos deixar dividas! …”
Eu, que já muito vivi, garanto-vos que todo o cuidado é pouco, principalmente, quando nos cercam com palavras mansas e bocas cheias de risos…
Humberto Pinho da Silva nasceu em Vila Nova de Gaia, Portugal, a 13 de Novembro de 1944. Frequentou o liceu Alexandre Herculano e o ICP (actual, Instituto Superior de Contabilidade e Administração). Em 1964 publicou, no semanário diocesano de Bragança, o primeiro conto, apadrinhado pelo Prof. Doutor Videira Pires. Tem colaboração espalhada pela imprensa portuguesa, brasileira, alemã, argentina, canadiana e USA. Foi redactor do jornal: “NG”. e é o coordenador do Blogue luso-brasileiro "PAZ".
Número total de visualizações do Blogue
Pesquisar neste blogue
Aderir a este Blogue
Sobre o Blogue
SOBRE O BLOGUE:
Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço.
A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)
(Henrique Martins)
COLABORADORES LITERÁRIOS
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.
terça-feira, 24 de outubro de 2017
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário