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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

quinta-feira, 19 de julho de 2018

“A Música e os Dias; Instrumentos Populares Portugueses”

Apresentação
A coleção dos instrumentos musicais populares resultou da recolha sistemática, promovida pela Fundação Calouste Gulbenkian, sob proposta de Jorge Dias, conduzida no terreno por Ernesto Veiga de Oliveira e Benjamim Pereira entre os anos de 1960 e 1965, altura em que o museu estava a ser pensado e nasceria. O levantamento foi iniciado com base num questionário enviado a professores primários, párocos e interlocutores já conhecidos pelos membros da equipa do Centro de Estudos de Etnologia, mas foi sobretudo no contacto directo que ele se concretizou. Aliava-se à aquisição dos instrumentos localmente em uso, a preocupação de perceber as condições e situações da sua utilização, ajudando  a pensar o país na sua diversidade. Descobriram-se  músicos de relevo que se tornaram igualmente protagonistas dessa aventura. 
O sistema de classificação dos instrumentos, a sua inscrição nos tempos do calendário, a sua distribuição no país, são os principais eixos do livro de Ernesto Veiga de Oliveira, Instrumentos Musicais Populares Portugueses, publicado em 1966, e que logo se tornou na obra de referência não apenas para o conhecimento deste universo em Portugal, mas também nos estudos comparados em contexto europeu. As re-edições de 1982 e 2000, são a expressão do interesse e procura que despoletou, sendo a última um momento de grande alcance simbólico, pois com ela se celebrou a oferta ao Museu Nacional de Etnologia da coleção propriedade da Fundação Calouste Gulbenkian que aqui se encontrava em depósito. Nesta última edição, Benjamim Pereira conta a história desses anos de caminhadas pelo país, dos encontros com tocadores e comissões de festas e todos aqueles que foram interlocutores desse significativo percurso na produção de um conhecimento etnológico e de revelação do que somos. O que de mais importante se possa dizer sobre os instrumentos musicais é nesse livro que se encontra.

A Música e o Calendário
A música e, de forma mais geral, as sonoridades, participam da construção do tempo e do modo como nele nos inscrevemos e apoiamos memórias e afectos. Os instrumentos, os sons que produzem, as gestualidades que lhes estão associadas, os contextos performativos onde se manifestam, as sociabilidades que entretecem e ligam indivíduos e grupos, são parte da matéria mais densa e expressiva na construção dos colectivos. Certos instrumentos só se ouvem em determinados períodos ou dias do ano. São marcadores do tempo, das cadências e ritmos do calendário. Muitos deles preenchem ritualidade do Inverno. São quase todos idiofones. É o maior número dos que aqui mostramos. Outros emergem noutras circunstâncias ou estações do ano.
Do complexo festivo dos Impérios do Espirito Santo, os instrumentos das folias, como o tambor, o pandeiro e os testos, revelam também essa associação exclusiva. É então que se ouvem e nos ouvimos neles. Instrumentos como a flauta e o tamboril, vieram a ter na raia do Alentejo uma evidente expressão cerimonial pela sua relação com determinada festa: a Festa. Também existem casos de absoluta singularidade como a genebres que se toca na Lousa, arrastando a asa às raparigas na Festa da Senhora dos Altos Céus.
Mais aberto de possibilidades pelo seu uso em rusgas e festarolas, o reque-reque foi o instrumento dos rapazes na ida às sortes, fabricando, assim,  em simultâneo, os tempos do calendário e o tempo da vida de cada um.

Sonoridades do Inverno
No calendário de uma sociedade marcadamente rural, como foi este país até há poucas décadas, o Inverno é um tempo longo, expectante, com a comunidade voltada para si mesma e com traços de inquietação e ansiedade que se manifestam em gestualidades, linguagens, práticas rituais, que se prolongam por metade do ano, entre os primeiros magustos e a véspera da Páscoa. As máscaras, o riso, as transgressões, a presença e a relação cuidada com os mortos, trazem sonoridades que participam de uma intensa e expressiva morfologia de práticas. O universo sonoro do Inverno traz os sons cavos, agrestes, caóticos, as cacofonias, as vozes que se transformam em linguagens que exploram o risível e o grotesco e musicalidades cuja estranheza as devolve aos contornos incertos dos quotidianos.
Além do som que produzem, os instrumentos podem adquirir nomes que os devolvem a uma animalidade de que parecem reproduzir as vozes: a zorra é a raposa que regogueia, cuja voz os mascarados do inverno em Trás-os-Montes imitam, nos modulados e estridentes hi-gu-gus com que assustam, celebram e instauram a ritualidade de Natais e Carnavais. Quando a linguagem dos sinos é interdita na Semana Santa, as pancadas soturnas das matracas abrem um hiato no tempo cadenciado pelos sinais sonoros do templo, agora preenchido com sonoridades que encenam a dramaturgia cíclica da dor. Fricções, batimentos, rugidos, são matéria sonora deste período do ano que reúne além disso, chocalhos e guizos dos animais e os próprios instrumentos agrícolas usados como fonte de som: a gadanha batida com uma pedra ou um ferro, por exemplo. Por todo o país alguns dias são ainda particularmente marcados, como os dias gordos do Entrudo, a Serração da Velha, ou mesmo alguns momentos da liturgia no interior das igrejas. Por isso encontram-se aqui juntos sarroncas, matracas, zaclitraques, relas, e outros podiam estar como, os chocalhos ou os funis dos casamentos paródicos e nocturnos.

Os Intrumentos Musicais (alguns exemplos)

Do Inverno


Festas do Espírito Santo

Ida às Sortes


Ocorrências Singulares


Museu Nacional de Etnologia

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