… quase poema… ou basta-nos tão pouco

Por: Fernando Calado
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Foi a primeira planta que eu tive naquele enlevo de ornamentar a casa… fazer uma carreira… uma profissão… criar filhos…
…depois horas… dias… anos à procura de coisas importantes… esqueci-me de me lembrar das coisas verdadeiramente importantes…
…secaste-me mil vezes… mil vezes renasceste… resististe… tal qual como eu… 
…resistimos sempre à beira dos desgostos … perdemos o pé… ficamos sem chão… mas resistimos e amaciamos os maus bocados… e esse é o nosso segredo…
… quantas vezes te encontrei seca… sem sinal de vida… troncos ressequidos… como num grito de morte… de censura à minha ausência… e pedias tão pouco… somente um golo de água à beira da boca…e logo acontecias no milagre do verde.
… na semana passada morreste de novo… não resistente à tórrida calmaria deste verão!
… pensei que os desgostos e as ausências têm um limite… e que desta vez tinhas morrido para sempre depois de mais de 40 anos na minha companhia… na luta pela sobrevivência… sem um queixume… sem um amuo… só um silêncio que doía…
… morreste-me… e tardiamente dei-te de beber… no ritual fúnebre da água benta… e o milagre aconteceu… novamente… ao terceiro dia ressuscitaste… Páscoa bendita…
… e resistes
… e resistimos
… e basta-nos tão pouco!

Fernando Calado nasceu em 1951, em Milhão, Bragança. É licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto e foi professor de Filosofia na Escola Secundária Abade de Baçal em Bragança. Curriculares do doutoramento na Universidade de Valladolid. Foi ainda professor na Escola Superior de Saúde de Bragança e no Instituto Jean Piaget de Macedo de Cavaleiros. Exerceu os cargos de Delegado dos Assuntos Consulares, Coordenador do Centro da Área Educativa e de Diretor do Centro de Formação Profissional do IEFP em Bragança. 
Publicou com assiduidade artigos de opinião e literários em vários Jornais. Foi diretor da revista cultural e etnográfica “Amigos de Bragança”.