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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

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COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Um tempo passado, um tempo presente e um tempo que virá. 1ª PARTE

Por: António Orlando dos Santos (Bombadas)
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")


Casa Velasco. Sr. Cândido e D. Ofélia
Sempre que dou por mim a recordar a minha meninice, surpreendo-me por notar que as imagens registadas, que se alinham, quase em sequência, são mais nítidas do que aquelas mais recentes que se apresentam como uma neblina que impede a recordação que vezes sem conta me impedem de visualizar detalhes que não consigo lembrar claramente.
Assim, ultimamente com a proximidade da quadra natalícia essas imagens mais antigas surgem em catadupa e eu tenho só que as alinhar cronologicamente e registá-las por escrito ou difundi-las verbalmente.
O princípio é sempre o mesmo, Caleja e ruas adjacentes, com a Alexandre Herculano liderando a fileira de acontecimentos que decoraram a minha infância. O Pousa, assim conhecido o estabelecimento comercial da firma Lopes & Pousa & Cia Limitada, ali de frente para a Rua do Norte, onde o Grifo tinha a taverna e alugava bicicletas. Durante os primeiros 11 meses do ano, apresentava este estabelecimento de secos e molhados um aspeto sóbrio e arrumado.Tinha do lado direito para quem entrasse, a secção de mercearia. Casa limpa, arrumação cuidada e disposição dos artigos lógica e em secções facilmente apreendidas, o que dava prazer ao cliente recém entrado. Do lado esquerdo uma secção de fazendas, malhas e atoalhados. Sobrepondo-se a esta ordem, aparecia na fileira superior das prateleiras das fazendas com uma boa variedade de lotes de cortes para fatos e respetivos forros e botões, um friso a todo o comprimento do "comércio" de caixas com chapéus da marca “Palmares". Alguns a cobrirem a cabeça de manequins com rosto e outros, os ditos cabides mostravam os bonés que também tinham elegância e qualidade. Encimando esta vista agradável um "Logo" bem concebido com um rosto masculino agradável e a palavra com corpo de letra de caixa alta "Palmares". Mas quase tudo isto mudava com a chegada de Dezembro e o desejado Natal, pois o Senhor Pousa, sócio e gerente da firma e da loja, sabia do seu ofício.
A montra do lado esquerdo deixava de ter fazendas e passava a repositório do mais fino que havia, respeitante a mercearias e confeitaria, seguindo o exemplo da do lado direito que já estava vocacionada para as coisa agradáveis ao palato, apenas mudando de aspeto pois era já doçaria de encantar adultos e criançada.
Já anteriormente mencionei os vários artigos expostos naquilo que era a nossa ilusão maior, a fartura de coisas que não eram pertença do nosso dia a dia e que nós "comíamos com os olhos", porque o comer aquelas coisas era prazer de outros que não nosso.
E aqui é exatamente onde reside o triunfo dos rapazes e raparigas da minha e das gerações anteriores à minha. Não temos complexo algum, bastou-nos ver as coisas boas da mesa de Natal de algumas pessoas para sermos felizes e podermos falar delas chamando-lhe pelo nome e quando o tempo chegou fomos capazes de tê-las sem que isso fosse novidade ou motivo de gáudio pateta. 
O que acabei de escrever não passa da recordação de um tempo bom de aprendizagem em que o paradigma era algo simples, tão simples que nos preencheu e nos ensinou a sermos gente: "O seu a seu dono”.
A este tempo sucedeu outro que se iniciou com o começo das ações de rebelião dos Movimentos de Libertação nas antigas Províncias ultramarinas e se manteve até ao 25 de Abril de 1974. Coincidiu este com o tempo da minha adolescência e foi sua componente imperativa mesmo que nesses treze ou catorze anos tivesse havido um progresso assinalável no respeitante à cultura (aparecimento das Bibliotecas Itinerantes da Gulbenkian) e também a economia que chegou no fim da década com um crescimento de 5% ao ano onde se deve enquadrar o aparecimento da SEDES, onde a classe média se meteu a reboque dos tecnocratas do Governo de Marcelo Caetano e juntou a participação da Cultura e das Novas Tecnologias no jogo das Sociedades Anónimas e o das ações em banca. A filosofia do Estado Novo estava a perder terreno a alta velocidade e por isso menciono nesta crónica algo que o meu amigo Senhor Norberto da Casa das Malhas, tio do Telmo, me dizia para justificar a mudança que se pressentia estar para acontecer, pensava-se, nas cúpulas do Estado, mas que quando se concretizou atingiu todos os extratos da sociedade e mudou o país radicalmente, abrindo caminho à ascensão política de gente menos capaz e menos honesta, mas proporcionando a inquestionável melhoria no que respeita à rede viária e ao erodir das diferenças de classe, que o Estado Novo sancionava tacitamente. 
Dizia então o Senhor Norberto: -O regime salazarista assinou a sua extinção ao dar um passo certo do ponto de vista do progresso. Criando a Emissora Nacional, veículo de propaganda do regime, foi permeável ao bom gosto e ao profissionalismo dos seus quadros que nos seus programas veicularam a crítica de arte e a sua difusão, permitindo ao público que acreditou sempre no que ouvia, a comparação de ideias, de obras e intenções e também com uma certa democratização do ensino, onde as Escolas Industriais e Comerciais elevaram os filhos dos lavradores e operários à condição de técnicos dos mais variados ofícios que foram o lastro do progresso lento mas seguro do país.
A própria guerra do Ultramar foi um elemento importante na tomada de posição dos oficiais subalternos e alguns superiores mais uns poucos generais que eram o sustentáculo do regime e ao qual ajudaram a decapitar alguns por convicção, outros por oportunismo. Mas, isto foram atos maiores e para o povinho onde eu me incluía que teve a oportunidade de desfrutar não só da Rádio e da Televisão mas também da corrente cultural à qual a Gulbenkian deu acesso e que foi a maior Revolução Cultural havida em Portugal em todo o tempo histórico. As bibliotecas deram-nos a possibilidade de ler Marx e Engels mas também todos os autores que ideologicamente estavam nos antípodas destes dois que se perfilaram num certo tempo como os criadores teóricos do Homem Novo. Estas que aqui enumero e explico, com a ressalva de algumas imprecisões são as imagens que frequentemente me vêm à memória logo a seguir às da infância do tempo mágico do Pousa, do Sousa, do Miranda Braga, Chico Machado e Alberto Rodrigues, o Cinzento do Café Central e da Sapataria da Moda.

Prometo voltar amanhã com a 2ª parte destas Minhas Memórias. 




Londres, 04/12/2019
A. O. dos Santos
(Bombadas)

2 comentários:

  1. O Cruzeiro, o Progresso, ambos na área central da cidade, que muito contribuiram para a vida social e cultural de Bragança, a Casa Coelho, o Sr. Raul (azeiteiro como lhe chamávamos) na Rua da República,o Queirós na rua Alexandre Herculano, que era uma verdadeira instituição, O João barbeiro, os tempos do FAOJ, etc...Boas memórias de um tempo urbano, mais lento, descomplexado e vivo!...São estas experiências, que vincam o espírito de uma comunidade e que ficam na retina dos seus habitantes!...Hoje constroem-se naturalmente outras memórias futuras! Bons tempos.

    Helder Caseiro

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  2. Lembro-me bem da casa Velasco e da simpatia do casal proprietário! Até porque morava perto, e aí me deslocava muitas vezes para comprar artefactos vários para a minha mãe!
    Bons tempos
    HMC

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