Algumas tiraram férias para poder aproveitar com a família e amigos.
Afinal o Natal é isso mesmo: família. Mas nem todos têm a mesma sorte. Vários serviços não podem fechar e, por isso há quem trabalhe nesta época. Outros não têm a possibilidade de passar estes dias com a família, porque estão acamados ou presos. Também há quem não tenha com quem passar o Natal.
Nos cuidados continuados da Santa Casa da Misericórdia de Bragança o Natal já se festeja há dias. Nesta altura é possível reparar que os utentes estão mais carentes e a atenção deve ser redobrada. Devido ao estado debilitado em que se encontram, muitos não têm a possibilidade de ir passar o Natal a casa, já outros não têm com quem passar a quadra festiva. Sónia Mouta é auxiliar da acção médica, há 11 anos, na Misericórdia e já perdeu a conta aos Natais que passou na instituição.
Apesar de admitir que é difícil passá-lo longe da família, referiu que é gratificante trabalhar com os idosos. “Temos a vantagem de que estamos a dar um miminho a pessoas que precisam, que passam o Natal fora da família, porque têm que ficar obrigatoriamente connosco”, disse, acrescentando que há utentes que só ficam ali porque os familiares não os vão buscar. “Eles ficam tristes porque se apercebem e sabem que a única família que têm somos nós, que lhes damos amor e carinho”, contou. Como forma de assinalar esta época, todos os anos é realizada uma festa, com todos os utentes reunidos.
Actividades não faltam nesse dia. Cantam, dançam, brincam e, acima de tudo, são felizes por alguns instantes.
Mas nem todos reagem de forma igual. Se, por um lado, alguns expressam a sua tristeza e o que estão a sentir por estarem afastados de casa, outros estão mais retraídos e preferem remeter-se ao silêncio. Armandina Pinheiro está internada há três anos nos cuidados continuados. Pela primeira vez, vai passar o Natal na instituição, porque os familiares vão para fora do país e não a podem levar. Ainda assim mostrou- -se contente por ficar ali. “É bom passar aqui o Natal. O almoço é melhorado e convivo com os outros utentes. É mais animado que nos outros dias”, contou, dizendo que as funcionárias são muito “simpáticas” e “prestáveis”. “Nestes dias tentamos dar-lhes um miminho extra, porque estes dias são sempre diferentes.
Toda a gente gostava de estar em casa com os familiares e vão passar um Natal diferente”, disse Eduarda Rodrigues, enfermeira há cinco anos na instituição. Também já passou alguns Natais a trabalhar, mas tal como Sónia Mouta referiu que “é gratificante trabalhar nestes dias”. Este ano, devido às intempéries que se fazem sentir nesta altura, os idosos não vão poder passar o Natal com a família. “Optámos por não autorizar as saídas, mas sim permitir um horário mais alargado para as famílias estarem com os nossos utentes”, explicou a directora técnica, Susete Abrunhosa. Os familiares podem jantar com os utentes no dia da consoada.
Natal entre grades
Se alguns não podem ir passar o Natal porque estão acamados e “presos” a uma cama, outros não o podem fazer mesmo com saúde. O estabelecimento prisional de Bragança tem 85 reclusos, maioritariamente do distrito de Bragança. Neste caso, o Natal é passado entre guardas prisionais e reclusos. A consoada não deixa de ser feita, mas o espírito é diferente. A falta da família já é sentida ao longo do ano mas, nesta época, a tristeza é maior.
Carlos (nome fictício, tal como o dos seguintes reclusos) está preso há pouco mais de um ano e este é já o segundo Natal que passa no estabelecimento prisional de Bragança. “Sendo o Natal uma festa da família, é nessa altura que sinto mais a privação da liberdade”, começou por dizer, explicando que, apesar de tudo, não existe solidão, porque estão todos mais próximos uns dos outros.
Mas não só os reclusos sofrem por estarem privados da família. Do outro lado, os pais, irmãos e amigos também partilham a tristeza por não poderem estar próximos. António já passou o Natal nestas condições, no ano anterior. Inicialmente recusou-se a estar com os outros reclusos na ceia, mas depois, com o incentivo de uma irmã, percebeu que era a única alternativa de para se distrair. Via-se-lhe a tristeza nos olhos quando o assunto foi o Natal. “O que me faz sofrer é o sofrimento que a minha família tem. Passei o Natal anterior a chorar, porque eles choraram comigo ao telemóvel”, contou emocionado. Mas nem todos os reclusos que ali se encontram sabem o que é estar longe da família nesta época festiva. Manuel está detido há sete meses e a expectativa para este Natal não é a melhor. “Normalmente o meu Natal era passado com a família e na aldeia, hoje tenho que o passar com os meus amigos mais recentes, aqui e vou tentar colmatar a saudade da família com a amizade deles”.
Os reclusos admitiram ainda que é nas actividades festivas que mais pensam sobre o crime que cometeram e aproveitam para fazer uma retrospecção. Se há reclusos no estabelecimento prisional, também há guardas prisionais.
Jorge Favas é guarda prisional, mas a sua licenciatura em Psicologia torna-o especial. Ser formado nesta área traz-lhe vantagens, como saber escutar os reclusos. “É uma mais-valia”, sublinhou. Passa o Natal a trabalhar desde que se lembra, no entanto nos últimos anos as coisas têm vindo a alterar-se. A escala de turnos começou a ser mais repartida, o que lhes permite estarem mais tempo com a família. “Já estou habituado”, disse, explicando que quando os filhos eram pequenos chegou a perder momentos importantes do crescimento dos filhos. Ainda assim, há 20 reclusos que têm a possibilidade de ir passar o Natal a casa, depois da autorização do juiz.
O bom comportamento e o tipo de pena atribuída determinam a tomada de decisão.
Por amor à pátria e à cidadania
Mais do que nunca é necessário ter atenção redobrada nas estradas, uma vez que é nestas épocas do ano que há mais tráfego de automóveis. Por isso, estão os agentes do destacamento de trânsito da GNR de Bragança, e os de todo o país, nas estradas com a Operação “Natal e Ano Novo”. Depois de os ter acompanhado até ao local da operação, Macedo de Cavaleiros, foi claro que um dos objectivos é sensibilizar os condutores para os cuidados a ter na estrada. Passar o Natal a trabalhar parece ser difícil para todos, mas alguns agentes da autoridade dizem já estar habituados. O que não é o caso do cabo Carlos João. “Passar o Natal longe da família é sempre diferente e custa sempre muito.
Jorge Favas, guarda prisional há 30 anos, aponta circunstâncias diferentes. Primeiro porque estamos longe de casa, depois porque nascem os filhos e depois porque os pais estão a ficar cada vez mais velhos”, salientou.
A única solução para tornar o dia mais alegre é comemorar entre colegas. Cada um leva um doce festivo e tudo se torna “mais familiar”. Nem sempre, depois do turno, os agentes podem voltar para casa junto da família. Grande parte deles já esteve longe da família, noutro sítio do país. Alcino Morais é militar há 30 anos e já não consegue contar pelos dedos das mãos os Natais que passou a trabalhar. Já esteve no Algarve, em Torres Vedras e em Lisboa e conciliar o trabalho com a família nem sempre é fácil. “É uma questão de hábito e os nossos familiares também já estão habituados a esta situação”, referiu.
Apesar de já não estranhar trabalhar nas épocas festivas, reconhece que perdeu momentos importantes, principalmente relacionados com o crescimento dos filhos. “A nossa família fica prejudicada, mas o lado positivo é trabalhar em prol do cidadão”, sublinhou. Três anos é a idade da filha do agente Marcos Vilela. Apesar de ser ainda pequena e não se aperceber da falta do pai, Marcos Vilela reconheceu já ter perdido alguns momentos especiais do crescimento da filha. “Já perdi alguns momentos, os primeiros passos, as primeiras falas, porque estava fora”, contou com alguma tristeza, dizendo que é difícil conjugar o trabalho com a família. Este Natal tem a sorte de o passar perto dos entes queridos. “É gratificante servir o cidadão. É isso que nos move, servir o cidadão e o país”, concluiu José Martins, sargento-ajudante no destacamento de trânsito da GNR de Bragança.
Jornalista: Ângela Pais
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