Andam mal uns e outros, contudo. Esquecem-se que houve um tempo no nosso país, em que expressar opinião não era permitido. Alguém metido no seu fato cinzento e muito cheio de si, no atapetado dos gabinetes, decidia e nomeava quem mandava em nós e nas nossas coisas públicas.
Era cómodo. Não era necessário que nos preocupássemos, mas não mandávamos. Mas havia quem lutasse. Pessoas que nunca desistiram de pelejar termos uma melhor vida e toda a voz. Graças a isso, Portugal veio para a modernidade fazendo da Democracia uma flor sem idade.
Graças a isso, hoje em dia e esperemos que por todos os anos, temos novas obrigações.
A par de termos de fortalecer quotidianamente o vigor e o teor democrático, temos o dever de escolher, temos o direito de sermos eleitos, temos o privilégio da vitória ou da derrota.
O jogo é permanente e esquenta nos períodos estabelecidos como de escolha, fervendo nos dias que antecedem a recolha nas nossas opções nascidas no quente do coração e convenientemente filtradas pelas capacidades da razão. São dias em que campeia a emoção porque nos sentimos mais inteiros e senhores de um imenso poder simbolizado numa simples cruz num mero quadrado desenhado num papel.
Naqueles segundos metidos numa singela cabine, sozinhos, mas parte integrante do universo, decidimos e influenciamos. Escolhemos. A caneta de onde escorre a tinta libertadora do nosso querer e do nosso acreditar, vira uma incrível arma de decisão. Faz parte do todo de onde brotam as novas realidades.
Por isso a Democracia é uma festa. Mesmo quando os que quererem ser eleitos e os que nos querem convencer e influenciar, nem sempre andem bem e muito menos com elevação. Mesmo quando nos tratam como se fossemos lerdos e diminuídos de visão sobre as coisas em causa. Mesmo quando em vez de informação e conteúdo nos mostram malabarismos.
Apesar de tudo e mesmo com eles a Democracia afirma-se e a vontade dos eleitores que somos implanta-se. Ora ganham uns, e outros perdem, ora é ao contrário, mas é simples e digno de se ver e de se festejar.
Em cada eleição que passa todos aprendemos e todos valemos. Em todas as vezes, cada cidadão deixa a suas mensagens. Umas são mais óbvias, outras são mais subliminares, mas deixa para que sejam vistas e compreendidas. Se são sempre cabalmente percebidas, é a dúvida, já que para isso é essencial grandiosidade na leitura dos contextos.
O borralho das eleições autárquicas de 2021 ainda está esquentado, mas em absoluto se pode dizer que a festa foi bonita e que ficou demonstrado que vender banha de cobra e lançar berlindes ao vento nem sempre funciona pois os tolos não se contentam só com os bolos.
Os de Lisboa que o digam.
-Durante os 48 anos (de ditaduras!) iniciadas com o 28 de Maio de 1926 até ao Libertador 25 de Abril, os autarcas de todos os cantos de Portugal; nunca foram eleitos directamente pelas respectivas populações, ( Cabos de Ordens,nas aldeias anexas e Regedores nas Freguesias,eram "se bem me lembro!" assim designados!) mais os presidentes das Câmaras Municipais, todos designados pelo Terreiro do Paço. No interior, (em que de tantas coisas nos queixamos hoje e, algumas vezes com razão!) até à"Primavera Marcelista" , ( de 1968 a 1974) em geral, com excepção de algumas vilas mais as cidades, todas as outras localidades, não usufruiam de energia eléctrica nem água nas habitações, as ruas eram lamaçais e estrumeiras a céu aberto no Inverno e poeira no Verão, as estradas municipais asfaltadas praticamente não existiam etc. - Resumindo: o poder autárquico é uma das heranças mais belas de todas as que a Revolução dos Cravos nos restituiu.
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