Por: Fernando Calado
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)
A Sara envelheceu ajudando a mãe a cuidar da sua ninhada… a lavar a roupa e a contar contas que tinham sempre um final feliz.
Os filhos nasciam e a casa era tão pequena… os serões longos… e os invernos assustavam…
… a Candidinha costureira morreu tuberculosa… e agora anda pelo povoado assombrando as noites.
… contava-se!
- Meu rei, vamos para nossa casa… não tenhas medo, meu rei…
… Sara, ouves a máquina da costura da Candidinha?!
- Não tenhas medo, meu anjo é só um ramo da parreira a bater na janela!
… adormecia e a noite serenava.
Às vezes ficavas muito triste… sentavas-te no banco de pedra da tua casa… memórias antigas… traziam lágrimas de orvalho.
- Sara, não quero que morras... nunca!
- Não morro, meu rei! E o abraço durava uma eternidade.
… um dia, ao entardecer, morreste… sem um queixume… sem uma lágrima…
Chorei… durante longos meses… lágrimas tantas… ribeiro manso…
… hoje regressei ao nosso banco, Sara e trouxe comigo a minha filha e as minhas netas para lhe dizeres que não morreste… que a felicidade existe… e estás tão viva como a nossa parreira… como a porta da nossa casa onde guardávamos os sonhos… ou como as contas mais bonitas que habitam, dolorosamente, ao canto da memória.
… é o eterno retorno, Sara… e tu sabias…
… porque te ris?!
Fernando Calado nasceu em 1951, em Milhão, Bragança. É licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto e foi professor de Filosofia na Escola Secundária Abade de Baçal em Bragança. Curriculares do doutoramento na Universidade de Valladolid. Foi ainda professor na Escola Superior de Saúde de Bragança e no Instituto Jean Piaget de Macedo de Cavaleiros. Exerceu os cargos de Delegado dos Assuntos Consulares, Coordenador do Centro da Área Educativa e de Diretor do Centro de Formação Profissional do IEFP em Bragança.
Publicou com assiduidade artigos de opinião e literários em vários Jornais. Foi diretor da revista cultural e etnográfica “Amigos de Bragança”.
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