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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 10 de setembro de 2024

FORFALHAS YE PAN

 Por: José Mário Leite
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)

Migalhas é pão! É um ditado antigo e frequentemente ouvido em todo o nordeste, em todas as suas declinações seja em rionorês, guadramilês, mirandês ou português. Independentemente da expressão escolhida, adequa-se na perfeição à Língua Mirandesa o que justifica o título. Milenar, (anterior à própria nacionalidade) foi um elo permanente de ligação, um refúgio seguro por vezes quase secreto, uma casa comum acolhedora para a gente das Terras de Miranda a quem proibiam de se expressar na sua língua materna na sede do concelho (por ordem de D. João III impondo tão draconiana medida à laia de tributo para a constituição do Bispado de Miranda), na escola e até na igreja, alegando a impossibilidade de ser atendido por Deus quando as preces fossem expressadas em língua alegadamente diabólica o que, para além de ser ofensivo para os falantes (fossem eles os mirandeses, os leoneses ou os asturianos onde esta forma de falar teve o seu berço) seria, igualmente, uma blasfémia pelo apoucamento aos inatacáveis e inquestionáveis poderes divinos.
O Estado Novo inaugurou um segundo e severo período repressivo proibindo a livre expressão nas escolas e instituindo a aplicação de castigos físicos às crianças que trocassem o português fidalgo pela linguagem bebida no peito materno e alimentada no recato do lar, praticada nas brincadeiras e sustentada no trabalho e demais afazeres diários. O isolamento das gentes do Planalto foi o resguardo para a manutenção da genuína e natural forma de expressão que se conservou e manteve suportada apenas na oralidade. Como tal teve, logicamente, alguma “contaminação” e, igualmente “contaminou” as regiões vizinhas. Mas sobreviveu sem comprometer a sua identidade singular.
A aprovação como a segunda língua oficial na Assembleia da República (Lei 7/99 de 29 de janeiro) deu-lhe o suporte legal para se poder afirmar a todos os níveis, e a aplicação da Convenção Ortográfica da Língua Mirandesa, permitiu a recolha e uniformização (mesmo que com variantes) desta forma única de falar e exprimir. Das migalhas, se fez pão! O pão, para que forneça o devido sustento tem de ser feito recorrentemente e de forma continuada ou, facilmente se consome e de novo serão “apenas” migalhas. Desse pão inicial e fundador, sobram-nos (a todos nós, portugueses e não só aos de Miranda nem, tão pouco aos nordestinos, apenas) hoje, migalhas das quais urge, de novo, juntar, unir, levedar e cozer para que do forno não cesse de sair fornada suficiente.
É preciso ratificar a Carta Europeia das Línguas Minoritárias (já aprovada pelo Governo); instalar o Instituto da Língua Mirandesa (criado e dotado de orçamento des- de 2023, mas nunca implementado); promover a edição de gramáticas, dicionários e manuais escolares; promover instituir um prémio literário para incentivar os muitos autores e falantes de mirandês a deixarem, em letra de forma, os conhecimentos próprios, as recolhas feitas (urge preservá-las sob risco de se perderem para sempre) e darem largas à poesia, ao romance, à tradução e ao ensaio de forma a perpetuar o saber de um povo que teimosamente o guardou e que não merece vê-lo desaparecer.
Juntem-se as migalhas ao fermento e… coza o forno.

José Mário Leite
, Nasceu na Junqueira da Vilariça, Torre de Moncorvo, estudou em Bragança e no Porto e casou em Brunhoso, Mogadouro.
Colaborador regular de jornais e revistas do nordeste, (Voz do Nordeste, Mensageiro de Bragança, MAS, Nordeste e CEPIHS) publicou Cravo na Boca (Teatro), Pedra Flor (Poesia), A Morte de Germano Trancoso (Romance) e Canto d'Encantos (Contos), tendo sido coautor nas seguintes antologias; Terra de Duas Línguas I e II; 40 Poetas Transmontanos de Hoje; Liderança, Desenvolvimento Empresarial; Gestão de Talentos (a editar brevemente).
Foi Administrador Delegado da Associação de Municípios da Terra Quente Transmontana, vereador na Câmara e Presidente da Assembleia Municipal de Torre de Moncorvo.
Foi vice-presidente da Academia de Letras de Trás-os-Montes.
É Diretor-Adjunto na Fundação Calouste Gulbenkian, Gestor de Ciência e Consultor do Conselho de Administração na Fundação Champalimaud.
É membro da Direção do PEN Clube Português.

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