Aos 63 anos, José Pulgas vê a arte que aprendeu em criança em risco de desaparecer
Aos 5 anos, José Pulgas, natural da Lousa, concelho de Torre de Moncorvo, já ajudava o pai a moldar as “cavacas” de madeira de castanho para fazer as cestas e canastras que, naquele tempo, eram usadas nos trabalhos do campo.
A arte de canastreiro é uma das profissões características da localidade, onde, em tempos, laboraram seis “artistas”. Actualmente, José Pulgas é o último canastreiro da Lousa e até do concelho moncorvense.
Aos 63 anos, o artesão recorda com mágoa, mas também com saudade, os tempos em que trabalhava de sol a sol, para conseguir ganhar dinheiro para o sustento da família.
“Antigamente vivíamos disto. Numa altura, fui trabalhar para a quinta de Vila Meã e em quatro dias ganhei dois contos. Naquele tempo era dinheiro…”, enfatiza o canastreiro.
A dureza do trabalho, desde a recolha da madeira à confecção dos cestos, é uma das dificuldades realçadas por este artesão. “É uma profissão muito dura e cansativa. Ao fazer as cavacas apanha-se cada queimadela …”, ironiza José Pulgas.
A par do esforço físico, o canastreiro realça que também é preciso ter habilidade nas mãos, visto que não é fácil transformar um pau em cavacas de diferentes tamanhos, para fazer as cestas e as canastras que, antigamente, eram utilizadas nas vindimas, na apanha da azeitona e, até, das batatas.
“Não é qualquer um que consegue tirar uma cavaca. Mas eu, desde garoto, que consigo fazer cavacas com os olhos fechados”, salientou José Pulgas.
Trabalho árduo em tempos difíceis
A perfeição é outro dos pormenores que caracteriza o trabalho deste artesão, que mostra, com orgulho, as cestas que ainda faz para oferecer aos amigos e familiares.
No conjunto dos seis canastreiros de antigamente, José Pulgas afirma que o melhor era o seu pai, com quem garante ter aprendido a ser um bom artista.
“Aqui na aldeia toda a gente queria o Zé Pulgas à jeira, porque trabalhava muito e bem”, diz o artesão com orgulho.
No entanto, não esquece as amarguras que passou com o seu pai, enquanto aprendia a arte.
“Às vezes, quando estava a cortar as cavacas, havia algumas que me saíam mal. Quando o meu pai não via escondi-as debaixo do banco, mas, quando ele se apercebia, levava com uma pelas costas abaixo”, recorda o artista.
Como era o filho mais velho, José Pulgas ganhou o gosto pela arte do pai, depois de ter sido obrigado a trabalhar, desde os 5 anos, para ajudar no sustento da família.
A partir daí, seguiu esta profissão até aos 25 anos, altura em decidiu emigrar para a Alemanha, à procura de uma vida melhor.
Passados 14 anos, José Pulgas voltou à aldeia que o viu nascer, mas optou por dedicar-se mais à agricultura, visto que os cestos e os baldes de plástico vieram substituir as cestas e as canastras em madeira de castanho.
Plásticos substituem cestas e canastras
“Enquanto um balde custa um ou dois euros, eu não vendo uma cesta por menos de 40 ou 50 euros. Isto dá muito trabalho tanto a fazer, como a arranjar e a preparar a matéria-prima”, realça o canastreiro.
Além disso, José Pulgas conta que, actualmente, é muito complicado arranjar a madeira para fazer as peças artesanais. “Eu costumo ir às matas. Corto um pau aqui, outro além e ninguém me diz nada, mas os incêndios têm queimado tudo e já não é fácil encontrar madeira suficiente para fazer estes trabalhos”, lamenta.
Aliás, o artesão deixou de participar na Feira de Produtos da Terra e Artesanato da Lousa, porque não tem conseguido arranjar matéria-prima suficiente para mostrar aos curiosos a arte de transformar a madeira de castanho em cestas e canastras.
“Na primeira edição da feira, as peças que fiz vendi-as todas bem vendidas. E, as pessoas que as adquiriram dizem que não se desfazem daqueles artigos por valor nenhum”, acrescentou o canastreiro.
Ao ver esta profissão chegar ao fim, José Pulgas afirma que gostava de ensinar a arte às gerações mais jovens, e fala da necessidade de criar cursos de formação direccionados para esta arte.
“Eu não me importava de dar algumas lições para ensinar os mais novos a trabalhar nisto. Apesar destes artigos serem usados, apenas, para decoração, é importante que haja sempre alguém que os saiba fazer”, concluiu José Pulgas.
in:diariodetrasosmontes.com
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