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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Horas a mais no trabalho: “Estamos passivamente a aceitar um novo tipo de esclavagismo”

Pedro Afonso, que acaba de apresentar um estudo sobre o impacto do excesso de carga horária laboral na saúde psíquica e na vida familiar, não tem dúvidas: trabalhar mais horas não significa produzir mais. E diz que é precisa acabar com ideias como esta: “Quem sai a horas é criticado porque é pouco empenhado, porque não se esforça”.
Trabalhar mais horas não significa produzir mais. É o psiquiatra Pedro Afonso quem o afirma, para alertar em seguida para os riscos da carga horária laboral excessiva, não apenas doenças físicas, mas também do foro psíquico: sintomas depressivos, ansiedade, perturbações do sono.

É um mal muito moderno. O médico, também professor de psiquiatria na Faculdade de Medicina de Lisboa, no Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica e na AESE-Business School, fala mesmo numa nova forma de “esclavagismo”. Quando a tecnologia, criada para nos facilitar a vida profissional e nos devolver tempo de descanso, nos transforma em funcionários a tempo inteiro e quando a pressão para estarmos sempre disponíveis faz com que se olhe de lado para o colega que respeita o horário de saída, acusando-o de ser pouco empenhado, a solução pode residir na capacidade de as empresas assumirem um compromisso ético, que respeite o tão necessário período de lazer e promova uma saudável vida familiar.

Isso mesmo sublinhou esta quinta-feira o autor de “Quando a mente adoece”, durante o debate “O impacto do excesso de carga horária laboral na saúde psíquica e na vida familiar”, promovido pela ACEGE - Associação Cristã de Empresários e Gestores.

É possível traçar uma fronteira entre o ser-se cumpridor e profissional e o saber parar porque se está a trabalhar demasiadas horas? 
Há uma linha estabelecida por padrões internacionais que o define. A OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico] proíbe o trabalho além das 48 horas semanais, incluindo já as horas extraordinárias. Mas isto não é respeitado, embora seja uma realidade que o excesso de horas de trabalho está associado ao desenvolvimento de doenças físicas, como hipertensão, doenças cardiovasculares e diabetes, mas também psiquiátricas (ainda que existam poucos estudos no que a esta última dimensão diz respeito).

Apresentou esta quinta-feira o resultado de um estudo sobre o tema. Quais as principais conclusões?
A AESE - Business School fez um estudo para avaliar precisamente as implicações de trabalhar mais de 48 horas por semana. Foram ouvidas 439 pessoas e verificamos que 53% estavam em situação de carga horária excessiva. Em média, trabalhando 54 horas semanais, referindo-se o estudo a participantes com uma média etária um pouco acima dos 40 anos. Mais, 75% das pessoas disseram trabalhar também em casa. Ou seja, o que devia ser exceção transformou-se na regra.

E não é difícil impor um limite, quando os telemóveis, o correio eletrónico e até as redes sociais nos fazem estar potencialmente sempre disponíveis?
Vivemos um paradoxo. As novas tecnologias apareceram para supostamente nos facilitar a vida e nos libertar para usufruirmos mais tempo de lazer e o que acontece é exatamente o contrário, com o que isso representa em prejuízos para a nossa saúde e vida familiar. Além disso, perdeu-se um certo pudor e reserva, que existiam há uns anos. Não se respeitam sequer os períodos de refeição, liga-se a qualquer hora... As fronteiras entre vida profissional e vida familiar diluíram-se.

E como é isto se pode inverter?
O que se verifica é que esta carga horária excessiva é algo que vem de cima. Parte dos diretores, chefias e é imposto verticalmente até aos funcionários, o que torna mais difícil promover a mudança. Creio que é um problema que só poderá ser resolvido com o assumir de um compromisso ético por parte das empresas. Esse caminho começou a ser seguido no Japão, por exemplo, e produziu já resultados. Nos anos de 1980, este país assistiu a um número crescente de mortes súbitas devido ao excesso de trabalho. Foi de tal ordem que as empresas foram obrigadas a assumir esse compromisso ético e o Ministério de Saúde teve de intervir. À semelhança do que existe em relação à responsabilidade social, por exemplo, defendo a criação de uma certificação de responsabilidade familiar.

Que se traduziria em...?
No assumir de compromissos que passem por permitir a flexibilização dos horários de trabalho, não enviar emails a todas as horas, criar protocolos com creches próximas dos locais de trabalho, para facilitar a vida dos pais com filhos pequenos...

Na pressão do dia-a-dia, nas rotinas de trabalho que temos instaladas, há sinais que devemos tomar como alarme?
Um dos sinais de alarme é passar a dormir menos tempo, o que abre caminho para o aparecimento dos quadros de ansiedade e depressão. Se dormimos menos, tornamo-nos menos produtivos. E não há como o organismo se adaptar a descansar menos.

Por outro lado, é um erro acreditar que trabalhar 10 ou 12 horas significa produzir mais. Tal como estudar oito horas não significa que o estudo renda efetivamente oito horas. O que se passa é que estamos passivamente a aceitar o que eu chamo ‘novo tipo de esclavagismo’, porque aos escravos não era permitido ter família e a sua vida e saúde podia ser posta em risco em função de um interesse material.

Mas num contexto económico como o que temos vivido, as pessoas vivem pressionadas também pelo medo de perderem os empregos...
É verdade. E há uma certa coação, mesmo entre colegas. Quem sai a horas é criticado porque é pouco empenhado, porque não se esforça. Para mães com filhos pequenos, conheço exemplos, isto é particularmente angustiante. Na minha experiência clínica, encontro também muitos jovens com quadros de exaustão física e psíquica. São licenciados de várias áreas - direito, jornalismo, engenharias - que não aguentam a carga horária enorme, que acontece logo nos seus primeiros empregos.

Na sua vida profissional, consegue impor limites?
[Sorriso] Ainda ontem me perguntaram se podiam ligar às nove da noite. Disse que não. Teria de interromper o jantar.



Mafalda Ganhão
Semanário Expresso

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