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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira..
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 10 de março de 2018

Assim se come em Bragança

O município pediu ao investigador Armando Fernandes que elaborasse uma Carta Gastronómica da região e o resultado é um livro que reúne o que é possível saber-se sobre os costumes gastronómicos de Bragança desde o período medieval até hoje.
Até que ponto um prato que associamos a uma região é realmente “tradicional”? Ou uma suposta tradição é de facto antiga? Ou um produto pode ser considerado regional? Uma carta gastronómica pode fixar um património histórico, material e imaterial, e ajudar a clarificar muitas destas questões.

O município de Bragança pediu ao investigador em história da gastronomia Armando Fernandes que elaborasse uma Carta Gastronómica da região e o resultado é um livro que reúne o que é possível saber-se sobre os costumes gastronómicos de Bragança desde o período medieval até hoje. São 128 fotografias de objectos de uso quotidiano ligados à cozinha e à alimentação, 77 entrevistas com habitantes e perto de 200 receitas.

Esta é uma história que começa nos tempos medievais, com a população a viver “do que a terra dava”, sendo o mais trazido pelos almocreves, “essenciais para o regular abastecimento de tudo quanto escasseava, caso do azeite, do pescado e do sal”. Armando Fernandes procura informação sobre os produtos comercializados nas “cartas de feira”, que nos dão uma ideia do que constituía a base da alimentação.

São diversas as fontes que o investigador consulta em busca de diferentes tipos de informações que, cruzadas, permitem fazer o retrato do que se comia, seja nas casas ricas, seja entre os pobres. O acervo documental da Santa Casa da Misericórdia de Bragança revela “os gastos com as refeições destinadas a doentes, presos, pobres, e pobres de pedir”, que se baseavam em “quartilhos de azeite, grão-de-bico e moletes de pão cozido”.

Outra fonte são as Memórias Paroquiais (do século XVIII), onde se percebe o que são os produtos locais numa altura em que os ingredientes vindos do Novo Mundo, através dos Descobrimentos, começam a entrar nos hábitos alimentares da população. As pautas alfandegárias mostram, por outro lado, que as sardinhas eram trazidas do litoral e da Galiza pelos já referidos almocreves (só no final de 1906 é inaugurada a ligação ferroviária entre Mirandela e Bragança).

Do Anuário Comercial de 1904, por exemplo, retira-se a informação da existência de grande quantidade de caça na serra de Montesinho. E, já no período da implantação da República, os documentos da Quinta da Rica-Fé ajudam a traçar o retrato da alimentação numa família “de grossos cabedais mas muito terra-a-terra nos seus hábitos alimentares”.

Depois de um Álbum de Objectos e Artefactos, a Carta leva-nos até aos dias de hoje para ouvirmos, pela voz de habitantes locais a história de hábitos, práticas e tradições, dando a imagem de uma vida difícil, de privações: “Na festa cozia-se uma galinha velha para se fazer sopa. Aos doentes serviam-se aguinhas só com um bocadinho da carne da galinha, senão fazia-lhes mal.”

Foi, contudo, desta vida de dificuldades que nasceram muitas receitas recolhidas junto da população mais velha (simples, como as torradas de pingo ou unto, ou mais radicais, como a lontra do FervenÇa, que começa assim: “Morta a lontra, esfola-se, amanha-se e retiram-se as tripas”). O livro termina com um glossário, onde descobrimos, por exemplo, que seminata é o mesmo que sarrabulho e que saranda é o mesmo que vadio.

Alexandra Prado Coelho
FUGAS/Jornal Público

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