As manhãs em Bragança tornaram-se mais claras, mas os moradores já não olhavam apenas para dentro das muralhas. Havia algo nos limites da floresta que despertava apreensão. Árvores retorcidas pelo vento pareciam esconder olhos atentos, e os rastos estranhos nos caminhos multiplicavam-se.
Afonso reuniu os jovens mais valentes na praça central, à sombra das torres ainda cobertas de neve.
- Precisamos investigar o que ameaça as nossas terras, disse ele. - Quem ou o que estiver a observar-nos não pode surpreender-nos e apanhar-nos desprevenidos.
Lídia fechou o caderno de registos e aproximou-se, com voz firme:
- Devemos agir com cuidado. Não se trata de invasores comuns, algo caminha nas sombras, inteligente e paciente.
Baltasar bateu o bordão no chão, chamando a atenção.
- Então iremos em grupos. Não deixaremos que o medo nos paralise, mas também não nos lançaremos às trevas sem preparação.
Três grupos foram formados. Um exploraria os caminhos próximos da floresta, outro, liderado por Lídia, investigaria sinais em à volta da cidade, o terceiro permaneceria nas muralhas, para proteger os habitantes e garantindo que nenhuma sombra atravessasse os portões sem ser vista.
Na noite que se seguiu, uma névoa espessa ergueu-se do vale, e envolveu Bragança. Silêncios pesados estenderam-se pelas ruas recém-limpas, e as tochas acesas pareciam pequenas guardiãs contra a escuridão crescente. Entre os troncos da floresta, figuras silenciosas observavam. Não eram totalmente humanas, nem totalmente animalescas, moviam-se com a paciência de quem aguarda o momento certo para agir.
O vento trouxe um sussurro, quase inaudível:
- Eles acreditam que a cidade está segura… mas não sabem que antigos segredos ainda dormem.
Afonso percebeu a presença da ameaça antes de qualquer um. Um arrepio percorreu a sua espinha, lembrando o Cavaleiro das Sombras e de como a verdade, mesmo revelada, não livrava totalmente uma cidade dos seus fantasmas.
- Amanhã, descobriremos se estas sombras são apenas a nossa imaginação… ou se algo mais antigo nos observa, murmurou, olhando para a neblina que envolvia o bosque.
Enquanto a cidade dormia, protegida apenas pelas muralhas e pelos poucos vigilantes, algo, ou alguma coisa movia-se entre as árvores. E, no coração da escuridão, olhos brilhantes fitavam Bragança, calculando cada passo, cada gesto, cada nova esperança que surgia.
O recomeço estava em curso, mas a paz era frágil. E Bragança aprenderia, mais uma vez, que a verdade e a coragem bastam apenas enquanto se está alerta, pois as sombras nunca descansam.

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