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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Portugal a Pé - Livro está «carregado de vida e quotidiano ao longo da estrada»


Em Novembro próximo veremos nos escaparates o livro «Portugal a Pé», da autoria de Nuno Ferreira.

«Portugal a Pé» é uma obra que retrata em mais de 400 páginas de texto e centenas de imagens a travessia que ocupou o jornalista ao longo de dois anos. Da ponta de Sagres ao extremo Norte de Portugal, o Nuno encontrou um «país que vivia do campo e que sofreu uma profunda sangria de gentes». Uma travessia que emocionou. Ao caminhante doeu a solidão dos nossos idosos, espantou o número de pessoas que reabilitam a tradicional gaita-de-foles, maravilhou a nossa paisagem natural. Uma viagem à margem dos habituais roteiros dos noticiários. Um país de sobreviventes que não estão dependentes do «próximo discurso à nação do político».
Uma conversa com o autor que nos antecipa aquilo que iremos encontrar neste seu mais recente título.
Café Portugal - Depois de nos habituar às crónicas em diversos meios, incluindo o Café Portugal, o Nuno Ferreira prepara-se para lançar o livro sobre o seu «Portugal a Pé? Sucintamente, que país vamos encontrar nestas páginas?
Nuno Ferreira - Embora tenha iniciado a travessia em Sagres e tenha percorrido pedaços do litoral algarvio, da costa de Aveiro e do litoral minhoto, a grande fatia do meu trajecto foi feito pelo interior e por povoações pequenas. Raramente descrevo o que encontro nas cidades. Talvez Évora seja a excepção. O país que atravesso é um país que vivia do campo, que sofreu uma profunda sangria de gentes para o estrangeiro e para os centros urbanos do litoral, que foi muito beneficiado por novas estradas e auto-estradas mas permanece sem alternativa ao modelo rural. Daí que muitas vezes a caminhada seja solitária e nostálgica, a nostalgia de tempos muito duros e de grande pobreza mas que permanecem na memória dos mais velhos que ainda por lá estão.
C.P. - A obra traça o seu percurso desde a ponta Sudoeste do país até ao extremo Norte. É um percurso longo, por diferentes regiões geográficas e humanas. Quando terminou este périplo o que tinha mudado no Nuno Ferreira?
N.F. - A viagem aproximou-me da verdadeira realidade do país, obrigou-me a vivenciar. Uma travessia destas mexe muito com a pessoa, emociona. Num dia existe desapontamento porque uma determinada povoação está vazia, noutro dia é um punhado de pessoas que desconfia das nossas intenções. Mais tarde, é-se muito bem recebido e convidado a ficar a viver numa zona. A viagem permitiu-me ter uma percepção muito maior do Portugal que me interessa e dos portugueses que verdadeiramente me interessam.
C.P. - No seu percurso conviveu com pastores, antigos mineiros, pescadores, artesãos, croceiros, etc. O que aprendeu o Nuno com todos estes homens e mulheres?
N.F. - A maior aprendizagem vem do facto de, à luz dos recentes acontecimentos tão mediatizados, esta gente sempre ter vivido em crise. Assim como o boom do novo-riquismo dos anos 90 do século XX lhes passou ao lado, são as pessoas mais preparadas para viver de acordo com leis de sobrevivência muito enraizadas. Não estão à espera do próximo discurso à nação do político x ou das próximas eleições. Há tempos regressei a Covas do Monte, uma aldeia da Serra de São Macário onde passara a pé e um habitante estava em cima do atrelado de um tractor a meter palha com uma forquilha para dentro de uma arrecadação. Mal me viu fez um sorriso rasgado e disse: «Nuno, aqui não há crise!».
C.P. - A escrita do Nuno trouxe-nos as antigas tabernas, as chegas de bois, os poços da morte, etc. Um Portugal que, para quem vive nos grandes centros, parece remontar ao passado. Continua, no entanto, vivo. Corremos o risco de a curto prazo só o encontrarmos em documentos como o seu livro?
N.F. - Há tradições, algumas polémicas aos olhos de muita gente, que continuam bem vivas: As chegas de bois em Montemuro, em Vinhais, em Montalegre ou as montarias ao javali, por exemplo. Outras velhas instituições do mundo rural estão como esse próprio universo, em extinção. As últimas tabernas são frequentadas por velhos nostálgicos, as últimas mercearias sobrevivem de quem ainda não se acostumou a ir aos supermercados. É a lei dos tempos.
C.P. - Em muitas passagens das suas crónicas trespassa-nos o sentimento de um país ao abandono. Dos muitos episódios que viveu e que, certamente, vai retratar neste livro «Portugal a Pé», quais foram os que mais o chocaram?
N.F. - Foi doloroso atravessar o distrito de Bragança em pleno Inverno, verificar que as casas antigas estão a cair, que as novas estão fechadas à espera do próximo mês de Agosto e que existem muitos idosos a viver isolados e sozinhos, em terras onde muitas vezes até o café já fechou. Os transportes públicos em muitas zonas são residuais, as escolas uma recordação do passado e os serviços de saúde estão tão concentrados que muitos doentes passam a vida nas ambulâncias de um lado para o outro.
C.P. - Pela positiva. O que encontrou de melhor?
N.F. - A diversidade geográfica do país proporciona belezas naturais fantásticas, muitas delas também ao abandono ou mal exploradas. Temos alguns dos rios menos poluídos da Europa e um interior magnífico para explorar a pé ou de bicicleta. Por outro lado, encontram-se espalhados por Portugal muitos portugueses que teimam em manter ou reavivar as tradições das suas regiões. É com essas pessoas e sobretudo através de associações e sociedades recreativas que o país se vai mantendo vivo. O boom de gente a tocar gaita-de-foles mirandesa não se deu porque alguém em Lisboa decretou por decreto ou a rede de cante alentejano, por exemplo. Mantém-se porque há gente, carolas, que mantêm e lutam para manter a tradição.
C.P. - Habituamo-nos a escutar «chavões» como: «interioridade»,«periferia», «Portugal profundo». Ao que lhe soam estas palavras depois de ter percorrido milhares de quilómetros pelo país interior?
N.F. - Todos esses termos têm razão de existir mas têm servido mais para enfeitar discursos de políticos do que para outra coisa. Existem na realidade regiões mais esquecidas do que outras e o distrito de Bragança é um exemplo. O «Portugal profundo» sofreu, no entanto, profundas alterações a nível de infra-estruturas rodoviárias e de conforto das habitações. O que mais dói no interior é constatar a solidão em que vivem muitos dos nossos idosos.
C.P. - O livro irá ter uma forte componente em imagem. Que aspectos procurou o Nuno Ferreira, «fotógrafo» capturar nesta viagem de dois anos?
N.F. - Desde que saí de Sagres que tive a obsessão de ir registando o que encontrava pelo caminho com a minha máquina compacta. O que surge é a vida, o quotidiano ao longo da estrada. O facto de transportar uma mochila e caminhar condicionou-me por vezes na abordagem das pessoas mas também me permitiu captar coisas que de outra forma me passavam ao lado.
C.P. - De tudo o que ouviu, de novos e velhos, ao longo do seu percurso, qual é a frase que mais vezes lhe ressoa à memória? Porquê?
N.F. - A frase que mais me ressoa à memória é: «A pé? Nem uma bicicleta tem?» O caminhar ainda é interpretado como sinal de pobreza e vagabundagem. Os mais velhos vinham ter comigo e contavam o que para eles representava andar a pé quando não havia carros nem estradas e era preciso atravessar as serras e os trilhos para trocar ou vender algo. A primeira obsessão deles foi ter uma bicicleta, depois uma motorizada, depois um carro. Andar é para os indigentes.

Café Portugal; Fotos - Nuno Ferreira |

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