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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 23 de junho de 2015

Duas Lendas da Aldeia de Talhas


Talhas é, actualmente, uma das 38 freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros, e uma das mais antigas e laboriosas do distrito de Bragança. Tem uma área aproximada de 45 quilómetros quadrados e situa-se na margem direita do Rio Sabor. O seu orago, é o arcanjo São Gabriel. Aldeia antiga, dizem que é da Idade do Ferro, tem um núcleo de arte rupestre a merecer estudo dos arqueólogos.
O topónimo de Talhas, segundo os genealogistas, deriva do latim “TINALIA” que significa talha ou vaso. José Leite de Vasconcelos na “Revista Lusitana” - Volume XXXV, pág. 313, no artigo Etimologia de Talhas, escreve, e passo a citar: « Tealas= a Tealhas, é o plural de tealha..., vasilha que devia ser de dimensões grandes (…). Imagino que talha, por evolução linguística, veio, em tempos remotos, a significar sepultura aberta em um penedo, ou em uma laje (…). Tendo-se constituído um povoado num sítio de muitas talhas ou sepulturas, advinha facilmente a ele o nome. Sei do lugar chamado Talhas no distrito de Bragança...». Mas o Abade de Baçal, nas “Memórias”, Tomo X , págs. 159 e 160, diz-nos: «O termo talha aparece na documentação medieva e posterior para designar um fôro que se pagava pelo gado bovino, equídeo, ovino e ainda a contribuição paga por cada fogo ou chefe de família, segundo a sua capacidade (…). Neste sentido, é possível que o étimo Talhas, como o de Sortes e outros, corresponda a quinhões, leiras, etc. Em que a terra foi dividida pelo senhorio para entregar aos colonos após a reconquista artur-leonesa. Talha tem muitas e variadas significações, mas na exposta é que deverá estar a da povoação bragançana...». Também Monselhor José de Castro na sua obra “Bragança e Miranda” – Volume 4, pág. 310, escreve a seguinte nota sobre Talhas: «Talhas (S. Miguel) – Tem casa de residência e anexas as quintas de Lameirão, Capela, Eirinha, Cangalhas e Barreira.». Por tudo isto, é de admitir que a origem do étimo Talhas venha, de facto, de um conjunto de quinhões, leiras, etc.
Feito este pequeno resumo histórico da freguesia de Talhas, que, como vemos, é povoação antiga, vejamos, agora, a versão de duas lendas que se contam na aldeia. Lendas que são, talvez, indicativas do passado das suas gentes: simples, honradas e trabalhadoras, como nunca vi melhores.
A primeira lenda foi-me contada por um poeta popular da aldeia, chamado Manuel Planeta, e é assim:
«À saída da aldeia existe uma fonte, chamada Fonte dos Navalhos, que tem sempre água muito limpa e fresquinha. Está situada à beira do caminho e era nela que os caminheiros que se dirigiam a terras de Miranda saciavam a sede. Mas um belo dia, um desses caminheiros estava debruçado sobre ela, a beber água, e viu no fundo da água um grande cordão de ouro. Perante esta visão, foi saber de um garavato para o puxar e conseguiu agarrá-lo. Depois foi puxando por ele, puxando e já tinha uns metros de cordão fora da água, quando ele ficou preso no fundo da fonte. Nessa altura, ele, preocupado, olhou para trás e viu atrás de si um enorme touro preto a olhar para ele. Ele assustou-se, deu um grito, largou o cordão das mãos e ele caiu ao chão. Nesse mesmo instante o cordão desapareceu da sua vista e ouviu o ressoar forte da voz do touro a dizer para ele: há!, ladrão, largaste o cordão, dobraste o meu encanto!».
Em Talhas, a Fonte dos Navalhos continua no mesmo sítio. Muitas vezes lá bebi água fresquinha, como diz a lenda, quando ia com o meu avô Luciano para a festa do Divino Espírito Santo. Que fica num cabeço, um pouco mais adiante.
A segunda lenda, também curta, é sobre tecedeiras e teares e está ligada a buracos cavados nas rochas, nas margens do Ribeiro da Soalheira, que desagua no rio Sabor, e que a população chama “os buracos da moira”. Esta lenda diz-nos o seguinte:
«Nos buracos da moira, à meia-noite em ponto, na noite de S. João, ouvem-se cantar mouras encantadas e bater os teares aonde elas estão a tecer o linho para os enxovais... Mas isto só pode ser ouvido por pessoas que estejam no local, a essa hora, e não tenham pecados...».
Acho esta lenda, pela sua originalidade, interessante... Ela fala de uma condição, deveras difícil, para se poderem ouvir cantar as mouras encantadas e os teares a tecer: não ter pecados!... Era no dia de S. João que as pessoas da aldeia se levantavam antes do nascer do Sol para se lavarem, porque diziam que a água estava benta! Não sei se essa tradição ainda se mantém ou não.
Estive junto dos buracos da moira e de umas pequenas grutas, quando era jovem. De facto, é um local bucólico para se estar à meia-noite, na noite de S. João, à espera de ouvir cantar moiras encantadas e teares a tecer... Aliás, coisas em que o meu avô acreditava! Só que ele dizia-me que as não podia ouvir, porque tinha pecados... Até nestas pequenas coisa, o meu avô era verdadeiro!

João de Deus Rodrigues
in:jornal.netbila.net

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