Número total de visualizações do Blogue

Pesquisar neste blogue

Aderir a este Blogue

Sobre o Blogue

SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Nós Transmontanos, Sefarditas e Marranos - LUÍSA (SARA) MARIA BERNARDA – MME RABA (1712-11-05 – 1784)

Muito se tem escrito sobre a família Raba. Algo esquecida, porém, tem permanecido a matriarca, Luísa Maria Bernarda, acaso a responsável maior pelo sucesso da família. Este artigo pretende fazer um pouco de justiça.
Do lado materno, as raízes mais antigas de Luísa Bernarda encontram-se em Torre de Moncorvo onde, no século XVI, vivia o casal constituído por Gaspar Fernandes e Beatriz Vaz, ambos cristãos-novos e que foram os pais de Catarina Martins, (1) que em 1652, foi prisioneira na inquisição de Coimbra, sendo casada com Luís Lopes Tinoco, curtidor de profissão. Duas das 4 filhas de Catarina e Tinoco foram casar em Chacim: Isabel Rodrigues, com Jorge Lopes, curtidor e Maria Henriques, com André Lopes, que negociava em sedas. (2)
André Lopes e Maria Henriques tiveram 3 filhos e 4 filhas. Uma delas, nascida em Chacim em 22 de Maio de 1698, foi batizada com o nome de Catarina Henriques, a qual casou em 14 de Setembro de 1707 com Bernardo Lopes, (3) este nascido em Benavente, Espanha, já viúvo e com vários filhos de Ana Pereira, sua mulher.
O casal fixou residência em Bragança, e ali lhe nasceu um filho (André Lopes (4) dos Santos) e 3 filhas: Brites Bernarda, Branca Maria Bernarda e Luísa Maria Bernarda, de quem vamos falar. Antes, porém, refira-se que a casa de morada de Catarina e Bernardo era na Rua Direita, onde ele faleceu em 12 de Novembro de 1746, com testamento onde deixou a obrigação de 100 missas, ao preço de 80 réis cada uma.
Nasceu Luísa Maria Bernarda em 5.11.1712, em Bragança. Casou em 9 de Fevereiro de 1728, com Francisco Henriques Nunes, Raba, tendeiro, uns 26 anos mais velho do que ela. 9 meses depois, em 11 de Dezembro,  nasceu o primeiro filho do casal, que foi batizado com o nome de José Henriques Nunes. Outros 7 se seguiram, nascendo o último, Francisco Henriques Nunes em 26.2.1743, ou seja: meio ano depois de falecer o seu progenitor que, entretanto ascendera à prestigiada classe dos assentistas. (5) E isso nos permite pensar que a família viveria em Bragança com bastante desafogo. De modo que dois dos filhos, o André e o Caetano, depois de fazer os estudos preparatórios em Bragança, certamente no colégio dos Jesuítas, rumaram para a universidade de Coimbra.
Andava a Luísa Bernarda nos 37 anos quando o vendaval da inquisição a arrastou para as masmorras do tribunal de Coimbra, em 29 de Julho de 1749. Vendo a mãe presa e levada para Coimbra, o filho mais velho ter-se-á metido também a caminho. E receando ser preso, ele e o irmão André (que era já estudante de latim na universidade) foram também apresentar-se no mesmo tribunal que lhes instaurou os respetivos processos (disso falaremos depois) e os mandou embora. Pior sorte caiu sobre o irmão Bernardo que foi preso em Setembro seguinte. A mãe e os dois filhos mais velhos (o José e o Bernardo) compareceram no auto de fé de 22 de Agosto de 1751. O André, que contava apenas 15 anos quando lhe foi instaurado o processo, haveria de comparecer em auto privado de 10 de Maio de 1755. (6)
Obviamente que a inquisição comeu muitos dos bens da família e arruinou a empresa dos Raba. Para mais era a vergonha de aparecerem vestidos com os sambenitos, expostos a vexações constantes em Bragança. Por tudo isso os Raba decidiram ir para Lisboa e dali espreitar ocasião favorável para abandonar o país e rumar a terras de França onde, aliás, estavam já estabelecidos parentes seus, nomeadamente o seu sobrinho André Lopes Pereira (filho de sua meia irmã Catarina Pereira) e Bernardo Lopes Pereira (filho de seu meio irmão Jerónimo Lopes Pereira e de Branca Maria tia  materna de Luísa Bernarda). Aliás, existe correspondência trocada entre o primeiro e sua mãe, entre Bordéus e Bragança, via Lisboa, muito elucidativa dos medos e angústias provocados pela perseguição inquisitorial e das intenções de fuga daquela gente. (7) E além das cartas, vinham também moedas de ouro, para a família se remediar.
Difícil era encontrar um barco que os levasse a França, pois que a vigilância dos esbirros da inquisição era muito apertada. Menos apertada com os barcos ingleses, dadas as relações privilegiadas e a intensidade do comércio marítimo entre os dois países. Optaram por isso por embarcar num navio inglês para Londres e dali para Bordéus, em França. Com os filhos, Bernarda levou também uma sobrinha, chamada Catarina Ferreira, que estava prometida em casamento com o seu filho mais velho.
A chegada a Bordéus terá acontecido em 24 de Junho de 1763. Luísa Raba viveu ainda por mais de 20 anos, vindo a falecer em 1784, com 72 anos de idade, sendo sepultada no cemitério judaico estabelecido em 1764 na então chamada “cours d´Espagne”, atual “Cours d´Yser”. Assistiu à morte de alguns filhos e ao casamento de outros. Conseguiu manter unidos os filhos e com eles construir uma sociedade comercial intercontinental que amealhou fantástica fortuna. Em 1785 a sociedade formada pelos irmãos Raba e pela mãe e dois negociantes de Port-au-Prince, da Silva e Dulièpre tinha um ativo de 444 197 libras, das quais 272 764 pertenciam aos Raba, que também possuíam 365 895 libras em créditos. (8) A unidade da família e a ligação à terra natal, Bragança, são a marca mais expressiva da educação que a matriarca soube incutir no ânimo dos filhos. Resta dizer que em Bordéus toda a família aderiu ao judaísmo e que, na ocasião, Luísa Bernarda tomou o nome judeu de Sara.

NOTAS e BIBLIOGRAFIA:

1-ANTT, inq. Coimbra, pº3642, de Catarina Martins.
2-IDEM, pº 6195, de Isabel Rodrigues; pº 7325, de Jorge Lopes; pº 5743, de Maria Henriques.
3-IDEM, pº 7214, de Bernardo Lopes.
4-IDEM, pº 11602, de André Lopes dos Santos.
5-IDEM.
6- IDEM, pº 9766, de Bernardo Henriques Nunes; pº 156, de André Lopes Henriques. Os processos de Luísa Maria Bernarda e de José Henriques Nunes não estão localizados nos ficheiros disponibilizados pelo ANTT. Os dados referidos foram tirados do processo de Brites Pereira (nº 2450, da inquisição de Lisboa) sobrinha e prima, respetivamente.
7-ANTT, inq. Lisboa, pº 11602, de André Lopes dos Santos.
8-CAVIGNAC, Jean – Dictionaire du Judaisme Bordelais aux XVIII e XIX siècles.
CRAVO, António – No caminho judaico, passando pelos criptojudeus portugueses, em França, pp. 180-191, edição do autor, Salselas, 2016.

Por António Júlio Andrade / Maria Fernanda Guimarães

Sem comentários:

Enviar um comentário