Não faltam notícias animadoras sobre este país pitoresco que, há bem pouco tempo, parecia condenado a um calvário de décadas, preço imposto por desmandos na gestão da dívida pública, uma fartura para leirões instalados à boca dos cofres, a chiar de satisfação até que chegaram as vassouradas de quebrar a espinha à generalidade da rataria.
Toneladas de turistas entopem os aeroportos, os apertos no consumo já passaram à história, automóveis vendem-se em barda e o valor das casas está a tocar os limites do absurdo. É a grande festa, verdadeira tripa forra e só não dança quem é burro ou não entende o papel da cagança no quotidiano de uma sociedade que prefere as aparências à consideração atenta da realidade.
Claro que alguns não entram na roda e outros já se cansaram de rodopiar no frenesim, donde não tiraram senão tonturas e agonias. Circunspectos, cofiam as repas, franzem o sobrolho e corre-lhes a lembrança para enfermeiros, professores, médicos, juízes, polícias, militares, incomodados não se sabe por que moinhas. Talvez sejam só manias de quem se habituou a essa condição dos privilegiados a que chamam dignidade.
Escolhem, por isso, manter-se a conveniente distância, ganhando espaço para respirar.
Entretanto, ficam a saber que se instalou a confusão numa auto-estrada, tudo a inverter marcha e a tentar sair em contra-mão porque havia fumo a pairar sobre as faixas de rodagem. Como não há fumo sem fogo e a memória de há um ano é de verdadeiros assadores de gente nas estradas, salve-se quem puder.
Afinal, a confiança que o poder político deveria inspirar, a tranquilidade que lhe compete garantir não entram nas contas dos cidadãos quando pressentem correr algum risco.
Se não se contar com o poder político para garantir a ordem, a segurança, a justiça e a equidade, podemos estar a cair no caos ordenado da selva, império dos instintos, da lei do mais forte, paraíso dos predadores sem remorsos.
O mundo acumula sinais que justificam racional pessimismo. Também o país não permite optimismos, porque o poder se move longe do que a razão aconselha.
Nós, por cá, temos longa e amarga experiência da inutilidade de ter razão. Durante décadas chamou-se a atenção para a necessidade de visão estratégica, de políticas de valorização destes territórios, não retirando serviços e instalando estruturas do Estado, nomeadamente, unidades de formação de forças de segurança, para compensar a retirada das unidades militares.
Ninguém nos ligou. Agora, o ministro Siza Vieira, na versão revista e ampliada das medidas para o desenvolvimento do interior, promete que novas instalações do género terão que ficar no interior. Pergunta-se: qual interior? A 50 km da capital ou no verdadeiro interior?
Lembramo-nos que chegou a ser criado um centro de formação da Escola Nacional de Bombeiros em Bragança, desactivado pouco depois, apesar de haver terrenos disponíveis e promessas de edificação. Já lá vão 20 anos.
Reconhecem-nos razão, mas ficamos com a sensação de que continuam a brincar connosco.
Teófilo Vaz
in:noticiasdonordeste.com
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