quarta-feira, 20 de março de 2019

ACONTECIMENTOS POLÍTICOS E ELITES POLÍTICAS NA BRAGANÇA CONTEMPORÂNEA - DA REVOLUÇÃO DE 1820 À CONTRARREVOLUÇÃO DO 2.º CONDE DE AMARANTE (1820-1823)

Em 24 de agosto de 1820, na sequência da insatisfação generalizada que se fazia sentir em Portugal – devido, entre outros fatores, à ausência do Rei D. João VI no Brasil; à saída contínua de dinheiro, sob a forma de rendas e contribuições para aquele Reino; à decadência do nosso comércio; às dificuldades financeiras que se faziam sentir; ao domínio inglês na administração portuguesa e no nosso Exército –, e por outro lado, devido ao triunfo do liberalismo em Espanha, teve lugar no Porto uma Revolução Liberal, à qual acabou por aderir todo o Reino.
Coronel Bernardo Correa de Castro Sepúlveda, um notável de Bragança e influente político no tempo da Revolução Liberal do Porto, em 1820

Em Trás-os-Montes, apesar da oposição do seu governador militar, Francisco da Silveira Pinto da Fonseca, conde de Amarante, as cidades e vilas da província aceitam a autoridade da Junta Provisional do Governo Supremo do Reino, saída da revolução, determinada em convocar as Cortes para, à semelhança de Espanha, adotar uma Constituição.
Em Bragança, o juiz de fora, José Maria da Veiga Cabral, a 27 de agosto, por ordem do conde de Amarante, proclamou contra o movimento do Porto. Contudo, em 9 de setembro,  por iniciativa do bacharel Manuel Bernardo Pinheiro de Lacerda e dos oficiais daquela praça militar, foi proclamada a adesão ao movimento revolucionário do Porto e o juiz de fora já referido, na Câmara Municipal, no dia 13, reuniu o Senado e as autoridades civis, militares e eclesiásticas, todos jurando obediência ao Rei, às Cortes e à Constituição que viesse a ser proclamada, assim como ao Supremo Governo constituído no Porto.


As eleições para as Cortes Gerais realizaram-se em dezembro de 1820, e em janeiro de 1821 tomou posse um novo Governo e uma nova regência para governar o País na ausência de D. João VI, o qual, vindo do Brasil, regressou a Lisboa em julho de 1821, após ter jurado as bases da futura Constituição.
Em 4 de abril de 1821, a Câmara de Bragança envia uma mensagem de felicitações ao Soberano Congresso, logo seguida, três dias mais tarde por idêntica mensagem do cabido de Bragança.


Em 6 de maio de 1821, o vigário capitular do cabido de Bragança, António Xavier da Veiga Cabral, ordena que em todas as freguesias do bispado se cante um solene Te Deum, em ação de graças pela notícia do juramento da Constituição pelo Rei, D. João VI. E no dia seguinte, o cabido envia às Cortes nova mensagem “entusiasta”, reiterando o juramento de adesão e obediência às bases da Constituição Política do Reino.
Em 11 de outubro do mesmo ano, uma portaria do Governo determina ao vigário capitular da Diocese de Bragança-Miranda que tome as providências necessárias para os párocos anunciarem aos povos “o bem que deve esperar-se da Constituição”, e em 20 do mesmo mês, uma pastoral do governador do bispado exorta os párocos a fazerem das suas “práticas e pregações uma espécie de catecismo político”, em apoio “firmíssimo” da Constituição e do amor à Pátria.
Na sequência da carta de lei de 27 de julho de 1822, procedem-se a eleições municipais por escrutínio secreto, as quais tiveram lugar, quanto a Trás-os-Montes, em outubro de 1822, tendo sido eleito Presidente da Câmara de Bragança Francisco de Figueiredo Sarmento, genro do falecido tenente-general Manuel Jorge Gomes de Sepúlveda, herói das invasões francesas.

Manoel da Silveira Pinto da Fonseca Teixeira, 2.º conde de Amarante

Em 3 de novembro de 1822, na Casa da Câmara de Bragança, “numerosa companhia” reúne para festejar o dia em que todas as autoridades portuguesas prestaram o solene juramento à Constituição, tendo o bacharel Gabriel José Nunes Furtado recitado um discurso alusivo a tal cerimónia.
A independência do Brasil em 1822, cuja perda era imputada à política das Cortes e do novo Governo; a resistência de grande parte da nobreza e do clero às mudanças que se anunciavam; o descontentamento ou indiferença da maior parte da população face ao novo regime; a hostilidade dos proprietários do Alto Douro quanto à redução dos privilégios da Companhia Geral da Agricultura dos Vinhos do Alto Douro, a braços com uma produção largamente excedentária quanto ao consumo e exportação; e a própria conjuntura europeia, após o Congresso de Viena em 1815, favorável às monarquias absolutas, constituem alguns dos fatores que geraram o ambiente próprio para liquidar o regime vintista e restabelecer o absolutismo.
Em 16 de fevereiro de 1823, o segundo conde de Amarante, Manuel da Silveira Pinto da Fonseca, revolta-se em Vila Real contra o regime constitucional, levando a aderir à sua causa as unidades militares de Trás-os-Montes.


Bragança, onde estavam instaladas duas unidades militares, o regimento de Infantaria n.º 4 e o regimento de Infantaria n.º 12, apesar da resistência inicial à sublevação – o regimento de Infantaria n.º 24 era comandado por António Correia de Castro Sepúlveda, visconde de Ervedosa e irmão de Bernardo Sepúlveda, um dos heróis da revolução liberal de 1820 e do período vintista; e o regimento de Infantaria n.º 12 tinha como comandante Francisco de Figueiredo Sarmento, que não aderiu à rebelião –, acabou por se pronunciar a favor da contrarrevolução absolutista em 27 de fevereiro de 1823, “pela uma hora da noite amanhecendo para quinta-feira, depois do Domingo dos Passos” – 22 oficiais do regimento de Cavalaria n.º 12, unidade aquartelada em Bragança, irão ser afastados do serviço militar mais tarde, com a Vilafrancada, que instaurou, de novo, o regime absolutista, o que parece revelar a fraca adesão do movimento do conde de Amarante na praça militar daquela Cidade.
Incapaz de alargar o seu movimento ao Minho e à Beira, batido pelas tropas liberais em Amarante após o sucesso inicial obtido no combate de Santa Bárbara, de 13 de março de 1823, o exército do conde de Amarante retira para Espanha, por Bragança. Nesta Cidade, os revoltosos apropriam-se dos cofres públicos e obrigam 38 dos seus moradores, na sua maioria homens de negócios, a pagar uma verba de 31 177$200 réis. Os constitucionais irão apelidar esta operação de “extorsão vil”. Os absolutistas vão publicar, em 30 de agosto de 1823, no Diário do Governo, o mapa geral da receita e despesa da Junta do Governo Interino estabelecido em Trás-os-Montes, presidida pelo conde de Amarante, do qual consta a verba recolhida em Bragança, no âmbito dos dinheiros recolhidos durante a sublevação, a título de empréstimo e donativos (Quadro n.º 80).


Os “boletins do exército constitucional” referem que, em 13 de abril, o Exército Constitucional entrou em Bragança “entre as aclamações do inumerável povo que o recebeu como libertador. A Câmara Constitucional foi em corpo receber o general em chefe, a alguma distância da Cidade. Em todos os semblantes se lia a satisfação, o regozijo e o mais nobre entusiasmo patriótico. A par de vivas à Constituição e a El-Rei Constitucional, soaram imprecações contra os malvados causadores das desgraças desta Província”.
Sá Chaves, que escreveu a obra mais extensa e profunda sobre a contrarrevolução trasmontana de 1823, refere, contudo, que a Cidade do Sabor “os recebeu sem grandes entusiasmos, a descontento da contribuição que os silveiras lhe haviam lançado vinte e quatro horas antes”.
No rescaldo da contrarrevolução transmontana, o general António José Claudino Pimentel desterra para Sagres, em ofício de Bragança datado de 18 de abril de 1823, o vigário capitular da Diocese, António Xavier da Veiga Cabral da Câmara, mandando ao cabido que elegesse outro eclesiástico para tais funções. Na mesma altura, também foi desterrado para Sagres Manuel Bernardo de Araújo, cónego da Sé de Bragança.

Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa

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