(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Começado o mês de Dezembro é tempo de Advento e assim era no tempo da minha criação, quando o Natal ainda não se havia transformado no tempo de consumismo e hipocrisia que será a maneira mais simples e completa de definir a transformação que este tempo Santo sofreu.
A Igreja católica que tudo controlava devido a ser desde sempre a instituição que mais poder teve em Portugal permitiu que os seus membros se laicizassem ao ponto de com o seu comportamento, contrário à mensagem do Senhor, terem-se afastado, não só da Igreja, mas da própria fé, parte substancial do povo de Deus.
Claro que houve outras causas e bem diferentes, mas não diminui em nada, a heresia que é o comportamento de algum clero, alto e baixo.
O pai natal que é uma criação dos povos ricos do Norte da Europa, apoderou-se do imaginário dos povos do sul e o presépio quase que foi varrido do tempo de Natal e nós que o aceitámos com deslumbre condescendemos deitar fora a nossa crença num verdadeiro Deus e trocámo-lO por um gigantone carregado de prendas para os ricos, pois com a sua corpulência não cabe na porta, quanto mais na chaminé dos pobres. E a mensagem linda do presépio desfez-se com o auxílio parolo do nosso deslumbre. Confesso, eu próprio, que escrevo esta denúncia, ter dificuldade em discordar da tese da minha gente que por força da vivência noutras paragens não se dão ao trabalho de equacionarem dois modos tão distintos de celebrar o Natal: um que se baseia unicamente em prazer pessoal através do consumo de quimeras e outro que tem a virtude de nos fazer refletir nas coisas mais transcendentes que foram motivo de verdadeira beleza que o homem assimilou com o seu desapego à futilidade das riquezas de uns que obrigam à pobreza de outros. No momento em que ilusoriamente vamos para além do senso comum de economia e passamos a barreira da humildade, nesse mesmo tempo viramos as costas ao que de mais belo a civilização ocidental criou; a ideia de um Deus que se fez eterno ao nascer numa cabana sem luxo ou conforto algum, lá para os lados de Belém na Terra Santa. Nem Herodes, nem Pilatos, com a sua tropa assassina, conseguiram destruir o que Deus fez e tristemente o pecado da avareza e o egoísmo vaidoso, mais o deslumbre das coisas fáceis está quase no fim da tarefa a que se propôs; mudar para sempre a tradição cristã do nosso Natal. Quando S.Francisco de Assis, com zelo e devoção e também com alegria de viver, começou com ajuda dos artesãos da sua península itálica a recriar as cenas do presépio, estava a criar uma das obras humanas com mais força espiritual e beleza estética de toda a dita, arte Sacra. Mas foi a fé inabalável do povo, que através dos séculos interiorizou a mensagem deste menino-Deus que ao fazer-se homem, para além de denunciar a hipocrisia de alguns, deixou uma ideia de perdão incompatível com a velha e mosaico Lei de Talião. Que pregou o amor entre os homens e que depois de séculos volvidos os homens ao querer relembrar as suas obras e lições, recriaram o presépio na sua parte tangível, embora figurada e decidiu fazer deste tempo de Natal, tempo de reflexão e de amor ao próximo.
E como o meu povo o fez bem! Quando Eça escreveu a beleza que é o conto, O Suave milagre, ou Torga o que titulou apenas de Natal (Novos conto da Montanha), ambos conseguiram com a arte que Ele lhes deu, recriar todo o encanto da mensagem de Natal que preenchia o meu imaginário de rapaz, fazendo que eu achasse que o Natal ainda valia a pena.
O presépio que todos os anos se fazia debaixo do coro da Sé era o elemento que após eu escrutinar todas as figuras, me fazia crer que no ar havia festa, em que eu via no rito facial da minha gente, a alegria de saber que era tempo de nascer o Deus Menino.
Era tempo de Inverno em Trás-os-Montes e no frio cortante que o vento trazia da neve caída sobre os telhados dos palácios dos ricos e das choupanas dos pobres os homens e as mulheres deste lado quase em Espanha rezavam e cantavam como que a imitar os anjos e querubins que com "vozes argentinas engrandeciam o milagre da Natividade! (Cantavam certa cantiga/Nesta noite um querubim/E com vozes argentinas/Cantavam outros assim: Glo-o o o ooooo iória, In excelcius Deo/.
Era assim o nosso Natal, simples alegre e solidário. Quis o acaso que eu vivesse quando na minha rua a festa do Natal tinha o sentido da festa da família e que o Deus-menino, tivesse posto nas mãos da tia Mónica o presente modesto, mas que me marcou positivamente pois de tão singelo e natural foram um pouco de nozes, figos secos e amêndoas que me mantivera fiel à minha religião e ao meu povo que ontem comovidamente, constatei no jantar da U.S.R.C. de Bragança. Após havermos terminado o repasto e antes das sobremesas o Dig. Reitor informou que todos os presentes receberiam um presente muito especial: Um saco de pano estampado com motivos natalícios contendo uma boa porção de nozes das nogueiras do Prof. Octávio e que a Dona Lena usou para rechear os sacos e oferecê-los a cada um de nós num gesto lindo que me comoveu e não resistindo ao simbolismo de gesto levantei-me pedi a palavra e disse: Foi o presente mais lindo e do qual gostei mais nos meus últimos 60 anos. Devo a este maravilhoso casal o rememorar o meu, Primeiro e autêntico Natal.
Bem hajam e que o Menino-Deus vos dê o amor com que se vive melhor na entrega completa ao Espírito do "nosso" Natal.
Bragança 18 de dezembro de 2019
A. O. dos Santos
(Bombadas)
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