Os nossos reis da Idade Média e do Renascimento quiseram descentralizar o poder no campo administrativo e judicial e por isso concederam as ditas cartas de foral a muitas povoações que eram elevadas à categoria de vilas ou cidades como foi o caso de Miranda do Douro e de mais inúmeras povoações do Reino.
Foi o Rei D. Dinis, que em 18 de Dezembro de 1286 concedeu o primeiro foral a Miranda do Douro. No dia 1 de Junho de 1510, D. Manuel I concedeu-lhe o segundo foral e no dia 10 de Julho de 1545 D. João III concedeu à nobre vila a carta de cidade à qual tinham sido concedidos inúmeros privilégios pelos reis anteriores e foram concedidos outros mais, pelos reis posteriores a D. João III.
Esteve no ar, desde há umas décadas, a questão do paradeiro do pelourinho de Miranda do Douro que estava situado (assentado) na praça pública da cidade em frente do edifício manuelino da Câmara Municipal.
Os pelourinhos eram, geralmente, construídos na praça pública como é o caso de Miranda do Douro, Bemposta ou junto das igrejas como é o caso dos pelourinhos de Castro Vicente, Azinhoso e Penas Róias e outros, junto do castelo, como é o caso de Bragança, junto das catedrais ou das casas senhoriais e conventos
O primeiro documento histórico que nos fala do pelourinho de Miranda do Douro é uma gravura de Duarte de Armas, datada do princípio do século XVI. Este autor mostra o pelourinho, colocado, junto à Casa da Câmara, em forma de gaiola, mas a parte simbólica, esculpida no cimo do fuste da coluna e traçada, segundo a planta ordenada pela Câmara, como era costume, devia ter alguns símbolos e um deles era a esfera armilar em granito que ainda se conserva no Museu da Terra de Miranda o que nos leva a crer que o pelourinho foi reformado no tempo de D. Manuel I, como aconteceu com outros.
Precisamente, com a data do dia 10 de Junho de 1612, aparece-nos o primeiro documento escrito sobre o pelourinho de Miranda do Douro. É uma carta na qual o Rei Filipe III de Espanha e (II) segundo de Portugal responde a um pedido do vereador Francisco do Rego sobre a mudança do pelourinho. O monarca diz textualmente: “Me pareceu que não havia causas nenhumas para se mudar (O pelourinho) para outra parte visto, como sempre esteve na praça e lugar em que está”.
Em 1716, como o monumento estivesse em perigo de ruir, foi Gonçalo Afonso, mestre pedreiro da cidade de Miranda quem arrematou a obra de restauro do monumento, no dia 14 de Agosto do mesmo mês, pela quantia de 9$600 reis. O mestre pedreiro obrigava-se a reformar todo o assento em forma que ficasse seguro e direito o Pelourinho de pedra e cal e betume de cal”.
Com este restauro se aguentou o vetusto monumento até ao dia 14 de Janeiro de 1859. Nesta data, citando A. Herculano, “os economistas da alavanca” “e filósofos de picareta”, segundo um documento daquele mesmo ano de 1859, no dia 14 de Janeiro de 1859 foi destruído o Pelourinho da Praça ,dizem, que por ordem da Câmara para ser mudado para outra parte.
Do velho Pelourinho de Miranda do Douro ficou uma única pedra que se encontra no Museu da Terra de Miranda e que fazia parte do conjunto arquitectónico e escultural da parte superior do monumento. Este resto, que é uma esfera armilar esculpida, em granito, em alto-relevo, indica que o Pelourinho foi reformado, no tempo do Rei Dom MANUEL I, época em que a esfera armilar aparece esculpida na maior parte dos monumentos. Não podemos afirmar que a outra pedra com outra esfera esculpida com a parte superior lisa e a inferior com ondas seja da época filipina. O Pelourinho de Miranda do Douro era muito semelhante ao de Algoso com uma diferença: o fuste do pelourinho de Algoso é ornamentado com rosáceas esculpidas em todo o fuste que é de forma quadrada. O fuste do Pelourinho de Miranda é uma coluna de forma cilíndrica direita completamente liso que é o pelourinho original da Idade Média, com certeza algum tempo depois de 18 de Dezembro de 1286, data do primeiro foral concedido por Dom Dinis. A parte do fuste que resta mede 2,95m de altura, uma parte e a outra 0,80 cm e tem de perímetro 0,90 cm. Guardaram algumas pedras e outras deixaram-nas ao abandono até que algum curioso as recolheu e as doou ao Museu da Terra de Miranda onde hoje se encontram guardadas.
Deixamos assim desfeito o mito do desaparecimento do Pelourinho de Miranda.
Houve que quisesse afirmar que o fuste da cruz do Espírito Santo, colocada, actualmente, do lado Ocidental da cidade, junto à muralha, poderia ser uma parte do Pelourinho, mas esta afirmação é insustentável, porque o fuste da cruz é muito ténue para poder aguentar o peso da gaiola e da esfera armilar e, com certeza, outros elementos iconográficos que compunham o velho monumento que os “liberalões” do tempo – 1859 – quiseram destruir, porque era contra os ideais simplistas imbuídos de ideias republicanas da política da época.
Fica desfeita a curiosidade daqueles que deram a “novidade “ de que o Pelourinho fosse lançado a rodar pela encosta da Rua da Costanilha ou estivesse a servir de tranqueiro de alguma cuba de vinho. É peça comprida de mais para rodar pela Rua da Costanilha e nada própria para servir de suporte de cubas.
P.S.
Neste dia 10 de Dezembro de 2019, posso acrescentar com toda a probabilidade, que o Pelourinho de Miranda ainda está na cidade. O fuste que está a servir de suporte de uma viga colossal numa casa particular da cidade, é sem dúvida, o fuste do antigo Pelourinho de Miranda, bem como outras pedras trabalhadas que se encontram na mesma habitação local. Tratando-se da família influente que era naquela altura, nada repugna que o tenham recolhido para o efeito de suporte, e que suporte! Vejam-se as figuras que a seguir apresentamos.
Este artigo foi publicado, salvo o erro, no Semanário Nordeste Transmontano com a data de 6 de Janeiro do ano de 2006. Tenham o trabalho de ver o número em que foi publicado e não inventem. É pena que tivessem trabalhado sete anos e não encontrar nada sobre o pelourinho de Miranda do Douro nem do de Mirandela, mas isso acontece, mesmo, aos bons investigadores. Se quiserem apresento as cópias dos documentos originais que me serviram para a elaboração deste artigo. Foi escrito no dia 6 de Janeiro de 2006, dia de Reis. E este acrescento é do dia 10 de Dezembro de 2019.
Miranda do Douro, 10 de Dezembro de 2019
António Mourinho
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