Foto: Olímpia Mairos |
“Da minha idade nunca vi tamanha seca”, lamenta a senhora de cabelos brancos e rosto sereno, mergulhando o pensamento no baú das memórias para dizer que “sempre houve uns anos mais secos do que os outros, mas como este nunca”.
“Isto está mau, muito mau. Se não fossem os bombeiros, morríamos à sede. Nem tínhamos água para fazer o comer. Nem para nada…”, conta Celeste. E prossegue: “os quintais e os jardins estão secos, até corta mesmo o coração ver isto tão seco. É tão triste, quando isto aqui era tão bonito”.
Poupar é agora “mais que obrigatório”. Celeste conta que, em casa, poupa em tudo e até o banho é mais rápido do que o habitual. “Temos que poupar a água, como em tempos se poupava o azeite para que nunca faltasse na almotolia”, exemplifica.
Urbino António, 80 anos, também não se lembra de um “ano assim”.
“Aqui não faltava a água. Este ano é que está uma coisa nunca vista”, lamenta o octogenário, realçando que, apesar de não haver água na aldeia, os bombeiros nunca a deixaram acabar”.
“Vem o camião todos os dias e, às vezes, até mais do que uma vez ao dia, e vazam a água na ‘mãe de água’ que temos lá cima e de lá vem para nossas casas”, conta.
João, 60 anos, está por perto e envolve-se na conversa para dizer que “a água nunca faltou nas torneiras, nem no lar da aldeia, mas vai faltando para os animais, coitadinhos”. “Este é um ano muito escravo, mesmo os animais quase não têm água para beber”, conclui.
Francisco Rodrigues, 38 anos, está por trás do balcão da associação da aldeia. Conta à Renascença que a água ainda “não faltou para tirar café, mas vai faltando para os animais” e “o que vale é que os agricultores se ajudam uns aos outros e têm recolhido água em alguns poços. Trazem a água em baldes ou em cisternas e é assim que vão dando de beber ao gado”, diz.
Ao percorrermos a aldeia, onde se situa a basílica menor de Santo Cristo, é notória a escassez de água. Os espaços que antes eram verdes estão agora secos e as torneiras dos diversos fontenários não deitam água.
Em Outeiro vivem cerca de 80 pessoas. Na localidade existe também um lar de terceira idade.
Vimioso vive situação “muito dramática”
O concelho de Vimioso, no Nordeste transmontano, é o que sente mais a falta de água. O rio Maçãs e outros pontos de captação que abastecem o concelho estão praticamente secos. O presidente da Câmara de Vimioso, Jorge Fidalgo, diz que a falta de água é "muito dramática".
“Assumo que estamos a viver uma situação muito dramática no que respeita ao abastecimento de água ao concelho”, afirma o autarca transmontano.
Desde finais de Setembro que há um transporte diário de cerca 600 metros cúbicos de água por dia, da barragem de Veiguinhas, em Bragança, para servir as localidades de Argozelo, Carção, Santulhão e Matela, “que é praticamente metade do concelho”.
No resto do concelho, que é abastecido pelo rio Angueira, ainda vai havendo água para consumo, mas com regras já impostas e uma maior fiscalização por parte dos serviços municipais para evitar o desperdício.
“Emitimos um aviso à população que, em situações excepcionais, a distribuição de águas poderá ser limitada apenas para consumo doméstico e para a pecuária e vamos encetar uma fiscalização muito rigorosa”, conta o autarca.
O presidente da autarquia teme mesmo que os outros sistemas abastecimento que estão dispersos pelas freguesias do concelho, como furos artesianos, possam entrar em colapso e não ter água para o abastecimento público.
D. Celeste admite que nunca viu uma situação de seca como a que se vive no concelho. Foto: Olímpia Mairos/RR |
O autarca lamenta que apesar de existirem “dois projectos licenciados para a construção de represas, uma no rio Maçãs, no montante de mais de um 1,5 milhões de euros, e outra no rio Angueira, no valor de cerca de 700 mil euros, o Governo nunca abriu avisos para o benefício de fundos comunitários para investir neste tipo de equipamento”.
Olímpia Mairos
Rádio Renascença
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