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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 14 de maio de 2021

A MORTE DE MOUSTAPHA

Por: Humberto Pinho da Silva 
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

Hoje, se me permitem, vou tentar condensar, por palavras minhas, curioso livro, que narra a triste história de rafeiro. Cachorrinho que deambulava, vegetando faminto, pelos velhos becos da velha cidade do Havre.
Seu nome era Moustapha; e o autor da obra: Adolfo Destryes, escritor do século XIX.
Moustapha era solitário, pobre e infeliz, maltratado pelos homens e escorraçado pelas certeiras pedradas do garotio.
Uma noite, junto a fontanário, depara com Roberto, jovem nada caritativo, mas embriagado, como era o caso, tinha rasgos de generosidade.
Roberto olha compassivo, o cachorrinho, e movido de ingente compaixão, lava-lhe carinhosamente as sangrentas feridas, que alastram pelo macerado corpo; e cobre-as com trapos que encontra junto ao velho fontanário.
Estonteado pelo sono, toldado pelo álcool, adormece profundamente.
Despertado pela ténue luminosidade matutina; acorda estremunhado. Para espanto seu, verifica que o animal, permanece aninhado a seus pés.
Roberto, brutalmente, enxota-o, pontapeando-o com agressividade.
Moustapha, angustiado, atira-lhe olhar tão meigo, tão enternecido, tão compungido e doce, que num ímpeto gesto de bom samaritano, o moço leva-o para casa, carinhosamente aconchegado no regaço.
Foram ditosos os anos que viveram em mútua companhia. Moustapha era grato ao benfeitor, e não se cansava de lhe lamber as calejadas mãos.
Mas hedionda mazela de pele recobre novamente, o corpo do bicho; o cachorrinho torna-se asqueroso.
Roberto não o quer em sua casa. Ainda, num rasgo de piedade, pensa leva-lo ao veterinário, mas na cidade, nessa remota época, não havia.
Resolve, então, matá-lo.
Numa fria e caliginosa noite, enquanto a cidade dormia sob o negro manto da cerração, suspende-lhe pesada pedra ao pescoço, e lança-o impiedosamente, ao rio, nas águas geladas e turvas do Sena.
Moustapha, a exemplo de velhos mártires, em circo romano, sofre atrozmente. Chora tristemente, mas não solta gemido, nem resiste ao algoz que ama.
No gesto de o lançar nas águas correntes, cai-lhe o boné ao rio.
Desesperado tenta retirá-lo, mas no negrume da noite, a tentativa foi vão.
Desalentado, regressa a casa, mais abatido pela perda do boné, que remorsos da barbaridade.
Mal havia decorrido uma hora, sente mexer-lhe levemente na porta. Levanta-se estremunhado, e para surpresa sua, era Moustapha, com o boné entre os dentes.
O cão estava em estado lastimoso, enlameado, ensanguentado e fétido.
Num gesto autómato de gratidão, abraça-o calorosamente. As lágrimas escorrem-lhe pela face tostada.
Arquejando, o animal solta estridente berro, numa convulsão estertorante.
Moustapha morre. De alegria? De tristeza? Nunca se saberá.

Moral da história: os animais são, quantas vezes, bem melhores, que os humanos.

Humberto Pinho da Silva
nasceu em Vila Nova de Gaia, Portugal, a 13 de Novembro de 1944. Frequentou o liceu Alexandre Herculano e o ICP (actual, Instituto Superior de Contabilidade e Administração). Em 1964 publicou, no semanário diocesano de Bragança, o primeiro conto, apadrinhado pelo Prof. Doutor Videira Pires. Tem colaboração espalhada pela imprensa portuguesa, brasileira, alemã, argentina, canadiana e USA. Foi redactor do jornal: “NG”. e é o coordenador do Blogue luso-brasileiro "PAZ".

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