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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2025

UM SACO PRETO E UMA CANETA AZUL

Por: José Mário Leite
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)

Na noite do passado dia 19 de fevereiro, o pano do palco do auditório Emílio Rui Vilar da Culturgest estava corrido (não iria subir para dar início ao espetáculo, nem haveria de descer, no final, tal como acontecera há alguns anos atrás, no Centro Cultural de Belém, com uma outra peça de Tiago Rodrigues, “Catarina e a beleza de matar fascistas”). Em cena, uma enfermeira que, pouco tempo depois se descobriria ser belga, da região flamenga, deambula entre uma cama de hospital e imponentes penedos “trazidos” do nordeste transmontano onde se alpendorara um outro leito articulado.
A magia inerente a toda esta encenação revela-se, logo desde o início pois, subitamente, o burburinho da plateia foi substituído por um silêncio reverente e atento sem que se visse ou ouvisse qualquer sinal, a não ser a perceção de que a peça iria começar. A personagem, apelidada como a “Pior Enfermeira do Mundo” dirige-se à plateia, em holandês, descrevendo os últimos dias, no Hospital Amadora-Sintra de um doente terminal, o moncorvense Rogério Rodrigues. Junto ao leito vazio ficou, num saco preto um caderno e uma caneta azul. Fora uma exigência do jornalista e escritor do Peredo dos Castelhanos para ocupar os seus dias a escrever uma reportagem do dia a dia da enfermaria hospitalar, e que o seu filho mais velho, Tiago, teria satisfeito… parcialmente pois que, por distração, trocara a cor da caneta que, devia saber, teria de ser preta e não azul. Quando, finalmente, corrigindo o erro, regressa com a esferográfica repetidamente reclamada, encontra a cama vazia e, no saco negro, um bloco cheio de riscos que, vagamente, poderiam assemelhar-se a estranhas letras de um texto, quiçá, vários desenhos ou expressões artísticas. Provavelmente as derradeiras tentativas do escritor de registar mais uma das suas reconhecidas crónicas jornalísticas.
O mistério seria desfeito com um outro caderno, paralelo, ditado pelo doente e escrito por uma misteriosa Teresa das Canções (exemplarmente interpretada por Manuela Azevedo que arrepiou todos os presentes a cantar Jacques Brel) não a Teresa Torga que o Rogério descrevera quando em maio de 1975 se despira na via pública às quatro horas da tarde e que Zeca Afonso cantara em composição com esse nome, incluída no álbum “Com as minhas tamanquinhas”, mas uma outra Teresa, conhecida do Tiago e que fazia voluntariado no Hospital, onde conversava com os doentes, ouvia-os, fazia-lhes algumas vontades (como a de escrever o que eles já não eram capazes) e cantava-lhes, deixando uma mensagem diária de despedida: haverá sempre canções ao fim da tarde que, para remate (sempre com o pano corrido), deixa em aberto a dúvida, desde as primeiras cenas – será uma pergunta ou uma promessa?
Poucos dias antes, em Torre de Moncorvo, o Rogério foi homenageado por um conterrâneo e amigo: Paulo Salgado, que apresentou o seu livro “O que reconheço em Paris Sou Eu” onde reuniu cartas e poemas que o jornalista lhe dirigiu.


José Mário Leite
, Nasceu na Junqueira da Vilariça, Torre de Moncorvo, estudou em Bragança e no Porto e casou em Brunhoso, Mogadouro.
Colaborador regular de jornais e revistas do nordeste, (Voz do Nordeste, Mensageiro de Bragança, MAS, Nordeste e CEPIHS) publicou Cravo na Boca (Teatro), Pedra Flor (Poesia), A Morte de Germano Trancoso (Romance) e Canto d'Encantos (Contos), tendo sido coautor nas seguintes antologias; Terra de Duas Línguas I e II; 40 Poetas Transmontanos de Hoje; Liderança, Desenvolvimento Empresarial; Gestão de Talentos (a editar brevemente).
Foi Administrador Delegado da Associação de Municípios da Terra Quente Transmontana, vereador na Câmara e Presidente da Assembleia Municipal de Torre de Moncorvo.
Foi vice-presidente da Academia de Letras de Trás-os-Montes.
É Diretor-Adjunto na Fundação Calouste Gulbenkian, Gestor de Ciência e Consultor do Conselho de Administração na Fundação Champalimaud.
É membro da Direção do PEN Clube Português.

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