A vida e a obra de António Maria Mourinho são o manifesto da sua paixão no seu expoente máximo pelo entusiasmo das obras pastorais, e da sua sagaz curiosidade por todos os assuntos históricos, linguísticos, literários e culturais da Terra de Miranda. Impulsionador incansável, na recolha do teatro rural mirandês, e a representá-lo com os seus paroquianos, a reunir as danças e as músicas mirandesas, a criar o Grupo Folclórico de Duas Igrejas, a preservar e desenvolver poesia em mirandês, entre outras atividades, que lhe são icónicas na sua forma de estar e vivenciar o mundo. Revelou sempre uma persistência com amor intenso à investigação arqueológica, etnográfica, histórica, folclórica e linguística, na zona do Nordeste Transmontano, onde unificou a memória coletiva, tornando-a vivaz e num processo universal.
Em 1930, principiou os seus estudos, no Seminário Diocesano de Bragança, onde concluiu o Curso de Teologia, com distinção, em 29 de junho de 1941. No ano letivo seguinte, começou a exercer as funções de professor de História de Portugal, na mesma instituição, até ser nomeado pároco. No ano de 1942, foi nomeado padre na freguesia de Duas Igrejas, em Miranda do Douro, onde ficou durante quarenta e dois anos. Foi igualmente em Novembro 1942, que se estreou literariamente, em Lisboa, ao ler dois poemas autógrafos “Nuossa Alma i Nuossa Tiêrra” e “Las Siete Armanas”, na sala “Portugal” da Sociedade de Geografia, na festa do Dia de Miranda do Douro, promovida pela Casa de Trás-os-Montes de Lisboa. A partir dessa data, não mais parou de investigar e de apresentar os resultados da sua pesquisa. No ano seguinte, publicou os dois poemas acima citados e um outro intitulado “Amiyos del Sou Amiyo” no livro de Atas do II Congresso Transmontano. Dois anos passados, publicava no volume IV da Revista de Portugal, o seu primeiro trabalho sobre a língua mirandesa: Subsídios Para Um Tratado de Dialetologia Portuguesa – O Dialeto Mirandês e Expansão e Vitalidade do Mirandês (volume IV, Série A). Este primeiro trabalho teve continuação em vários outros publicados na mesma revista: Expansão Literária do Mirandês (volume V), a primeira parte de uma Gramática Mirandesa (volume V), três estudos sobre as Origens do Mirandês (volume VI, VII, IX). Foi em 1945, nas Comemorações do IV Centenário da elevação de Miranda a Cidade, que legitimou o seu Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas. Fez de Duas Igrejas um centro de difusão da Cultura Mirandesa. Dirigiu inumeráveis atuações do Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas, promovendo-o ao mais alto nível. Levou a riqueza cultural da Terra de Miranda aos quatro cantos do mundo (Espanha, França, Alemanha, Suíça, Áustria, Angola, Estados Unidos, Canadá, Macau). O grupo manteve-se em atividade e sob a sua direção durante mais de quarenta anos. António Maria Mourinho participou em incontáveis festivais e certames, tendo sido premiado quer a nível nacional quer a nível internacional.
Recebeu o Prémio Europeu de Arte Popular de 1981, a 12 de julho, em Duas Igrejas. Mourinho alcançou com o Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas uma assombrosa projeção no país e no estrangeiro.
Desde 1945 até 1992, para além das múltiplas participações nacionais e internacionais do Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas, foi convidado a cooperar em diversas realizações cinematográficas: “Trás-os-Montes”; “Festa da Primavera”; “Aqui é Portugal”; “Rapsódia Portuguesa”, tendo também gravado dois discos de danças e cantares: “Alvorada” e “Melodia”. Em 1945, foi co-fundador do movimento cultural Ressurgimento Mirandês com o conselheiro António Carlos Alves. Foi no seguimento da referida associação cultural que António Mourinho sonhou o Museu da Terra de Miranda, criado em 1982, pelo decreto-lei n.º 136/82, de 23 de abril. Foi o seu fundador e o primeiro diretor, tendo ocupado esse cargo até 1995. Recuando um pouco no tempo, em 1948, conseguiu a proeza de reunir 22 mil pessoas para assistirem ao Auto da Mui Dolorosa Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo de Francisco Vaz de Guimarães. Por volta da década de 50, os interesses de Mourinho desviam-se para áreas mais ligadas à cultura do que à língua mirandesa.
Em 1960, retoma o estudo da língua mirandesa com o trabalho – Diversidades Subdialectais do Mirandês. A partir de 1956, Mourinho participou em inúmeros congressos de História, Etnografia, Arqueologia, Folclore e Ciências Sociais, tendo publicado vários trabalhos sobre os referidos assuntos. Em 1961, publicou, desta vez, uma obra literária – Nuossa Alma i Nuossa Tierra, com poesia mirandesa. Em 1963, apresentou o seu primeiro estudo sobre literatura popular mirandesa – Apontamentos sobre o Conto Popular Mirandês, no Congresso Internacional de Etnografia de Santo Tirso. De 1959 e até 1970, usufruiu de bolsas de investigação, nos Arquivos Espanhóis de Madrid, Compostela, Leão, Simancas e Zamora, nos quais investigou, sobretudo, duas etapas precisas da história de Miranda do Douro, a Idade Média e o século XVIII. As pesquisas realizadas facultaram-lhe a elaboração de uma desenvolvida obra, constituída por mais de meia centena de títulos, para além de pequenos estudos publicados em inúmeros jornais e revistas.
Em 1970, após cerca de trinta anos consagrados à investigação, António Maria Mourinho inscreveu-se, na Licenciatura em História, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, tendo terminado a mesma, em 1975, com 16 valores.
Entre os anos de 1962 e 1977, a par da atividade religiosa, cultural, literária dedicou-se, igualmente, à atividade docente, tendo lecionado as disciplinas de Religião e Moral, Português, Educação Musical e História, quer no Ensino Básico quer no Ensino Secundário. Entretanto, já na década de noventa, abandonou a vida eclesiástica e contraiu matrimónio, continuando a ser para os amigos o “Padre Mourinho”. António Maria Mourinho recolheu, ao longo de toda a sua vida, surpreendentes testemunhos materiais que representam o seu passado pessoal e, simultaneamente, o passado coletivo da Terra de Miranda e da Região de Trás-os-Montes. Foi, na verdade, o maior defensor da Cultura, Literatura e Língua Mirandesas por todo o mundo e, igualmente, um dos grandes obreiros da oficialização da Língua Mirandesa.
Obras principais: Santa Maria Nossa Terra; O Culto dos Mortos no Nordeste Português, (1953); Galandun; Malha de Cereais na Cardenha e Canção dos Malhadores; Pingacho: Bailado Mirandês de Paradela; Hossonápio: Teatro Rural em Trás-os-Montes; A Dança dos Paulitos; Grupo Folclórico Mirandês de Duas Igrejas, (edição revista); Nossa Alma i Nossa Tierra: Poemas em Mirandês e Notas sobre a Vida e Arte da Terra Mirandesa; Documentos Medievais sobre Portugal Existentes em alguns Arquivos de Espanha; Guerra dos Sete Anos ou Guerra do Mirandum, (deste trabalho foi extraído o guião para o filme A Guerra do Mirandum; O Abrigo Rupestre de «Solhapa^em Duas Igrejas; Ara a Jupiter Depulsori Dedicada por um Veterano da Legio VII Gemina; Fundação do Castelo de Algoso; Coreografia Popular Transmontana: Moncorvo e Terra de Miranda; Pinturas Esquemáticas de Penas Roias, Terra de Miranda do Douro; «Scôba Frolida à Agosto»: Liênda de Nossa Senhora del Monte de Dúes Eigreijas; Cancioneiro Tradicional e Danças Populares Mirandesas; Vida e Obra do Abade de Baçal; Epigrafia Latina aparecida entre Sabor e Douro e Falecimento do Abade de Baçal.
Fonte: Arquivo Distrital de Bragança
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