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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Desertificação humana ameaça Trás-os-Montes e Alto Douro

Escolas encerradas, aldeias-fantasmas, campos abandonados e uma população envelhecida. Nunca como agora as marcas da desertificação humana foram tão nítidas em Trás-os-Montes e Alto Douro. A região continua a perder gente a um ritmo galopante e, de acordo com as estimativas do Instituto Nacional de Estatística, em 2010, não terá mais do que 372 mil habitantes, ou seja, quase metade da população existente em 1960.
Quem visitar Vila Real ou Bragança num qualquer dia de semana terá dificuldades em acreditar que a região transmontana está a esvaziar-se de gente. As duas cidades apresentam um bulício cosmopolita, o trânsito é intenso e as ruas estão cheias de homens e mulheres, na sua maioria jovens. Mas esta imagem apenas reflecte um lado da realidade: nos principais centros urbanos de Trás-os-Montes e Alto Douro, a população residente está a aumentar. 
O outro lado é que é trágico: as vilas e as cidades estão a crescer à custa do despovoamento das aldeias. 
De acordo com estimativas do Instituto Nacional de Estatística (INE), em Dezembro de 1997, residiam em Trás-os-Montes e Alto Douro 422.670 habitantes - no censo de 1991, a população residente era de 496 mil habitantes. A manter-se a tendência regressiva actual, a região vai continuar a perder gente nos próximos anos e, em 2010, terá apenas 372 mil habitantes, ou seja, quase metade da população existente em 1960. Dentro de três décadas, poderão residir em Trás-os-Montes e Alto Douro cerca de 250 mil pessoas.Refira-se que a área considerada - cerca de 15 por cento do território nacional - corresponde às unidades territoriais Alto-Trás-os-Montes e Douro (ver mapa), integrando esta alguns concelhos que pertencem aos distritos de Viseu e da Guarda. Em contrapartida, a primeira unidade não integra os concelhos de Ribeira de Pena e Mondim de Basto, pertencentes ao distrito de Vila Real. 
Se se considerar apenas os concelhos dos distritos de Vila Real e de Bragança, a população residente em Dezembro de 1997, segundo o INE, era apenas de 380.360 habitantes.Só um novo censo populacional poderá retratar a verdadeira dimensão do fenómeno da desertificação humana em Trás-os-Montes e Alto Douro e aferir do grau de realismo das projecções que se vão fazendo. Mas bastaria atentar nas inúmeras escolas primárias que vão encerrando um pouco por toda a região, nas aldeias que desapareceram, nos campos e florestas que vão sendo abandonados, para se ter a certeza de que a situação requer as maiores atenções. 
Esta convicção sustenta-se, de resto, na frieza dos números, que também não deixam dúvidas quanto ao acelerado envelhecimento da população e à queda das taxas de fertilidade. Como os saldos fisiológicos são altamente negativos, mesmo que se consiga fixar na região todos os que aí vão nascer, a população transmontana continuará a diminuir nos próximos anos. E a envelhecer.Em 1981, havia no Alto-Trás-os-Montes 48 pessoas com 65 anos de idade ou mais por cada 100 habitantes com menos de 15 anos. Em 1995, esse valor era já de 118 idosos por cada 100 pessoas com menos de 15 anos. Como sublinha o géografo Saldanha Martins, em Trás-os-Montes e Alto Douro vai continuar "a ser cada vez mais fácil encontrar uns parceiros de mesa para o chincalhão, entre os grupos de reformados, do que constituir duas equipas, entre os mais jovens, para dar uns pontapés numa bola". 
A desertificação humana repercute-se em todos os domínios do território e a sua minimização exige medidas rápidas, como alerta Mendes Baptista, vice-presidente da Comissão de Coordenação da Região Centro e autor de um estudo sobre o desenvolvimento do interior. "Se não formos capazes de reter no interior a geração que está agora a chegar à idade activa, poderemos perder em definitivo a oportunidade", diz. Como ponto de partida, sustenta aquele técnico, o Estado central tem de deixar de considerar o interior "como um espaço marginal" a cargo dos contribuintes e passar a encará-lo como um "espaço de oportunidades". 
Até agora, os sucessivos governos têm privilegiado os principais centros urbanos do litoral na afectação dos recursos públicos - com esta política, as assimetrias, em vez de diminuírem, agravaram-se. No entanto, hoje parece existir um consenso político em torno da ideia de que é preciso discriminar positivamente o interior, quer através de incentivos fiscais e financeiros ao investimento e à fixação de residência, quer estimulando com benefícios sociais o aumento da natalidade. Sem esquecer um desafio essencial: a aposta no reforço dos índices de urbanidade das vilas e cidades, porque, como frisa Gaspar Martins Pereira, investigador da Universidade do Porto, "as pessoas saem do interior não apenas por razões económicas, mas também por razões culturais, atraídos pela qualidade de vida do meio urbano". No fundo, sublinha Jorge Nunes, presidente da Câmara de Bragança, trata-se de fazer dessas vilas e cidades "um conjunto de focos de resistência à desertificação", uma vez que as aldeias quase só já conseguem reter os mais velhos.Mas é na ruralidade que pode estar o futuro do interior e de Trás-os-Montes, agora que o campo começa a ser visto "como um símbolo de liberdade, paisagem, beleza e saúde", diz Artur Cristóvão, catedrático da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. 
Mais do que mero fornecedor de alimentos, o espaço rural é hoje, acrescenta Cristóvão, um "espaço multifuncional", com um espectro largo de recursos, "que inclui antigos, actuais e novos produtos agrícolas e agro-industriais, paisagem, fauna e flora, rios e albufeiras, montanhas e vales, caça e pesca, rochas e minerais, águas mineromedicinais, património arqueológico e histórico, arquitectura popular, tradições, artesanato, gastronomia, linhas férreas antigas, solares e casas rurais, miradouros, parques e reservas naturais, feiras, festas e romarias, música, teatro e poesia popular" - riquezas em que Trás-os-Montes é fértil. O desafio está na sua valorização, que é ainda incipiente.

Pedro Garcias
Jornal Público 19/12/1999

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