Um morro circular, protegido do lado de Sul pelo vale profundo do pequeno Rio Fervença, oferecia possibilidades excecionais de proteção. Bragança estendeu-se no sopé da eminência fortificada e entra assim, pode dizer-se, na categoria das cidades duplas.
(Vergílio Taborda, Alto Trás-os-Montes, 1932)
Bragança Medieval (Desenho de Duarte d’Armas) Planta antiga da Cidade de Bragnça, com os limites da “Vila“ e da “Cidade” |
Estas obras ofereciam segurança mas tinham grandes implicações pelos encargos financeiros que representavam e ainda pelos constrangimentos que exerciam, de forma mais ou menos duradoura, sobre o espaço urbano. Contudo, na altura daquela invasão, já o grande perímetro defensivo apresentava chagas de alguma importância, as quais o exército castelhano se empenhou em aumentar com o intuito de anular o seu préstimo militar. Ainda assim, a linha das barreiras e estacadas continuaria a cingir uma treliça urbana que só nas duas centúrias seguintes aceitaria alterações significativas à sua relativa estabilidade.
Num tempo em que os valores do Iluminismo progrediam em toda a Europa, alguma cartografia mostra as barreiras das cidades a perderem o sentido por terem variado as finalidades que ditaram a sua construção. Em todo o caso, imaginamos que o seu estado de ruína poderia ser fonte de inquietações em espíritos temerosos de algum dia poderem ser confrontados com os custos inerentes a orientações reedificadoras. Mas, progressivamente, as muralhas passaram a ser olhadas pela maioria dos contemporâneos como construções anacrónicas, fonte de problemas diversos e um obstáculo ao crescimento da cidade. Daí o seu abandono, a ruína e o investimento na destruição das cinturas defensivas, tanto mais que à apropriação do espaço libertado se juntava a cobiça pelos materiais que ficavam disponíveis e capazes de reutilização. Assim se esboçaram novos eixos de circulação e a paulatina formação de novas fiadas de casario.
Contudo, importa sublinhar que a Cidade de Bragança, nos finais dos tempos modernos, dispunha no seu âmago de espaços livres que em algumas conjunturas podiam dar saída a eventuais necessidades de crescimento.
Por esta razão – ao contrário do que aconteceu na parte final do século XVII –, não se identificaram evidências de quaisquer tipos de pressão que obrigassem o casario a ocupar os solos localizados no exterior das antigas muralhas.
O relativo desafogo espacial podia não ser da índole do que, durante a segunda metade do século XVIII, possibilitou que o edifício do Paço Episcopal tivesse evoluído no sentido linear, definindo grandemente o alinhamento da antiga Rua do Espírito Santo. Mesmo o crescimento em altura num arruamento de grande importância comercial como era a Rua Direita, não saiu dos limites da moderação, facto que permite a conclusão de que nestes dois arruamentos, os mais importantes da Cidade, o perfil da casa burguesa só muito vagarosamente definiu os seus valores, assumindo-os ao longo do século XIX e afirmando-os nas décadas iniciais do seguinte.
Por outro lado, a definição de Rafael Bluteau para a “praça” – elemento essencial no urbanismo ocidental – continuaria a ter validade. Historicamente, o crescimento urbano de Bragança e a inscrição de novas transformações sempre foram acompanhadas pela afirmação na hierarquia urbana de um novo rossio ou largo que se situava sempre na adjacência de uma construção religiosa significativa. A largueza de espaço devia ser capaz de responder às principais necessidades do quotidiano mas também se lhe exigiam aptidões para ocorrências e funções que iam da feira ao sermão e à turbulência dos ajuntamentos em datas festivas. Quando o pulsar evolutivo era fortemente orgânico, a praça afirmou-se com naturalidade como o espaço estruturante do conjunto citadino.
Por estas razões, faz sentido enfatizar o papel da Praça da Sé, e a sua articulação com a Rua Direita e com a antiga Rua do Espírito Santo. Sendo certo que à medida que a Praça da Sé, beneficiando também do facto de ser complementada pelo Rossio das Eiras do Arcebispo, ganhava importância para disputar o prestígio que laureava a Praça de S. Vicente, a Cidade só muito lentamente se afastou das zonas mais antigas porque, como a construção do Banco de Portugal iria comprovar, os laços vivenciais com essas áreas continuavam muito fortes.
Antiga agência do Banco de Portugal em Bragança |
Assim, para se verificar uma significativa alteração das lentas repetições, seria necessário esperar pela primeira década do século XX, quando o acontecimento da chegada do comboio a Bragança aprofundou a compreensão sobre alguns dos ideais de progresso que com tanta insistência campeavam no discurso oitocentista sobre a coisa pública. Ao mesmo tempo, abriu-se uma nova fase na expansão urbana.
Neste capítulo, para além das transformações urbanas sentidas por Bragança na Época Contemporânea, iremos abordar ainda a arte urbana de Bragança ao presente, através da sua escultura.
Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa
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