Havia um rapaz que disse para a mãe:
- Minha mãe, vou moirar.
E a mãe diz-lhe assim:
- Vai, meu filho.
- Queres a minha bênção, ou metade de um pão?
E o rapaz diz para a mãe:
- Eu quero a sua santa bênção.
E o rapaz foi ter a casa de um rico. Quando bateu à porta, diz ele assim:
- Querem-me aqui para criado?
Estava lá um velhote e disse-lhe:
- Podes ficar, rapaz, que eu vou-me embora. Mas olha: Nesta bacia de água nunca mexas.
O teu trabalho é pouco. É só tratar de três cavalos. Estão ali àquele canto três aguilhadas. Nunca lhe toques, que eu estou aqui há bastante tempo, e ainda lhes não toquei. Se pensares em te enforcar, puxa por aquela corda, que está naquele telhado.
E o velho foi-se embora.
O rapaz esteve lá muito tempo, sem mexer na água. Um dia, o rapaz disse:
- Para que quero aqui esta água? Vou-me lavar nela. Ao mesmo tempo que deitou com as mãos a água pela cabeça, ficou-lhe o cabelo todo dourado. Em seguida deu um pontapé nas aguilhadas, dizendo:
- Quero ver o que daqui vai sair. Ao mesmo tempo que o fez, saem--lhe três gigantes.
- Agora, pelo pouco, vou-me enforcar. E puxou pela corda que estava presa à trave.
Encheu-se o chão de dinheiro.
Depois disseram--lhe os três gigantes:
- Rapaz, tens que te ir embora, porque nos desencantaste.
Um dos gigantes disse ao rapaz:
- Se um dia te vires aflito, basta-te dizer:
- Valha-me aqui o meu cavalinho de cobre.
O segundo diz-lhe também:
- Se precisares de mim, diz:
- Valha-me o meu cavalinho de prata.
Depois, o terceiro:
- Pede-me o que tu quiseres, que te atenderei, dizendo:
- Valha-me o meu cavalinho de ouro.
Depois, o rapaz foi-se embora. Seguia por um vale. Viu um carneiro morto. Abriu-o e tirou-lhe a bexiga, e pô-la na cabeça para que lhe não vissem o cabelo dourado.
Depois foi andando até que foi ter ao palácio do rei. Deu umas voltas em redor do palácio do rei, até que viu o jardineiro. Ofereceu-se para criado. O jardineiro aceitou o rapaz para ajudante.
O rapaz, quando lhe apetecia, tirava a bexiga da cabeça.
Até que um dia, a princesa mais nova o viu. Apaixonaram-se um pelo outro.
O rapaz mandava-lhe todos os dias um raminho de flores.
Um belo dia, o rei pensou em casar as suas filhas e fez umas cavalhadas.
O jardineiro, como era amigo do rapaz, disse-lhe assim:
- Amanhã são as cavalhadas da filha mais velha do rei. Não queres vir?
O rapaz respondeu-lhe:
- Antes quero ficar ao sol no jardim.
Assim que o velho saiu, o rapaz pediu ao seu encanto:
- Valha-me aqui o meu cavalinho de cobre.
E pediu um bom cavalo e roupa ao consoante, para conquistar a filha mais velha do rei. O rapaz, quando entrou nas cavalhadas, tudo ficou admirado e a princesa gostou dele.
Quando o velho chegou ao jardim, já o rapaz lá estava deitado ao sol, como tinha ficado. E o velho, entusiasmado, Pôs-se a contar ao rapaz tudo o que viu na festa e disse-lhe:
- Apareceu lá um príncipe com o cabelo de ouro.
E o rapaz respondeu desinteressado:
- A mim o que me importa?
Ao outro dia o rapaz disse para o velho:
- Eu era capaz de pôr no cimo do jardim um tanque com quatro bicas de água a
correr.
O velho foi levar a novidade ao rei. Que era capaz de pôr no cimo do jardim quatro bicas de água a correr. O rei respondeu-lhe:
- Pois com pena de morte tens que as pôr.
O velho foi ter com o rapaz. Aflito, contou-lhe o que tinha dito ao rei, e o rapaz respondeu-lhe:
- Não lhe foras dizer nada. A mim não me importa.
Disse o rapaz:
- Valha-me o meu cavalinho de prata. Quero aqui um tanque com quatro bicas a deitar água, amanhã de manhã.
O rei, quando se levantou e viu aquilo, elogiou o jardineiro.
Depois, o velho disse para o rapaz:
- Queres ir às cavalhadas da filha do meio? São amanhã!
O rapaz respondeu-lhe:
- Antes quero ficar aqui a dormir.
O rapaz quando se viu só, pediu ao seu cavalinho de prata. Quero aqui um cavalo e boa roupa, que quero conquistar a filha do rei.
Assim que o rapaz lá chegou, ainda ficou maior espanto nas pessoas que da primeira vez.
E a filha do rei gostou dele.
Um dia, o rapaz e o jardineiro estavam conversando no jardim.
Diz o rapaz:
- Eu era capaz de pôr aqui, de hoje até amanhã de manhã, em cada canto do tanque uma laranjeira carregada de laranjas maduras.
O velho, ao ouvir aquilo, foi levar a novidade ao rei:
- Saiba Vossa Real Alteza que eu sou capaz de pôr em cada canto do tanque uma laranjeira carregada de laranjas maduras, de hoje para amanhã de manhã.
E o rei respondeu-lhe:
- Com pena de morte tens de as pôr.
O velho foi para ao pé do rapaz e disse-lhe:
- Eu disse ao rei que era capaz de pôr as quatro laranjeiras no tanque, carregadas de laranjas maduras. E ele disse-me, com pena de morte, que tinha de as pôr.
O rapaz disse-lhe:
- Então, se não és capaz, por que lhe foste tu dizer? Vou-te deixar morrer.
O velho foi-se deitar e o rapaz pediu ao seu encanto:
- Valha-me o meu cavalinho de ouro. Quero aqui em cada canto do tanque uma laranjeira carregada de laranjas maduras, mas que ninguém seja capaz de as cortar, a não ser eu e a princesa mais nova.
O rei convidou muitos reis e príncipes para ver aquilo. Mas as laranjas, só a princesa mais nova e o rapaz é que as colhiam.
Depois, o velhote disse para o rapaz:
- Queres ir às cavalhadas da filha mais nova do rei, que são amanhã?
Eu não quero falhar, – diz o velho.
E o rapaz respondeu-lhe: - A essa talvez vá, se encontrar quem me empreste um burro.
Desde que o velho saiu o rapaz arranjou um burro já velho e pôs-se a caminho.
Quando chegou a um atoleiro, o burro enterrou-se, e o rapaz começou-Ihe a puxar pelo rabo.
Quando passava um, dizia:
- Quando este lá chegar já os outros estão de volta. E outros riam--se, dizendo:
- Este tarde há-de chegar às cavalhadas.
Diz o rapaz:
- Valha-me o meu cavalinho de ouro. Quero aqui um cavalo e roupa ao consoante, para conquistar a filha do rei mais nova.
Quando lá chegou ainda foi mais admirado que das outras vezes, e a princesa também gostou dele.
Quando o rapaz saiu, vieram-lhe ao encontro dois príncipes.
- Tu conquistaste as três princesas mas não podes casar com elas três. Escolhe a que gostas mais e cede-nos as outras duas. O rapaz respondeu-lhes:
- Para mim quero a mais nova. Mas, antes que vos ceda as outras duas, tendes que me deixar selar as vossas nalgas com as patas do meu cavalo.
Quando o rapaz chegou ao palácio, vestiu-se com roupa simples e a bexiga na cabeça.
Deitou-se no jardim ao sol, e o velho foi ter com ele, e contou-lhe:
- Hoje ainda foi mais lindo do que das outras vezes.
O rei mandou chamar os dois príncipes e o rapaz apresentou-se com os três cavalos que tinha conquistado as princesas, mas em vez de ir vestido de príncipe, não foi. Ia de roupa simples e a bexiga na cabeça.
O rapaz disse para o rei:
- Saiba Vossa Real Alteza que fui eu quem conquistou as suas três filhas. Estes dois
príncipes vieram cá porque fui eu que lhas cedi. Para prova da verdade hão-de ter
as nalgas com as ferraduras escritas dos meus cavalos.
O rei respondeu-lhe:
- Eu não te dou a minha filha por bem empregue. Vai-te embora tu e ela. E assim se foram e casaram-se. O rapaz pediu ao seu encanto:
- Valha-me o meu cavalinho de ouro. Quero aqui um palácio muito superior ao do meu sogro, com quatro bicas de fogo no cimo do palácio.
O rei naquela manhã levantou-se tarde, porque a janela do seu quarto naquele dia não tinha a luz habitual. O rei veio à janela e viu aquele palácio superior ao seu.
Mandou perguntar quem lá estava.
De lá responderam-lhe:
- Se sua Real Alteza quer saber, venha cá pelo seu pé.
O rei mandou outra vez perguntar quem lá estava, se não que lhe declarava guerra.
- Se sua alteza quer saber, que venha cá pessoalmente.
O rei já cheio de medo pôs-se a caminho. Qual não foi o seu espanto, quando viu sua filha e o seu genro. Ficou muito satisfeito e mandaram fazer logo uma festa e assim acabaram todos felizes.
RECOLHA (1985) de Maria Celeste Fernandes, Pai-Torto, Mirandela.
FICHA TÉCNICA:
Título: CANCIONEIRO TRANSMONTANO 2005
Autor do projecto: CHRYS CHRYSTELLO
Fotografia e design: LUÍS CANOTILHO
Pintura: HELENA CANOTILHO (capa e início dos capítulos)
Edição: SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE BRAGANÇA
Recolha de textos 2005: EDUARDO ALVES E SANDRA ROCHA
Recolha de textos 1985: BELARMINO AUGUSTO AFONSO
Na edição de 1985: ilustrações de José Amaro
Edição de 1985: DELEGAÇÃO DA JUNTA CENTRAL DAS CASAS DO POVO DE
BRAGANÇA, ELEUTÉRIO ALVES e NARCISO GOMES
Transcrição musical 1985: ALBERTO ANÍBAL FERREIRA
Iimpressão e acabamento: ROCHA ARTES GRÁFICAS, V. N. GAIA
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(Henrique Martins)
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