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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

HISTÓRIA DA LUTA DOS DOIS CARNEIROS

Dois pastores conduziam o gado para a pastagem e encontram-se ao passar no campo da bola. Cada um deles tinha um grande carneiro que, ao encontrar-se, não resistiram a uma luta e começaram a marrar um contra o outro a ponto do resto do gado se afastar consideravelmente. Enquanto lutavam aproximou-se um lobo faminto e estafado da caminhada, que lhes falou:
- Bom dia compadres carneiros!
E eles responderam:
- Bom dia compadre lobo!
- Venho tão cansado e cheio de fome que vou ter de vos comer.
- Tem graça, até estamos de acordo que nos comas, mas tens de nos deixar definir isto aqui. É que temos esta leira para dividir pelos dois e temos de fazer este trabalho para saber o que toca a cada um.
-Ah! Tendes razão. Então vá, acabem lá o serviço porque estou com muita fome.
E diz um dos carneiros:
- Então tu vais sentar-te aqui, o meu companheiro vai afastar-se até lá para trás e eu vou afastar-me também, depois vimos os dois a correr e o primeiro a chegar aqui é porque a leira dele é a mais pequena.
O lobo concordou, e então, os carneiros afastaram-se no sentido oposto e empreenderam uma feroz corrida, um em frente ao outro. O lobo viu-os vir mas não teve tempo de os evitar, sendo apanhado no meio da estucada dos grandes cornos dos carneiros, só se ouvindo um grande estouro do lobo a arrebentar.
Depois do sucedido, os carneiros olharam-se e concluíram:
- Este já se foi!
Seguidamente, largaram a correr para alcançar os respectivos donos e gados.
O lobo meio vivo meio morto, lá se foi levantando e cambaleando, chegou a um lameiro onde pastava uma égua e falou-lhe:
- Ó comadre égua, triste é a minha vida, venho tão doente, cansado e cheio de fome, vou ter que te comer!
A égua abalada até concordou e disse:
- Acho até bem que me comas, também tens direito a viver, mas olha, tenho um grande espigão numa pata e tens de mo tirar antes de me comer, senão o espigão espeta-se-te no céu-da-boca e morres.
O lobo entendeu, então, que seria prudente tirar mesmo o espigão da pata da égua antes de a comer e disse:
- Então alça lá a pata que tem o espigão.
A égua manhosa levantou a pata e quando o lobo se preparava para arrancar o hipotético espigão com os dentes, a égua defere um grande coice que deitou com o pobre lobo aos tombos pelo vale a baixo. E, assim, a égua escapou aos dentes do lobo.
Passado um pouco, o pobre animal lá se foi endireitando aos poucos e tomou caminho ao longo de um riacho que chegava ao rio, naquele rio havia um moinho estava parado mas não estava desactivado.
Assim, o dono do moinho tinha ao lado deste uma casotinha onde guardava uma porca com algumas crias. O lobo foi-se aproximando da mãe porca enquanto as filhinhas pastavam por perto:
- Olá comadre porca.
E responde a porca:
- Viva compadre lobo, o que o trás por estes lados?
- Ó comadre porca! Triste é a minha vida, venho cansado e cheio de fome, vou ter que a comer. O que prefere, que a coma a si ou aos seus leitõezinhos?
E a porca responde:
- Antes quero que comas os meus filhos, porque eu sou nova e ainda posso arranjar outros, mas antes tens de mos deixar baptizar.
O lobo curioso pergunta:
- Então e como se baptizam?
A porca esperta chama o lobo para a saída da água do moinho onde se encontrava o rodízio e, então, explicou-lhe como se faria o baptismo e como ele deveria proceder:
- Vais ficar aqui sentado na roda com a boca bem aberta para aquele buraco (a saída da água), eu vou por cima e mando um leitão de cada vez por aquele buraco, quando chegar aqui já vem baptizado e tu aboca-lo. O lobo concordou e sentou-se na roda, entretanto a mãe porca foi guardar os filhotes na loja e, depois, foi por cima a abrir o canal para deixar correr a água, fechando-se em seguida com os filhos.
Quando a água começou a cair na roda esta começou a rodar e a fazer um barulho característico do próprio movimento. O lobo ao entrar em rotação agarrou-se ao pau do meio (ao veio), mas não pode parar o movimento e desatou a gritar:
- Pára rezingão que havemos de baptizar um leitão!
Mas como a água não deixava de correr a roda não parava de rodar e o lobo ia ficando tonto de tanta volta, acabando a força da água por arrastá-lo ao longo do rio.
Da janela da sua loja a comadre porca acena:
- Adeus compadre lobo, boa viagem passe muito bem!
Tontinho de tanto rodar e de tanto tombo dar, foi parar junto de um escanzelado burro que pastava num lameiro, num lugar chamado Tabuaça. Estava coberto com uma manta e aproximou-se depois de fazer um grande esforço para se levantar:
- Viva compadre burro.
E disse o burro:
- Olá compadre lobo!
- Ah compadre burro venho tão cansado, cheio de fome, que vou ter que o comer!
- Ah compadre lobo, não será grande ideia, não vês que sou só ossos, parece-me que será melhor, uma vez que está cansado, deitar-se ai ao sol e dormir uma grande sesta, enquanto eu pasto um pouco e assim já te podes fartar. O lobo obedeceu, deitou-se e deixou-se dormir. Ao ver o lobo a dormir o burro foi deitar-se por detrás dele, começando a mexer-lhe por detrás com o seu “instrumento” e o lobo acordou:
- Ó compadre burro, então isto o que é?
O burro respondeu:
- É o canhão com que te vou matar!
- Então e isto aqui?
- Isto são as cartucheiras que estão cheias de balas para te matar.
O lobo levanta-se dum salto e não se lamentou mais do seu cansaço e da sua fome, larga a correr pelo vale fora, acelerando quando olhava para trás e via o burro a zurrar com o canhão armado. Cheio de medo e cego na corrida foi enfiar-se numa mata de estevas que, naquele tempo, tinham já a cabeça de flor a cair, caindo-lhe no lombo ao passar:
- Fogo lá para o burro, que grande canhão que ainda chegam aqui os chumbos frios!
Continuou, assim, o triste lobo pelo monte fora, onde encontrou um leão que lhe perguntou:
- Donde vens compadre lobo, tão cansado e esbaforido, parece que viste o diabo?!
Respondeu o lobo:
- Ah! Se te acontecesse o que me aconteceu a mim agora ali com um burrito!
- Então o que foi que te assustou assim tanto?
O lobo contou o que lhe tinha acontecido com o burro, e o leão ficou curioso, não querendo acreditar que fosse assim:
- Olha vamos lá os dois dar cabo dele.
- Não vou que estou muito cansado!
Diz, então, o leão:
- Nesse caso, agarra-te aqui ao meu rabo e vamos ver que tipo de burro é esse que tanto te amedronta.
O lobo acabou por agarrar-se ao rabo do leão com os dentes e deixou-se arrastar por ele, pois já nem tinha forças para andar batendo com a cabeça, durante o caminho, em troncos e pedras. Ao avistarmos o burro, este voltou-se para trás e põe-se a exibir o seu grande canhão. O leão parou e considerou que seria melhor não avançar mais, porque de facto aquele canhão metia respeito! Entretanto o lobo de tantos saltos e tombos ter dado já estava meio morto, mesmo assim, o leão voltou para o monte com o lobo preso à cauda. Ao parar e já cansado de puxar, comenta ao ver o lobo de dentes arreganhados, pois já estava morto:
- Ai tu ainda te ris? Pois eu não acho piada nenhuma, aquele era um canhão de meter medo a um batalhão, larga-me lá o rabo que eu quero ir à minha vida, mas o lobo já não abria os dentes estava mesmo morto.
Entretanto o leão passou entre duas árvores muito juntas, tendo o lobo que ficar mesmo para trás, mas ficou-lhe também com metade da cauda. Seguindo saroto, mas livre o leão atravessou pelo campo da bala, no entanto ditou a sua pouca sorte que pisasse uma casinha de um grilo, que saiu de lá todo chateado e lhe perguntou:
- Ouça lá senhor leão saroto, quero saber quem lhe deu autorização para pisar a minha casa?
- Queira desculpar-me, meu rei grilo, mas creio que não foi de propósito.
Mas o grilo ainda irritado não aceitou explicações:
- Não aceito desculpas, proponho já uma guerra temos que medir forças.
- Pois se insiste, façamos uma guerra!
Combinaram o dia dos confrontos e cada um reuniu as suas tropas. O leão convidou elefantes, raposas, rinocerontes, mais leões, enfim animais grandes e ferozes. O pequeno grilo convidou simplesmente abelhas. Chegando o dia D as tropas puseram -se frente a frente, os animais da floresta ao ver montinhos de abelhas agrupados no chão, zombaram logo daquela situação e consideraram-se vencedores à partida.
Só que saiu tudo ao contrário, à ordem de ataque as pequenas mas ágeis abelhas, num zumbido aéreo atacaram os adversários pelo focinho, picando-os nos olhos, nas patas, na barriga, na cauda, nas orelhas e por tudo quanto era sitio, até que os fortes animais debandaram à deriva.
O lobo, numa corrida desenfreada sem direcção, deparou-se com uma raposa:
- Eh, amigo lobo, que corrida cega é essa? Donde vens tão furioso?
Quase sem parar de se coçar o lobo responde:
- Venho ali da guerra do Leão e do rei Grilo, só que ele tinha lá uma tropa de farda amarela que malharam em nós todos. Eram pequenas, mas agarram-se a nós num zumbido sem fim picando-nos todos e tivemos de nos render. A raposa pensando que era mais valente adiantou:
- Ah! Se me apanho lá eu com as minhas unhazinhas desfaço-as todas!
- Pois vai que ainda chegas a quinhão.
Volveu o leão continuando a sua fuga e precipitando-se para o fundo do poço de onde não conseguia sair. A raposa chegou ao campo de batalha e falou:
- Oh, rei Grilo manda cá as tuas tropas que quero medir forças com elas!
O grilo enviou uma mãozinha de abelhas que envolveram a raposa, de tal modo, que ela não teve mais que fazer do que enfiar-se num charco de água para que as abelhas a largassem.
A raposa não se atreveu a voltar a trás, ficou-se por ali à beira do caminho. Por aquela hora costumava passar por ali o senhor Nazário que ia de Paço para Mós vender sardinhas com um caixote às costas. A esperta raposa ao avistá-lo tomba-se ao longo do caminho, como se estivesse morta, o senhor Nazário dá-lhe, então, um pontapé para se certificar que estava morta, pensando levá-la para lhe tirara pele e vendê-la. Assim, agarrou a raposa pelo lombo e atirou com ela para cima das sardinhas que levava às costas, prosseguindo caminho sem desconfiar da malandrice da raposa. E que astuta foi a raposa e como pregou uma partida ao sardinheiro!
Ao longo do caminho foi deitando fora, uma a uma, todas as sardinhas compassando-as ao longo do caminho. Depois, deixou-se ir mais um bocado para ficar com espaço para quando saltasse do caixote poder correr sem ser apanhada, tendo a possibilidade de comer as sardinhas todas no regresso. De um salto só a raposa fugiu e exasperou o sardinheiro:
- Ah! Maldita raposa, filha da mãe, fez-se morta só para apanhar boleia até aqui, pois olha, escapaste-te a tempo!
Não havia nada a fazer, seguiu o caminho e chegou à aldeia começando, logo de seguida, apregoar as sardinhas, desceu o caixote e pô-lo numa parede, mas para espanto seu não havia nenhuma sardinha no caixote! Pobre do senhor Nazário gelou-se-lhe o sangue, começou a praguejar contra a raposa, enquanto pedia desculpas aos clientes da aldeia e, assim, perdeu o dia. Por sua vez, a raposa, no regresso, foi recolhendo todas as sardinhas retirando-se para o monte, onde os lobos se criam e dormem, chamado Pena Cova. Ai cruzou-se com um lobo que ficou espantado ao vê-la com tanto peixe:
- Ó comadre raposa, donde vens com tantos peixinhos?
E respondeu a malandra da raposa:
- Olha quem quer peixe molha “el culo”. Dormi toda a noite no poço do tio Purezo, quando foi de manhã, custou-me a sair com tanto peixe agarrado a mim.
- Ó comadre raposa, tens de me ensinar onde é esse poço que eu também quero lá ir dormir.
- Ensino sim senhor, compadre lobo!
Foi então ensinar ao lobo o lugar que seria de suplício para ele, explicou-lhe como devia fazer para se meter no poço na parte que era mais profunda ficando só com a cabeça de fora.
Quando chegou a noite o lobo foi meter-se no poço e como era Inverno a água começou a gelar, e como o gelo, no correr da noite, ia apertando cada vez mais, o lobo chega a pensar que a raposa tinha razão, pensando que o gelo a apertar eram os peixes. No entanto, o lobo acabou por não ser capaz de sair do poço acabando por morrer ali com o gelo. A raposa ao saber da burrice do lobo ficou-se a rir da sua astúcia que saiu vencedora contra a esperteza do lobo.

RECOLHA 2005 SCMB, CASIMIRO PARENTE, Idade: 66.
Localização geográfica: PAÇO DAS MÓS – ORIGEM + 60 anos.

FICHA TÉCNICA:
Título: CANCIONEIRO TRANSMONTANO 2005
Autor do projecto: CHRYS CHRYSTELLO
Fotografia e design: LUÍS CANOTILHO
Pintura: HELENA CANOTILHO (capa e início dos capítulos)
Edição: SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE BRAGANÇA
Recolha de textos 2005: EDUARDO ALVES E SANDRA ROCHA
Recolha de textos 1985: BELARMINO AUGUSTO AFONSO
Na edição de 1985: ilustrações de José Amaro
Edição de 1985: DELEGAÇÃO DA JUNTA CENTRAL DAS CASAS DO POVO DE
BRAGANÇA, ELEUTÉRIO ALVES e NARCISO GOMES
Transcrição musical 1985: ALBERTO ANÍBAL FERREIRA
Iimpressão e acabamento: ROCHA ARTES GRÁFICAS, V. N. GAIA

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