Por: António Pires
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Apesar de amplamente reconhecido que uma língua é tanto mais rica quanto maior for a sua diversidade em termos de falares regionais (variantes dialectais), existe ainda na nossa sociedade o preconceito em relação à não utilização da norma – padrão no acto comunicativo.
Sobre este assunto, o distinto professor de História, Luís Ferreira, pessoa por quem tenho consideração e estima, escreveu um interessante e bem estruturado artigo, disponível na internet, com o título “Um Povo, Uma Língua”, no qual se evidencia o traço identitário do falar bragançano, pertinentemente associado ao contexto geográfico e sócio – cultural.
Pela importância do tema, que me é muito caro, e porque o dito texto tem a virtude de destacar as marcas da oralidade deste canto do território luso, que são, por assim dizer, aquilo que nos distingue dos demais, não podia deixar de fazer uma pequena correcção, não que eu seja alguma autoridade em linguística (nem lá perto), mas como alguém que, nado e criado nestas paragens, tem a experiência do contacto com o verbalizar bragançano.
Provavelmente por lapso, o Dr. Luís Ferreira, no dito texto, atribuiu ao linguajar bragançano uma peculiaridade que não lhe pertence, quando, por exemplo, refere que “ …O Voi e a Baca são outro exemplo desta região”.
Em Bragança, como, aliás, se verifica em todo o norte de Portugal, a maioria dos falantes, de indiferente classe social e grau académico, troca, conscientemente, o “v” pelo “b”. Uma troca de pronúncia de sons que dá pelo nome de betacismo.
Ao invés, a troca do “b” pelo “v” (por exemplo, nos contextos “voi”, em vez de “boi”, “vata”, em vez de “bata”, “vola”, em vez de “bola”), não pode ser considerado um traço diferenciador dialectal desta região, porque, além de, por cá, ser um fenómeno raríssimo, quase sem expressão, é transversal a todo o norte do país, desde Freixo de Espada à Cinta, a São João da Madeira, passando por Valença do Minho.
A este fenómeno (a troca do b pelo v), próprio daqueles sujeitos falantes (de um modo geral, com baixo nível de escolaridade) que, de uma forma levada ao exagero, tentam imitar a norma – padrão, com o objectivo de impressionar a “plateia”, dá-se o nome de hipercorrecção.
Feito o reparo, queria deixar aqui também uma nota em relação à permanente dúvida sobre a pronúncia da palavra “butelo”, se bem que este objecto/manjar será sempre divinal, independentemente da forma como cada sílaba é articulada para o evocar.
À luz da regra da acentuação, a palavra “butelo”, formada a partir do sufixo “elo”, deve ser pronunciada com a vogal “e” aberta; isto é, “butélo”. Todavia, os mais desatentos poderão considerar que tal argumento é falacioso, na medida em que há palavras que, resultando deste mesmo sufixo – como os casos de “cotovelo”, “Lordelo”, “campelo”, “lombelo” e tantos outros – são pronunciadas com a vogal tónica fechada.
A explicação para a aparente incongruência (a que me parece mais consistente e razoável) é a seguinte: todas as palavras que têm origem, através do processo de derivação, no acrescento do sufixo “elo”, sejam diminutivos, sejam topónimos, só não são pronunciadas com a sílaba tónica aberta, porque, “à revelia” da regra geral da acentuação, se inserem no fenómeno (arbitrário) da convergência fonética. Simplificando: os falantes que pronunciam o “e” fechado, fazem-no para manter no mesmo plano de sonoridade, numa espécie de harmonia do conjunto, as vogais que ocorrem em cada uma dessas palavras.
Preciosismos à parte, o importante é que o butelo, com sílaba tónica aberta ou fechada, seja de qualidade e acompanhado com cascas/casulas; e que as entidades que o têm promovido, nomeadamente as Confrarias de Bragança e de Pinelo, continuem a fazê-lo com o dinamismo e a vivacidade que se lhes reconhece.
Aproveito para agradecer ao Dr. Luís Ferreira por ter “recuperado” uma das expressões mais deliciosas do riquíssimo património linguístico bragançano: o “bem m´eu finto”, a que acrescento as não menos fascinantes “Bô bício” e “Bô fé l´eu ponho”, significando, respectivamente, “era só o que mais faltava!” e “ não lhe dou nenhuma importância.
Sobre este assunto, o distinto professor de História, Luís Ferreira, pessoa por quem tenho consideração e estima, escreveu um interessante e bem estruturado artigo, disponível na internet, com o título “Um Povo, Uma Língua”, no qual se evidencia o traço identitário do falar bragançano, pertinentemente associado ao contexto geográfico e sócio – cultural.
Pela importância do tema, que me é muito caro, e porque o dito texto tem a virtude de destacar as marcas da oralidade deste canto do território luso, que são, por assim dizer, aquilo que nos distingue dos demais, não podia deixar de fazer uma pequena correcção, não que eu seja alguma autoridade em linguística (nem lá perto), mas como alguém que, nado e criado nestas paragens, tem a experiência do contacto com o verbalizar bragançano.
Provavelmente por lapso, o Dr. Luís Ferreira, no dito texto, atribuiu ao linguajar bragançano uma peculiaridade que não lhe pertence, quando, por exemplo, refere que “ …O Voi e a Baca são outro exemplo desta região”.
Em Bragança, como, aliás, se verifica em todo o norte de Portugal, a maioria dos falantes, de indiferente classe social e grau académico, troca, conscientemente, o “v” pelo “b”. Uma troca de pronúncia de sons que dá pelo nome de betacismo.
Ao invés, a troca do “b” pelo “v” (por exemplo, nos contextos “voi”, em vez de “boi”, “vata”, em vez de “bata”, “vola”, em vez de “bola”), não pode ser considerado um traço diferenciador dialectal desta região, porque, além de, por cá, ser um fenómeno raríssimo, quase sem expressão, é transversal a todo o norte do país, desde Freixo de Espada à Cinta, a São João da Madeira, passando por Valença do Minho.
A este fenómeno (a troca do b pelo v), próprio daqueles sujeitos falantes (de um modo geral, com baixo nível de escolaridade) que, de uma forma levada ao exagero, tentam imitar a norma – padrão, com o objectivo de impressionar a “plateia”, dá-se o nome de hipercorrecção.
Feito o reparo, queria deixar aqui também uma nota em relação à permanente dúvida sobre a pronúncia da palavra “butelo”, se bem que este objecto/manjar será sempre divinal, independentemente da forma como cada sílaba é articulada para o evocar.
À luz da regra da acentuação, a palavra “butelo”, formada a partir do sufixo “elo”, deve ser pronunciada com a vogal “e” aberta; isto é, “butélo”. Todavia, os mais desatentos poderão considerar que tal argumento é falacioso, na medida em que há palavras que, resultando deste mesmo sufixo – como os casos de “cotovelo”, “Lordelo”, “campelo”, “lombelo” e tantos outros – são pronunciadas com a vogal tónica fechada.
A explicação para a aparente incongruência (a que me parece mais consistente e razoável) é a seguinte: todas as palavras que têm origem, através do processo de derivação, no acrescento do sufixo “elo”, sejam diminutivos, sejam topónimos, só não são pronunciadas com a sílaba tónica aberta, porque, “à revelia” da regra geral da acentuação, se inserem no fenómeno (arbitrário) da convergência fonética. Simplificando: os falantes que pronunciam o “e” fechado, fazem-no para manter no mesmo plano de sonoridade, numa espécie de harmonia do conjunto, as vogais que ocorrem em cada uma dessas palavras.
Preciosismos à parte, o importante é que o butelo, com sílaba tónica aberta ou fechada, seja de qualidade e acompanhado com cascas/casulas; e que as entidades que o têm promovido, nomeadamente as Confrarias de Bragança e de Pinelo, continuem a fazê-lo com o dinamismo e a vivacidade que se lhes reconhece.
Aproveito para agradecer ao Dr. Luís Ferreira por ter “recuperado” uma das expressões mais deliciosas do riquíssimo património linguístico bragançano: o “bem m´eu finto”, a que acrescento as não menos fascinantes “Bô bício” e “Bô fé l´eu ponho”, significando, respectivamente, “era só o que mais faltava!” e “ não lhe dou nenhuma importância.
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