Um passeio guiado aquém e além muralhas dá a conhecer a história e as tradições do nordeste transmontano. A região de Bragança também se saboreia à mesa, com pratos que celebram os produtos locais.
A cidadela do castelo de Bragança. (Fotografia de Artur Machado/Global Imagens) |
Junto à Porta da Vila, entre a cidadela medieval e a urbe que se desenvolveu além muralhas, Luís Costa inicia uma viagem pela história brigantina. “No início do século XVI, começaram a chegar os judeus expulsos de Espanha. Muitos ficaram em locais ermos, não queriam estar junto ao poder da Igreja, e os que vieram para a urbe foram os primeiros a sair da muralha, e a cidade começou a crescer para lá”, explica o guia da Anda D’I, empresa de experiências turísticas voltadas para a cultura, identidade e natureza da Terra Fria Transmontana. O nome deriva de um regionalismo de influência mirandesa, que é o equivalente a dizer “anda daí”.
“Atrás deles saíram famílias nobres, que foram construindo solares daqui até à Igreja de São Vicente, onde posteriormente passou a existir uma praça principal de Bragança, e a cidade foi-se desenvolvendo, sempre de costas para Espanha”, continua Luís. Do lado oposto, passando o arco aberto na muralha, o passeio mergulha mais fundo no tempo, na tradição pagã ainda hoje presente nas festas e rituais mais conhecidos da região.
“Temos mais de 30 aldeias com caretos, e só dois são de Carnaval. A maior parte é dos 12 dias mágicos – de 24 de dezembro a 6 de janeiro -, em que a população se dedicava ao seu panteão de deuses, a pedir fertilidade para o novo ano, aos rituais de passagem e a atividades que davam coesão social.”
O pelourinho da cidade, que está junto ao castelo e não ao lado da Domus Municipalis (antigos paços municipais, um raro exemplar da arquitetura românica civil), é exemplo dessa influência. “Não sabemos porque é que foi mudado para aqui e muito menos porque é que foi posto dentro desta figura zoomórfica”, diz Luís Costa. Fala do berrão (porco), da Idade do Ferro, que se encontra na base do pelourinho. “É um pelourinho da época manuelina e está repleto de elementos pagãos. O berrão, um macho, representa força, virilidade.”
Os simbolismos pagãos também perduram nas máscaras. “Temos mais de 30 aldeias com caretos, e só dois são de Carnaval. A maior parte é dos 12 dias mágicos – de 24 de dezembro a 6 de janeiro -, em que a população se dedicava ao seu panteão de deuses, a pedir fertilidade para o novo ano, aos rituais de passagem e a atividades que davam coesão social. Os miúdos vestiam-se de caretos e punham a máscara para representarem divindades e demónios. O caos universal descia à terra, era uma catarse, e quando tiravam o fato passavam a ser homens e a contribuir para a comunidade”, explica o guia. “O calendário pagão é a base de todas as nossas festas de inverno, que têm a ver com os rituais agrários e com o ritmo da natureza, que marcava a nossa maneira de viver.”
O que fazer a nordeste:
Museu da Máscara e do Traje
Os festejos pagãos do nordeste transmontano e da região de Zamora encontram palco permanente neste espaço. A coleção está dividida em três pisos, o primeiro dos quais dedicado às Festas de Inverno de Trás-os-Montes, o segundo às Mascaradas de Invierno, de Zamora, e o terceiro às celebrações de Carnaval das duas regiões. “Os cornos, o diabo, a barba, são símbolos da fertilidade do homem. Já a serpente simboliza inteligência, regeneração e o feminino”, explica Luís Costa.
(Fotografia de Artur Machado/Global Imagens) |
Museu do Abade de Baçal
Fora da cidadela, no antigo Paço Episcopal, o Museu do Abade de Baçal é uma visita recomendada para ficar a conhecer melhor a história da região. Criado em 1915, integra coleções de arqueologia, arte sacra, pintura, ourivesaria, numismática e etnografia. Ao longo das 14 salas da exposição permanente caminha-se entre forais manuelinos e a bula papal de Miranda do Douro, uma coleção de aguarelas de Alberto Sousa, quadros de José Malhoa e de Abel Salazar e um conjunto de ilustrações de Almada Negreiros. Há ainda um agradável jardim, de acesso gratuito.
(Fotografia de Artur Machado/Global Imagens) |
Tasca do Zé Tuga
De frente para o terreiro de Castelo de Bragança, a Tasca do Zé Tuga é um dos maiores chamarizes da cidadela. Ali, o chef Luís Portugal põe em prática uma cozinha criativa baseada na tradição gastronómica local. “Trabalhar o que é nosso e produtos menos nobres é o caminho a seguir”, diz. À mesa chegam interpretações apuradas destes sabores, como o éclair de cogumelos e alheira, com puré de maçã de Carrazeda; ou os cuscos transmontanos – o prato com que Luís entrou para o “MasterChef Portugal” – com cogumelos e lombo de porco. Preço médio: 30 euros.
Cuscos com lombo de porco e, em baixo, o chef Luís Portugal. (Fotografias de Artur Machado/Global Imagens) |
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