Já andava com saudades de recordar aqui uma das centenas de crónicas que fui publicando ao longo dos tempos. Calhou ver na televisão a cara bonita de Maitê Proença, e pensei: ‘Não é cedo nem é tarde. Já sei o que vou recordar.’ E então aí vai.
O CUSPO DE MAITÊ
No dia 14 de Outubro de 2009, Portugal alvoroçou-se patrioticamente como capoeira onde entrou raposa. Porquê? Porque a Espanha resolveu por fim invadir-nos? Nada disso. Apenas porque uma actriz brasileira resolveu apresentar no programa “Saia Justa”, de uma estação de televisão brasileira, um vídeo que fez em Portugal no ano de 2007, aparentemente com o único fito de provar que os portugueses não são lá muito inteligentes. Ela não disse abertamente ‘estúpidos’, verdade se diga. Mas sugeriu-o em mais de um momento. E usou o eufemismo ‘esquisitos’, o que, somado ao sorriso faceto com que o disse, vem dar no mesmo.
A profusão e o teor dos comentários nas páginas da internet excitaram-me a curiosidade de ver o vídeo. E vi. Não vi grande coisa, diga-se de passagem. Vi uma peça de cinco minutos em que a actriz de facto se esforça muito por achincalhar (uma brincadeira, disse ela depois) os portugueses. Às vezes com o seu topete, como quando ― para provar que estava em Portugal! ― exibe as imagens de uma porta em Sintra em cuja padieira o número de polícia é um 3, mas voltado ao contrário. Prova irrefutável de que estava em Portugal... Ou seja: em nenhum outro país do mundo se invertem algarismos. Como se no Brasil, na imensa iliteracia do Brasil, não houvesse algarismos invertidos à razão de dezenas por quilómetro quadrado.
Depois a diva (porventura não tão casta quanto a de Bellini, a fazer fé nos ditos comentários na internet) conta mais umas quantas chalaças, que tanto podiam dizer respeito a Portugal como ao Brasil como à Papuásia (salvo aquela coisa do Salazar que é de facto retintamente portuguesa), com que pretende demonstrar que os portugueses se são não propriamente estúpidos ― são pelo menos esquisitos.
A fechar, o momento mais feio de todos. Debruçada sobre uma fonte dos Jerónimos, Maitê Proença puxa um escarro à boca e despeja-o no tanque. Confesso que foi o gesto mais ordinário que jamais vi numa cara bonita. E veio-me à lembrança que, há meia dúzia de anos atrás, um estudante inglês (salvo erro) foi condenado a levar umas quantas varadas em Singapura por ter cuspido no chão. Quantas varadas não merecia então esta senhora que, num gesto que de senhora pouco tem, cuspiu nas águas tranquilas e inocentes de uma fonte e se fez filmar no acto?
O vídeo termina aí. Mas não o deboche. Porque no final é recebido com aplauso e gargalhadas pela apresentadora do “Saia Justa”, pela própria actriz e por outras catatuas que participavam no programa ― todas raparigas bonitas, mas que me pareceram irremediavelmente catatuas, peço desculpa se erro.
Foi isto que vi no vídeo. E, sinceramente, acho despropositado o alarido que se gerou. Nos comentários na internet (que é muitas vezes uma espécie de latrina onde indivíduos de formação duvidosa depositam impunemente a borra dos seus instintos), disse-se de Proença o que Mafoma não disse do toucinho. Insultou-se não só a mãe da actriz, como, nos mesmíssimos termos, a própria actriz. Esses portugueses furibundos que retaliaram na internet fizeram-me lembrar, mal acomparado, uma horda de fundamentalistas islâmicos a arremeter contra alguém quem lhes tenha tocado no turbante de Maomé. Só faltou mesmo decretar uma ‘fatwa’ contra a petulante tripudiadora!
Com franqueza, pareceu-me excessivo tudo isso. Claro que não simpatizei nem um bocadinho com os termos do pagode. Mas brincadeira é brincadeira, mesmo quando é de mau gosto. Numa democracia o disparate é livre e tem a grande virtude de afectar apenas quem o comete. Não insulta quem quer. E o fair play ainda é uma grande virtude.
Calma, pois, senhores. Sobretudo, não vamos abrir mais uma guerra com o Brasil por via deste mal-estreado vídeo ― uma porcaria de vídeo, por sinal. Para guerras, bem bastou a que Eça de Queirós desencadeou com o seu caricato Barão de Minhinhonhá, estão lembrados? Além do mais, tenham em conta que não foi nenhuma figura de grande projecção intelectual ou relevo cultural que nos arranhou o ego. Foi só Maitê Proença.
A profusão e o teor dos comentários nas páginas da internet excitaram-me a curiosidade de ver o vídeo. E vi. Não vi grande coisa, diga-se de passagem. Vi uma peça de cinco minutos em que a actriz de facto se esforça muito por achincalhar (uma brincadeira, disse ela depois) os portugueses. Às vezes com o seu topete, como quando ― para provar que estava em Portugal! ― exibe as imagens de uma porta em Sintra em cuja padieira o número de polícia é um 3, mas voltado ao contrário. Prova irrefutável de que estava em Portugal... Ou seja: em nenhum outro país do mundo se invertem algarismos. Como se no Brasil, na imensa iliteracia do Brasil, não houvesse algarismos invertidos à razão de dezenas por quilómetro quadrado.
Depois a diva (porventura não tão casta quanto a de Bellini, a fazer fé nos ditos comentários na internet) conta mais umas quantas chalaças, que tanto podiam dizer respeito a Portugal como ao Brasil como à Papuásia (salvo aquela coisa do Salazar que é de facto retintamente portuguesa), com que pretende demonstrar que os portugueses se são não propriamente estúpidos ― são pelo menos esquisitos.
A fechar, o momento mais feio de todos. Debruçada sobre uma fonte dos Jerónimos, Maitê Proença puxa um escarro à boca e despeja-o no tanque. Confesso que foi o gesto mais ordinário que jamais vi numa cara bonita. E veio-me à lembrança que, há meia dúzia de anos atrás, um estudante inglês (salvo erro) foi condenado a levar umas quantas varadas em Singapura por ter cuspido no chão. Quantas varadas não merecia então esta senhora que, num gesto que de senhora pouco tem, cuspiu nas águas tranquilas e inocentes de uma fonte e se fez filmar no acto?
O vídeo termina aí. Mas não o deboche. Porque no final é recebido com aplauso e gargalhadas pela apresentadora do “Saia Justa”, pela própria actriz e por outras catatuas que participavam no programa ― todas raparigas bonitas, mas que me pareceram irremediavelmente catatuas, peço desculpa se erro.
Foi isto que vi no vídeo. E, sinceramente, acho despropositado o alarido que se gerou. Nos comentários na internet (que é muitas vezes uma espécie de latrina onde indivíduos de formação duvidosa depositam impunemente a borra dos seus instintos), disse-se de Proença o que Mafoma não disse do toucinho. Insultou-se não só a mãe da actriz, como, nos mesmíssimos termos, a própria actriz. Esses portugueses furibundos que retaliaram na internet fizeram-me lembrar, mal acomparado, uma horda de fundamentalistas islâmicos a arremeter contra alguém quem lhes tenha tocado no turbante de Maomé. Só faltou mesmo decretar uma ‘fatwa’ contra a petulante tripudiadora!
Com franqueza, pareceu-me excessivo tudo isso. Claro que não simpatizei nem um bocadinho com os termos do pagode. Mas brincadeira é brincadeira, mesmo quando é de mau gosto. Numa democracia o disparate é livre e tem a grande virtude de afectar apenas quem o comete. Não insulta quem quer. E o fair play ainda é uma grande virtude.
Calma, pois, senhores. Sobretudo, não vamos abrir mais uma guerra com o Brasil por via deste mal-estreado vídeo ― uma porcaria de vídeo, por sinal. Para guerras, bem bastou a que Eça de Queirós desencadeou com o seu caricato Barão de Minhinhonhá, estão lembrados? Além do mais, tenham em conta que não foi nenhuma figura de grande projecção intelectual ou relevo cultural que nos arranhou o ego. Foi só Maitê Proença.
COM ATRASO, CONFESSO QUE DESCONHECIA o evento relatado .
ResponderEliminarPeço desculpas aos portugueses pela ousadia da demonstração do preconceito da Maytê; tão bonita quanto inconsequente, de cabelos longos e idéias curtas, e que não encontra éco entre outros brasileiros. Perdão.