Por: Paula Freire
(colaboradora do Memórias...e outras coisas...)
O que a assustava era esse silêncio, ensurdecedor, no meio do rumor que dançava à sua volta dissipando-se qual névoa lenta.
Um silêncio cheio de tudo.
Pensava como era possível o mundo girar-lhe, a um ritmo alucinante, por entre o corpo e ela apenas conseguir sentir a voz estridente do silêncio como uma pedra pesada sobre os ombros.
Lembrou-se, de repente, das cenas dos filmes, quando as personagens sobrevivem a uma explosão. Um tinido nos ouvidos. Por todo o lado, o ruído tão distante. O desconcerto de quem não entende o que acabou de acontecer.
Seria assim o seu mutismo? A consequência do estrondo imprevisível de uma guerra que não lhe pertencia? Uma guerra de todos os que não suportam o mundo, de todos os que não se suportam a si mesmos?
Sentada sobre uma cadeira. Em frente, restos de uma refeição sem sabor, a única companhia dos próprios pensamentos. Cabeça apoiada nas mãos, a tapar o rosto escondido, adormecido no vácuo daqueles segundos em que se sentiu gente.
Fixou-se no tiquetaque do relógio. Estranho som. Seco, vagaroso, cadenciado... Cada vez mais sonoro, numa invasão indesejada a consumir-lhe os sentidos.
Estava ali há tantos anos aquele relógio, naquele mesmo local, naquele exato ponto e nunca se apercebera dele como naquele exato momento.
Curioso como o arrastar do tempo é substância delicada a escorregar pelas sinuosidades da vida! Impercetível, habita nela como as raízes de uma hera cravadas numa parede. Mas ninguém lhe escuta o bater compassado do coração. Ninguém o ouve.
Lembram-se dele, do relógio, das horas, do tempo, somente quando precisam de controlar os instantes dos dias. É-lhes imprescindível para não falharem, para seguirem o rumo certo do destino a que se propuseram.
É assim o relógio. Caminha sem pressas, mesmo que o abanem para ser mais rápido. Caminha inalterável, mesmo que o aconcheguem para ser ainda mais lento.
É assim, o relógio. Necessário na existência de tantos.
É assim, o relógio. Invisível.
É assim, ela.
Um silêncio cheio de tudo.
Pensava como era possível o mundo girar-lhe, a um ritmo alucinante, por entre o corpo e ela apenas conseguir sentir a voz estridente do silêncio como uma pedra pesada sobre os ombros.
Lembrou-se, de repente, das cenas dos filmes, quando as personagens sobrevivem a uma explosão. Um tinido nos ouvidos. Por todo o lado, o ruído tão distante. O desconcerto de quem não entende o que acabou de acontecer.
Seria assim o seu mutismo? A consequência do estrondo imprevisível de uma guerra que não lhe pertencia? Uma guerra de todos os que não suportam o mundo, de todos os que não se suportam a si mesmos?
Sentada sobre uma cadeira. Em frente, restos de uma refeição sem sabor, a única companhia dos próprios pensamentos. Cabeça apoiada nas mãos, a tapar o rosto escondido, adormecido no vácuo daqueles segundos em que se sentiu gente.
Fixou-se no tiquetaque do relógio. Estranho som. Seco, vagaroso, cadenciado... Cada vez mais sonoro, numa invasão indesejada a consumir-lhe os sentidos.
Estava ali há tantos anos aquele relógio, naquele mesmo local, naquele exato ponto e nunca se apercebera dele como naquele exato momento.
Curioso como o arrastar do tempo é substância delicada a escorregar pelas sinuosidades da vida! Impercetível, habita nela como as raízes de uma hera cravadas numa parede. Mas ninguém lhe escuta o bater compassado do coração. Ninguém o ouve.
Lembram-se dele, do relógio, das horas, do tempo, somente quando precisam de controlar os instantes dos dias. É-lhes imprescindível para não falharem, para seguirem o rumo certo do destino a que se propuseram.
É assim o relógio. Caminha sem pressas, mesmo que o abanem para ser mais rápido. Caminha inalterável, mesmo que o aconcheguem para ser ainda mais lento.
É assim, o relógio. Necessário na existência de tantos.
É assim, o relógio. Invisível.
É assim, ela.
Paula Freire - Natural de Lourenço Marques, Moçambique, reside atualmente em Vila Nova de Gaia, Portugal.
Com formação académica em Psicologia e especialização em Psicoterapia, dedicou vários anos do seu percurso profissional à formação de adultos, nas áreas do Desenvolvimento Pessoal e do Autoconhecimento, bem como à prática de clínica privada.
Filha de gentes e terras alentejanas por parte materna e com o coração em Trás-os-Montes pelo elo matrimonial, desde muito cedo desenvolveu o gosto pela leitura e pela escrita, onde se descobre nas vivências sugeridas pelos olhares daqueles com quem se cruza nos caminhos da vida, e onde se arrisca a descobrir mistérios escondidos e silenciosas confissões. Um manancial de emoções e sentimentos tão humanos, que lhe foram permitindo colaborar em meios de comunicação da imprensa local com publicações de textos, crónicas e poesias.
O desenho foi sempre outra das suas paixões, sendo autora das imagens de capa de duas obras lançadas pela Editora Imagem e Publicações em 2021: Cultura sem Fronteiras (coletânea de literatura e artes) e Nunca é Tarde (poesia).
Prefaciadora do romance Amor Pecador, de Tchiza (Mar Morto Editora, Angola, 2021) e da obra poética Pedaços de Mim, de Reis Silva (Editora Imagem e Publicações, 2021).
Autora do livro de poesia Lírio: Flor-de-Lis (Editora Imagem e Publicações, 2022).
Em setembro de 2022, a convite da Casa da Beira Alta, realizou, na cidade do Porto, uma exposição de fotografia sob o título: "Um Outono no Feminino: de Amor e de Ser Mulher".
Atualmente, é colaboradora regular do blogue "Memórias... e outras coisas..."-Bragança, da Revista HeliMagazine e da Revista Vicejar (Brasil).
Há alguns anos, descobriu-se no seu amor pela arte da fotografia onde, de forma autodidata, aprecia retratar, em particular, a beleza feminina e a dimensão artística dos elementos da natureza, sendo administradora da página de poesia e fotografia, Flor De Lys.
Sem comentários:
Enviar um comentário