Número total de visualizações do Blogue

Pesquisar neste blogue

Aderir a este Blogue

Sobre o Blogue

SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira..
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 3 de março de 2012

Ervilha Cor-de-Rosa - Iniciativa «salva» lã portuguesa à beira da extinção


Rosa Pomar percorre há anos o país. Uma viagem singular, em busca de ovelhas e da sua lã, uma matéria-prima desvalorizada, por vezes deixada a apodrecer no campo. Rosa quer fazer a diferença e já criou o seu próprio fio de lã. Uma iniciativa à qual teceu outras, ligadas a saberes tradicionais como a costura e croché. Uma empreendedora que reúne e partilha conhecimentos no blogue Ervilha Cor-de-Rosa e na retrosaria, em Lisboa, com o mesmo nome.
Rosa Pomar faz há anos um levantamento aprofundado da lã em Portugal. Uma história que tem um dos episódios quando a criadora da Ervilha Cor-de-Rosa procurou um fio de lã português. Rosa procurava matéria-prima nacional de qualidade para poder executar os seus trabalhos. Tarefa malograda. A maioria dos fabricantes importa a lã para as suas confecções. Rosa fez as malas, muniu-se do bloco e da máquina fotográfica, e partiu país fora para dezenas de conversas com os mais velhos que habitam o Portugal rural.
Uma paixão de Rosa Pomar pela lã nacional que é datada: 1994, ano em que Rosa participou como voluntária nas escavações do Campo Arqueológico de Mértola. Na localidade alentejana visitou a Cooperativa Oficina de Tecelagem e sentiu nas mãos a lã mais macia que vira até então. «Foi o meu coup de foudre [amor à primeira vista] com a lã portuguesa. Vim para Lisboa carregada com toda a lã que pude comprar. Desta matéria-prima nasceu uma camisola que durou mais de dez anos e um colete que ainda uso», conta.
A ligação de Rosa Pomar aos têxteis foi crescendo e tornou-se numa actividade profissional. «Foi em 2001, numa estadia de alguns meses em Nova Iorque que iniciei o blogue Ervilha Cor-de-rosa. Na altura era uma espécie de diário de viagem. Por esse ano, quando nasceu a minha filha mais velha comecei a fazer os primeiros artigos de croché, malha, bonecos de pano. E comecei a vender através do blogue. Percebi que havia aqui um nicho de mercado», conta Rosa.
A nossa protagonista regressou a Portugal e o interesse pela lã continuou. É, contudo, confrontada com a dura realidade de não existir matéria-prima portuguesa. «Percebi que durante o boom dos subsídios da Comunidade Europeia, Portugal se equipou para competir pelos baixos preços e nunca pela qualidade e aposta em nichos de mercado». Rosa Pomar conta que ao dirigir-se às fábricas de tecidos, alguns de alta qualidade, as portas se fecharam porque apenas aceitam grandes encomendas. «Não aproveitam as oportunidades. Estas fábricas se conseguem fazer grandes quantidades, também conseguem fazer pequenas», conta.
Começou, assim, um rol de histórias partilhadas no blogue Ervilha Cor-de-Rosa. Narrativas como aquela que cruza a curiosidade de Rosa Pomar com o saber fazer de D. Deolinda. No Mezio, Serra de Montemuro, D. Deolinda fia, com gestos hábeis, a lã sem roca. O trabalho é feito com recurso a um fuso de urgueira. «A grande diferença deste processo está nos gestos com que se prepara a lã antes do momento da torção: sem nunca largar o fuso da mão direita, usam-se ambas as mãos para criar uma longa mecha, que é depois rapidamente torcida e enrolada no fuso», explica Rosa Pomar.
Em Castro d’Aire, Rosa cruzou-se com D. Guiomar que da lã das ovelhas que cria faz mantas. «Leva a malha para o monte, com as ovelhas, e as mantas vão crescendo. Descobri que temos 15 raças de ovelhas, muitas delas em extinção, que as pessoas tosquiam e deixam a lã a apodrecer no campo porque ela não é valorizada». D. Guiomar é dos poucos exemplos que tendem a contrariar esse cenário. 
«Em Castro Daire há cada vez menos ovelhas. Quase não se vêem rebanhos e a lã dos que há consta que em boa parte é queimada. Muita é sedeúda, a maneira local de dizer que tem as fibras muito compridas e pouco macias, mas também há algumas ovelhas marinhotas (de meirinha, o nome dado em Portugal desde o século XV à lã de melhor qualidade proveniente das ovelhas merino), de lã mais frisada e macia. Algumas delas pertencem à D. Guiomina. Como não queria desperdiçar a lã lembrou-se de a fiar mais grossa e pouco torcida, de a ugar (juntar dois fios num novelo) e de fazer com este fio fofo grandes mantas de malha», explica Rosa Pomar no seu blogue Ervilha Cor-de-rosa.
Depois da tosquia segue-se a lavagem da lã. Rosa assistiu ao processo em Mértola «na companhia da Diane». A lavagem começa «ao nascer do sol com a feitura do lume para aquecer a água e termina com o último pedaço de lã a ser estendido a secar sobre as pedras aquecidas pelo sol. 
 Rosa recorda esse dia: «É um trabalho pesado e repetitivo, como todos os trabalhos do campo, em que estão presentes a terra, o ar, a água e o fogo. Entre muitos pormenores a merecer referência, noto a verificação da temperatura da água (se for quente demais enrija a lã) atirando-se-lhe para dentro uma cagaita (desperdício de lã normalmente sujo com as fezes da ovelha), que deverá ir ao fundo do alguidar e vir de seguida à superfície, a separação manual da lã sarnubega (a de cor castanha clara) em várias tonalidades diferentes (o que quer dizer que também por cá podemos ter muito mais cores naturais do que os habituais branco e preto), o facto de a lã ser lavada sem recurso a sabão ou detergente (a acção da água quente é suficiente para retirar a quantidade certa de sugo) e, finalmente, o asseio de todo o processo, que terminou com a D. Helena a arear os alguidares com um esfregão medieval feito ao momento com cagaitas, ervas e areia da margem do ribeiro».
Aos 36 anos, Rosa Pomar criou um fio lã próprio, 100% português..
Café Portugal
Aos 36 anos, Rosa Pomar
 criou um fio lã próprio, 100% português.
 Aos 36 anos, Rosa Pomar é hoje proprietária de um fio de lã próprio. Criado em 2010 é o resultado desta incursão pelo mundo da lã portuguesa. «Comecei por fazer um trabalho de recolha, andar pelas aldeias, falar com os mais velhos, conhecer os mecanismos. Com muita paciência lá consegui que uma fábrica fizesse o meu fio. Indiquei as características de qualidade que queria e com matéria-prima exclusivamente portuguesa, apenas da raça bordaleira da Serra da Estrela, fiz o meu primeiro fio de lã», comenta.
Um fio que pode ser adquirido na retrosaria Ervilha Cor-de-Rosa, de portas abertas em plena baixa lisboeta. Rosa Pomar sublinha que tem sido um fio «de muito sucesso», procurado por muitos. No número 61 da Rua do Loreto, na retrosaria vende-se material de costura, tecidos de algodão e fazem-se oficinas de aprendizagem. 
«Este espaço era uma fábrica de manequins», comenta enquanto percorremos o estreito corredor que liga a loja, primorosamente arranjada e inundada pela luz que entra das janelas, para a sala de trabalhos. «As oficinas decorrem em grupos de seis pessoas de diversas áreas profissionais que querem adquirir novas competências, descontrair, usar as mãos», comenta Rosa. Ensina-se a trabalhar com uma máquina de costura, a fazer croché, bonecos de pano.


Sara Pelicano; fotos - Rosa Pomar
in:cafeportugal.net

Sem comentários:

Enviar um comentário